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30/09/2021

Ibama autoriza obra do “linhão” de Tucuruí sem estabelecer acordo com indígenas

Associação Comunidade Waimiri-Atroari diz que licença ambiental para empreendimento que cruza Terra Indígena é inconstitucional e aciona o Ministério Público Federal

Terra indígena Waimiri-Atroari, na divisa entre Roraima e Amazonas. Foto: Raphael Alves/TJAM Terra indígena Waimiri-Atroari, na divisa entre Roraima e Amazonas. Foto: Raphael Alves/TJAM

Após parecer favorável da Funai (Fundação Nacional do índio), o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) emitiu, na quinta-feira (28), uma licença ambiental que autoriza a construção da linha de transmissão de energia Manaus – Boa Vista, conhecida como “linhão” de Tucuruí. Lideranças do território Waimiri Atroari, que será afetado pelo empreendimento, afirmam, porém, que a decisão foi anunciada sem qualquer manifestação a respeito  do acordo compensatório que vinha sendo discutido entre os indígenas e o governo federal.

Diante do impasse, Harilson Araújo, advogado da Associação Comunidade Waimiri-Atroari, disse, em entrevista ao jornal Estadão, que entrou com um pedido para que o MPF (Ministério Público Federal do Amazonas) considere a licença do Ibama ilegal e inconstitucional. Ainda de acordo com Araújo, os indígenas souberam da liberação do empreendimento pela imprensa. 

Dos 721 km de extensão previstos no projeto de construção da rede, 125 cruzam a Terra Indígena, localizada na divisa entre Roraima e Amazonas, onde vivem aproximadamente 2,1 mil pessoas em 56 aldeias, de acordo com dados do ISA (Instituto Socioambiental). Pelo projeto, 250 torres de energia serão instaladas na área.  

Descumprimento da Convenção 169 da OIT

Para Júlia Mello Neiva, coordenadora do Programa de Defesa dos Direitos Socioambientais da Conectas, “os relatos dos indígenas apontam que, ao atropelar o diálogo em curso, a Funai e o Ibama descumprem a Convenção 169 da OIT, que  exige a realização de consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas sobre qualquer alteração que possa ocorrer em seus territórios.” 

Ainda de acordo com Neiva, a obra, além de provocar desmatamento, poderá afetar o modo de vida dos indígenas e, por isso, é essencial estabelecer um plano de compensações. 

Sem consulta aos indígenas

Em junho deste ano, o Congresso Nacional já havia aprovado uma emenda na MP (Medida Provisória) da privatização da Eletrobrás, que autorizava a construção da “linhão” de Tucuruí, sem a necessidade de licenciamento ambiental da Funai e do Ibama.  Além disso, o governo de Roraima ingressou com a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 5905 no STF para banir a necessidade de consultar previamente povos indígenas para realização de obras públicas.

O estado de Roraima questiona decretos legislativo e presidencial, publicados em 2002 e 2004, respectivamente, que obrigam o Estado brasileiro a observar  a Convenção 169 da OIT Trata-se do principal instrumento jurídico internacional de proteção aos direitos dos povos indígenas e tribais, que estabelece, dentre outras importantes garantias e obrigações, a necessidade de realização de consulta e de consentimento prévio, livre e informado dos povos indígenas sobre medidas que afetam seus direitos, seu modo de vida e a sua cultura. 

Em pedido de ingresso como amicus curiae da ADI 5905, a Conectas afirma que cabe apenas ao Congresso Nacional “resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional”. O julgamento segue em aberto. 

Violações históricas no território Waimiri-Atroari 

Essa não é a primeira vez que os Waimiri-Atroari veem seu território no centro de um grande empreendimento. Nas décadas de 1970 e 1980, durante a ditadura militar, este povo quase foi extinto por conta da construção da rodovia BR-174, que cruza o mesmo território. Ataques aéreos e terrestres e a chegada de doenças trazidas por não-indígenas mataram milhares de indígenas, de acordo com relatório da Comissão Nacional da Verdade. 

 

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