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03/09/2020

Brasil e EUA articulam aliança internacional contra direitos das mulheres

Iniciativa contrária ao aborto seguro foi anunciada pelo embaixador norte-americano no Brasil. Em ofício ao Senado, Conectas cobra convocação de chanceler Ernesto Araújo



Os governos do Brasil e dos Estados Unidos estariam co-patrocinando uma declaração internacional que, sob pretexto de estabelecer princípios básicos na questão da saúde da mulher, teria como objetivo reafirmar a rejeição ao aborto e a defesa da família, segundo matéria publicada pelo site UOL.

No dia 20 de agosto passado, o embaixador norte-americano no Brasil, Todd Chapman, confirmou em evento da Fundação Getúlio Vargas que ambos os países são co-patrocinadores de documento intitulado “Declaração de Consenso de Genebra para assegurar ganhos significativos em saúde e desenvolvimento para mulheres e defender a família”.

Segundo matéria da UOL, o texto que circula entre as missões diplomáticas em Genebra enfatiza que “não há direito internacional ao aborto, nem qualquer obrigação internacional por parte dos Estados de financiar ou facilitar o aborto, consistente com o consenso internacional de longa data de que cada nação tem o direito soberano de implementar programas e atividades consistentes com suas leis e políticas”. A declaração, segundo a reportagem,  considera que “as mulheres desempenham um papel fundamental na família” e que os países signatários assumem um compromisso para “melhorar e assegurar o acesso das mulheres à saúde e ao desenvolvimento”. Mas o mesmo parágrafo, segundo UOL, afirma que tal acesso à saúde se daria “sem incluir o aborto”.

Em resposta à iniciativa anunciada no discurso do embaixador americano e disponível na íntegra no site da Embaixada dos EUA, a Conectas Direitos Humanos encaminhou um ofício às Comissões de Relações Exteriores e Defesa Nacional e de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado cobrando a convocação do ministro de relações exteriores, Ernesto Araújo, para prestação de esclarecimento sobre iniciativa.

No ofício, a entidade afirma que o Senado Federal deve acompanhar tal iniciativa da política externa brasileira e primar pela coerência entre os direitos legalmente garantidos no Brasil em termos de saúde sexual e reprodutiva e a anunciada iniciativa das diplomacias brasileira e norte-americana.

Mudança de rumos

Desde os anos 90, o Estado brasileiro é signatário de acordos globais que recomendam a prevenção de abortos inseguros, a revisão das leis punitivas e o pleno respeito pelo direito das mulheres à autonomia sexual e reprodutiva, como é o caso dos programas de ação da Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (Cairo, 1994), da IV Conferência Mundial de Mulheres (Pequim, 1995) e do Consenso de Montevidéu (Cepal, 2013).

Esta não é a primeira vez que o Brasil defende internacionalmente a criminalização do aborto. Em seu primeiro discurso na ONU, em 2019, a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, defendeu o “pleno exercício do direito à vida, desde a concepção”, reforçando a criminalização das mulheres que realizam a interrupção de sua gravidez.

Barreiras ao aborto legal

Nesta semana, cerca de 350 entidades da sociedade civil se manifestaram contra uma portaria editada pelo Ministério da Saúde que cria barreiras para a realização de aborto legal em caso de estupro. A medida, publicada no dia 27 de agosto e assinada pelo ministro interino, Eduardo Pazuello, prevê notificação obrigatória à polícia pela equipe médica, demais profissionais da saúde e até mesmo pelos responsáveis pelo estabelecimento que recebeu a paciente.

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