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Notícia
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23/05/2025

Organismos internacionais alertam para riscos do projeto que altera licenciamento ambiental

Relatores da ONU e da OEA criticam projeto aprovado no Senado que flexibiliza o licenciamento ambiental e pode violar direitos de povos e comunidades tradicionais

Foto: Pablo PORCIUNCULA / AFP Foto: Pablo PORCIUNCULA / AFP


Atualizado em 26 de maio de 2025

A aprovação, pelo Senado, do Projeto de Lei 2159/2021 — que flexibiliza radicalmente as regras de licenciamento ambiental no Brasil — provocou uma forte reação de organismos internacionais de direitos humanos. A proposta, que segue agora para votação na Câmara dos Deputados, tem sido denunciada como um grave retrocesso socioambiental, com potencial de comprometer o direito ao meio ambiente equilibrado garantido pela Constituição Federal.

Preocupação da OEA

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), por meio do relator especial Javier Palummo Lantes, destacou que o projeto ameaça “os padrões de proteção ecológica e de direitos humanos”. O alerta reforça as recomendações emitidas em abril pela própria CIDH, após a tragédia climática no Rio Grande do Sul, que pedia ao Brasil que rejeitasse iniciativas legislativas que fragilizassem o controle ambiental — como o chamado “autolicenciamento”, que dispensa análise técnica e fiscalização prévia para concessão de licenças ambientais.

Em resposta à gravidade do projeto, a Conectas Direitos Humanos enviou uma carta conjunta a seis relatores especiais da ONU, pedindo que se posicionem publicamente contra o desmonte da legislação ambiental brasileira. A organização afirma que a proposta “representa uma ameaça socioambiental significativa” e “aprofundará desigualdades sociais existentes”, podendo inclusive ser questionada no Supremo Tribunal Federal por ferir preceitos constitucionais.

Reação da ONU

A reação da ONU veio no dia 26 de maio, com um comunicado oficial assinado por cinco relatorias e dois grupos de trabalho: Elisa Morgera (relatora especial sobre direitos humanos no contexto das mudanças climáticas), Astrid Puentes Riaño (relatora especial sobre o direito a um ambiente limpo, saudável e sustentável), Pedro Arrojo-Agudo (relator especial sobre os direitos humanos à água potável e ao saneamento), Lyra Jakulevičienė (presidenta-relatora do Grupo de Trabalho sobre empresas e direitos humanos) e Bina D’Costa (presidenta-relatora do Grupo de Trabalho de Especialistas em Afrodescendentes). No documento, os especialistas expressam “profunda preocupação” com os impactos do PL sobre os direitos à vida, à saúde, à água, ao saneamento e ao ambiente saudável, especialmente para povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais.

Segundo os relatores, o projeto permite que empresas obtenham licenças com base apenas em autodeclarações, elimina avaliações técnicas prévias e amplia isenções para setores com elevado impacto ambiental, como agropecuária e mineração. Também compromete mecanismos de participação pública e consulta a populações afetadas, além de afastar a necessidade de estudos prévios em terras indígenas não homologadas — que representam mais de 30% das áreas reivindicadas — e quilombolas ainda não tituladas (mais de 80%).

As mudanças violam obrigações internacionais assumidas pelo Brasil, como a Convenção nº 169 da OIT e o Protocolo de San Salvador. Os relatores também denunciam o enfraquecimento da responsabilidade empresarial e alertam para o risco de influência indevida do setor privado na formulação de leis ambientais. O posicionamento da ONU e da OEA ocorre às vésperas da COP30, marcada para novembro, em Belém (PA), e reforça a mobilização internacional contra o que é considerado o maior ataque à legislação ambiental brasileira desde a Constituição de 1988.

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