Indígenas brincam no rio Solimões durante os Jogos Interculturais de Alvarães, no Amazonas, que destacam a defesa dos territórios e da cultura ancestral. Foto: Michael Dantas / AFP
A poucas semanas da realização da COP30 no Brasil, a conferência climática ainda é pouco conhecida por grande parte da população. Uma pesquisa da Ipsos-Ipec revelou que, embora 64% dos brasileiros apoiem o evento, 55% afirmam não ter nenhuma informação sobre ele.
Diante desse cenário, o debate sobre clima e direitos humanos ganha força. Qual é a relação entre a emergência climática e as pessoas? Para entrar nesse diálogo, leia a segunda parte do Pequeno Dicionário de Clima e Direitos Humanos — uma nova seleção de verbetes de expressões centrais das discussões sobre justiça climática no Brasil e no mundo. Confira:
Economia de Baixo Carbono: modelo econômico que busca reduzir significativamente a emissão de gases de efeito estufa (GEE) dissociando o crescimento econômico do consumo intensivo de combustíveis fósseis e de outras práticas poluentes, promovendo o uso de energias renováveis, a eficiência energética, a gestão sustentável de recursos naturais e a inovação tecnológica. Não se trata apenas de “descarbonizar” a produção, mas de repensar cadeias de valor, padrões de consumo e investimentos, direcionando-os para setores e tecnologias que minimizem o impacto ambiental e contribuam para a resiliência climática. A transição para uma economia de baixo carbono envolve a reestruturação de indústrias, a criação de novos mercados e a adaptação de políticas públicas, com um olhar atento à justiça social para que a transição seja equitativa e não penalize populações vulnerabilizadas.
Educação Ambiental: processo contínuo e permanente de aprendizado, que visa formar indivíduos e comunidades conscientes sobre a problemática ambiental global e local. Seu propósito é desenvolver conhecimentos, habilidades, valores, atitudes e competências necessárias para a compreensão das relações complexas entre os seres humanos e o meio ambiente. A Educação Ambiental promove a reflexão crítica sobre os padrões de desenvolvimento e consumo, buscando a mudança de comportamentos individuais e coletivos em favor da preservação e recuperação ambiental. No contexto dos direitos humanos, a EA é fundamental para capacitar as pessoas a exigirem seu direito a um meio ambiente saudável e a participarem das decisões que afetam seu entorno.
Educação Climática: ensino e aprendizado sobre as causas, os impactos e as soluções relacionadas às mudanças climáticas. Diferente da EA em seu sentido mais amplo, a Educação Climática aprofunda-se em conceitos como o efeito estufa, gases de efeito estufa, cenários de aquecimento global, mitigação, adaptação, justiça climática e as políticas climáticas internacionais. Seu objetivo é capacitar indivíduos e comunidades a compreenderem a urgência da crise climática, a desenvolverem o pensamento crítico sobre desinformação climática e a agirem de forma propositiva para enfrentar o desafio. Ela busca não apenas informar, mas também engajar a sociedade em ações concretas, promovendo a resiliência e a capacidade de adaptação às transformações climáticas, além de estimular a advocacy (incidência) por políticas mais ambiciosas.
Emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE): liberação desses gases na atmosfera. Os principais são o dióxido de carbono (CO2), metano (CH4), óxido nitroso (N2O) e os gases fluorados (HFCs, PFCs, SF6, NF3). Eles absorvem e retêm calor, um fenômeno natural (efeito estufa) essencial para a temperatura habitável do planeta. No entanto, desde a Revolução Industrial, atividades humanas como a queima de combustíveis fósseis (para energia, transporte e indústria), desmatamento, agricultura e pecuária intensivas, e gestão inadequada de resíduos, aumentaram drasticamente a concentração de GEE. Esse aumento intensifica o efeito estufa, causando aquecimento global e mudanças climáticas. A redução das emissões de GEE é a principal estratégia para mitigar o aquecimento global, conforme acordos internacionais como o Acordo de Paris.
