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26/02/2021

Governo Bolsonaro desconsidera orientação da Anvisa sobre fechamento de fronteiras

Em nota enviada à Conectas, Agência diz não ter recomendado segregação contra venezuelanos nas fronteiras terrestres; entidades pedem investigação ao MPF



Nesta quinta-feira (25), Conectas e Missão Paz protocolaram uma representação ao MPF (Ministério Público Federal) pedindo abertura de investigação sobre o fechamento discriminatório de fronteiras terrestres para refugiados vindos da Venezuela. 

Documentos produzidos pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) relatam que não houve orientação do órgão para proibir de forma segregada a entrada de pessoas oriundas de países que fazem fronteira com o Brasil durante as restrições impostas pela pandemia de Covid-19.  

Os documentos foram enviados à Conectas em resposta a um parecer técnico produzido pelo Cepedisa (Centro de Pesquisas De Direito Sanitário) da USP (Universidade de São Paulo) e endereçado à agência, em dezembro do ano passado. O estudo demonstrou que as restrições impostas pelo governo federal por meio de portarias publicadas ao longo de 2020 não possuem base jurídica e sanitária.

Em resposta ao parecer, a agência declarou que “não há recomendações no sentido de segregar qualquer país fronteiriço”. Entretanto, a atual portaria editada pelo governo federal (n.º 652, de 25 de janeiro de 2021) determina restrições a migrantes provenientes da Venezuela. A portaria também impõe restrições a pessoas procedentes do Reino Unido, Irlanda do Norte e África do Sul, mas para estas, a razão são as novas cepas do coronavírus.

Segundo manifestação técnica da Coordenação de Vigilância Epidemiológica em Portos, Aeroportos, Fronteiras e Recintos Alfandegados — COVIG, em resposta à Carta-Ofício da Conectas, “as restrições referentes aos viajantes de procedência ou que tenham histórico de passagem nos últimos quatorze dias pelo Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, e pela República da África do Sul foram recomendadas ao CCSMI pela Anvisa, com base no princípio da precaução, em virtude de alertas emitidos pela OMS, acerca da identificação de novas variantes do vírus SARS-CoV-2 naqueles países. As restrições a estrangeiros provenientes da República Bolivariana da Venezuela não constam em nenhum dos documentos apresentados pela Anvisa para subsidiar a tomada de decisão do referido Comitê.”    

A agência também divulgou nota técnica enviada aos ministérios com orientações sobre a entrada de migrantes no país durante a pandemia, como determina a Lei n.º 13.979/2020

Além da Anvisa, a Conectas também encaminhou aos ministérios da Justiça, Saúde e Infraestrutura, Casa Civil e demais órgãos responsáveis pela restrição.

Em resposta à Conectas, o Ministério da Justiça e Segurança Pública afirmou que, segundo a pasta, “não há dúvida de que a portaria interministerial sob questionamento encontra respaldo legal. Demais, como diploma legal deixou bem detalhado, o normativo é precedido de recomendação técnica da ANVISA”. 

“É grave que o governo Bolsonaro desconsidere a orientação técnica da Anvisa e proíba a entrada de solicitantes de refúgio durante a pandemia enquanto permite, desde julho, que turistas entrem no território brasileiro pelos aeroportos”, destaca Camila Asano, diretora de programas da Conectas. “Trata-se de uma evidente discriminação baseada em nacionalidade e condição socioeconômica, algo que viola o espírito da Lei de Migração.”

Restrição à Venezuela e liberação da fronteira com o Paraguai

Desde a publicação da primeira portaria, em março de 2020, a fronteira terrestre com a Venezuela está fechada para migrantes. À época, o governo justificou o bloqueio com base em suposto parecer da Anvisa, o que foi rebatido pela agência. “Dessa forma, nas notas técnicas emitidas pela Coordenação de Vigilância Epidemiológica em Portos, Aeroportos, Fronteiras e Recintos Alfandegados (COVIG/GGPAF/Anvisa) não há recomendações no sentido de segregar qualquer país fronteiriço”, afirmou o órgão.

Portarias publicadas posteriormente incluíram e excluíram outros países, como a abertura irrestrita da fronteira terrestre com o Paraguai, porém, a restrição a pessoas vindas da Venezuela permaneceu inalterada. Sobre a abertura da fronteira terrestre com o Paraguai, a Anvisa informou que em uma de suas notas técnicas atentou “que a posição do governo brasileiro para liberação de abertura de fronteiras deve ser homogênea para todo o país, considerando que não há restrições para deslocamentos interestaduais.”  

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