Há cinco anos, em junho de 2013, a violenta repressão de um protesto contra o aumento de passagens do transporte público em São Paulo foi o estopim para que surgisse uma série de manifestações pelo país, marcando as chamadas Jornadas de Junho. Desde então, a Conectas reforça a sua atuação no sentido de defender o direito constitucional de reunião e associação, denunciar o uso abusivo da força policial e cobrar do Ministério Público um papel mais firme em relação à sua atribuição de controle da atividade policial.
Dentre as ações promovidas pela Conectas neste período, está a participação como amicus curiae na ação civil pública movida pela Defensoria Pública de São Paulo que pede a proibição do uso de armas menos letais, como bala de borracha e bomba de gás lacrimogêneo, pela Polícia Militar. O pedido, que foi acatado em sentença de primeiro grau, estabelecendo limites concretos à atuação policial em protestos, encontra-se suspenso pelo Tribunal de Justiça de São Paulo até o julgamento da apelação.
Segundo Henrique Apolinário, assessor do Programa de Violência Institucional da Conectas, a decisão foi elogiada pelo Relator Especial das Nações Unidas para liberdade de reunião. “Esta decisão é um marco na construção de padrões de atuação policial em protesto que respeitem o direito dos cidadãos se manifestarem pacificamente. É inaceitável que ela encontre-se ainda suspensa por pedido direto do governador à cúpula do Tribunal de Justiça de São Paulo”.
Além disso, a Conectas apresentou, ainda em 2013, um apelo urgente a cinco relatorias independentes da ONU, denunciando a truculência da atividade policial e pedindo investigações sobre o uso desproporcional da força contra manifestantes, bem como violações às liberdades de associação, expressão e circulação, além da averiguação de detenções arbitrárias, tortura, tratamento cruel e degradante e violência contra jornalistas.
A falta de um protocolo estruturado pela Polícia Militar sobre o uso da força também foi um dos alvos de ação da Conectas. A organização apresentou padrões internacionais para o uso de armamentos não-letais que, se fossem respeitados, não provocariam ferimentos graves em manifestantes. De 2013 até o momento, cinco pessoas ficaram cegas após serem alvejadas por balas de borracha no rosto, enquanto o protocolo recomenda que este tipo de disparo seja realizado da altura da cintura para baixo.
O recrudescimento da violência em ações policiais é monitorado constantemente pela Conectas. Após as jornadas de junho, a Polícia Militar sofisticou e ampliou métodos de repressão a protestos e manifestações. Notadamente, após aquele período, teve início o emprego do envelopamento – que consiste em cercar manifestantes e controlar o fluxo e direcionamento do ato – e perseguição de pessoas fora do contexto de protesto.
“Passados cinco anos das jornadas de junho, o volume de protestos diminuiu mas a vontade das pessoas de participar dos rumos do país e o conhecimento sobre os potenciais e limites dos protestos populares só aumenta. Hoje há mais iniciativas de participação democrática direta do que nunca, e o povo exige que sua voz seja escutada em todas as decisões tomadas. Infelizmente, o legislativo, executivo, judiciário e ministério público alinham cada vez mais sua atuação para limitar o direito ao protestos nos pontos mais sensíveis, como o acesso a determinados espaços públicos e o controle restrito sobre o conteúdo e a forma de manifestação de pautas políticas. O poder público busca novas maneiras de limitar mensagens que não lhe convém”, comenta Henrique.
Em tempos nos quais a militarização da vida é realidade no Brasil, com sucessivos decretos de Garantia da Lei e da Ordem e Intervenção Federal na segurança pública do Rio de Janeiro, junho de 2013 é lembrança cotidiana. A Conectas reitera seu compromisso em monitorar e denunciar abusos das forças policiais brasileiras e também na defesa irrestrita dos direitos de livre associação, expressão, circulação e manifestação de todos os brasileiros, sem distinção de qualquer natureza. A rua é um dos palcos de expressão da democracia e da efetivação dos direitos humanos. É papel do Estado garantir que tal expressão se dê de maneira segura, sem o emprego do aparato de violência.