Energias Fósseis: são fontes de energia não renováveis que se formaram ao longo de milhões de anos a partir da decomposição de matéria orgânica soterrada (plantas e animais) sob alta pressão e temperatura. Os principais exemplos são o carvão mineral, o petróleo e o gás natural. Essas fontes de energia têm sido a base da economia global desde a Revolução Industrial, sendo amplamente utilizadas para a geração de eletricidade, aquecimento, transporte e como matéria-prima para diversos produtos químicos e plásticos. A queima de combustíveis fósseis é a maior responsável pelas emissões de dióxido de carbono (CO2) e outros gases de efeito estufa na atmosfera, sendo o principal motor das mudanças climáticas. Além disso, sua extração e transporte frequentemente resultam em impactos ambientais significativos, como desmatamento, poluição da água e do solo, e acidentes com derramamento. A transição para fontes de energia mais sustentáveis é fundamental para a saúde do planeta.
Energias Renováveis: fontes de energia obtidas de processos naturais que se regeneram continuamente (solar, eólica, hídrica, biomassa, geotérmica e energia das marés). São consideradas alternativas mais limpas e sustentáveis que os combustíveis fósseis, emitindo menos GEE e com menor impacto ambiental. Contudo, o avanço de grandes projetos renováveis pode gerar impactos significativos em comunidades locais, especialmente quando licenciamentos, processos de consulta e respeito a direitos são ignorados.
Um exemplo é o caso da Comunidade Quilombola da Serra dos Rafaéis, na Chapada do Araripe (PI), que enfrenta consequências negativas após a instalação de parques eólicos na região. Moradores relatam aumento de poeira, ruídos constantes dos aerogeradores, rachaduras em casas, danos a cisternas, além de problemas de saúde e prejuízos à qualidade de vida. A energia gerada nesses projetos é majoritariamente destinada a grandes centros, sem benefícios diretos às comunidades afetadas. A transição energética justa exige respeito aos direitos humanos, participação social efetiva e benefícios reais para as populações impactadas.
Financiamento Climático: recursos financeiros de fontes públicas (nacionais, multilaterais), privadas e alternativas, para mitigar e adaptar países em desenvolvimento às mudanças climáticas. Central em negociações climáticas internacionais (Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Clima, COPs, Acordo de Paris), reconhece a responsabilidade histórica de países desenvolvidos e a necessidade de apoiar nações em desenvolvimento, mais vulneráveis e com menos recursos. Mitigação visa reduzir emissões (ex: renováveis); adaptação ajuda comunidades e ecossistemas a se ajustarem a impactos (ex: alertas precoces, infraestrutura resiliente). Volume, acessibilidade e adequação são pontos debatidos, cruciais para países em desenvolvimento cumprirem metas e protegerem populações afetadas.
Governança Climática: conjunto de estruturas, processos, instituições, normas e mecanismos de tomada de decisão que orientam e coordenam a resposta coletiva às mudanças climáticas em diferentes níveis – global, nacional, regional e local. Ela envolve não apenas governos, mas também a sociedade civil, o setor privado, a academia e organizações internacionais.
Ao nível global, a governança climática é exemplificada pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) e seus acordos, como o Acordo de Paris, que estabelecem as regras para a cooperação internacional. Em nível nacional, envolve a criação de leis, políticas públicas, planos de ação, instituições reguladoras e mecanismos de monitoramento para implementar as metas climáticas. Uma boa governança climática é caracterizada pela transparência, participação, responsabilidade e justiça, garantindo que as decisões climáticas sejam legítimas, eficazes e equitativas, protegendo os direitos dos mais impactados e assegurando que suas vozes sejam ouvidas na elaboração e implementação das políticas.
Greenwashing: ou “lavagem verde”, é uma prática de marketing enganosa onde empresas, organizações ou governos fazem alegações falsas, vagas ou exageradas sobre esforços ou produtos ambientalmente sustentáveis. O objetivo é criar imagem positiva, desviando atenção de práticas insustentáveis ou atraindo consumidores conscientes. Manifesta-se por termos ambíguos (“natural”, “ecológico”), omissão de informações, selos falsos ou publicidade de um único atributo “verde” enquanto o restante da operação é prejudicial. Exemplo: empresa fóssil investe pouco em renováveis, mas gasta milhões em marketing para parecer “verde”, mantendo atividade poluente. Engana o público, erode a confiança em iniciativas reais, retarda a ação climática e contribui para a desinformação. Combatê-lo é essencial para a transparência e para decisões informadas e responsabilidade ambiental genuína.