O governo Bolsonaro editou nova Medida Provisória que transfere a competência de demarcação de terras indígenas para o Ministério da Agricultura.
A norma, publicada no Diário Oficial da União desta quarta-feira (19), contraria decisão do Congresso Nacional, que havia delegado a competência sobre direitos dos povos indígenas ao Ministério da Justiça.
A reedição de conteúdo de Medida Provisória na mesma sessão legislativa é vedada pela Constituição Federal de 1988, conforme Art. 62, § 10, entendimento recentemente reiterado pelo Supremo Tribunal Federal.
Ao insistir em atribuir ao Ministério da Agricultura competência sobre direitos indígenas, o governo Bolsonaro reafirma sua intenção de interromper e reverter o processo de demarcação de terras indígenas no Brasil, contrariando o que prevê o Art. 231 da Constituição Federal de 1988.
“A insistência em atribuir ao Ministério da Agricultura a competência para demarcar terras indígenas mostra a ausência de disposição do atual governo em fazer cumprir o que prevê a Constituição Federal, colocando em xeque a garantia e efetivação de direitos indígenas em prol de uma visão de desenvolvimento que agride os povos da floresta”, diz Caio Borges, coordenador do Programa de Desenvolvimento e Direitos Socioambientais da Conectas.
Histórico de ataques a povos indígenas
A essas manifestações, somam-se tentativas de enfraquecimento institucional da FUNAI – incluindo recente demissão do Presidente do órgão em decorrência de choque de interesses com a bancada ruralista – e novos focos de violência contra povos indígenas, incluindo intensificação de invasão de suas terras.
Segundo dados do Conselho Indigenista Missionário – CIMI, desde a eleição do atual governo as invasões de terras indígenas aumentaram 150%. No final de outubro de 2018, um posto de saúde e uma escola em terras Pankararu, em Pernambuco, foram atacados com bombas incendiárias. No Mato Grosso do Sul, comboios de agricultores dispararam contra comunidade guarani kaiowá.
Outros relatos de violência incluem as Terras Indígenas Arara, no Pará, e Arariboia, no Maranhão, invadidas em janeiro por madeireiros e grileiros que vem tentando se estabelecer no interior de áreas demarcadas. De acordo com o Instituto Socioambiental, os povos Uru-Eu-Wau-Wau e Karipuna, ambos de Rondônia, também identificaram novas investidas de grileiros em suas terras. Há ainda relatos de ataque a tiros contra os Guarani Mbya da retomada Ponta do Arado, em Porto Alegre (RS). Na maior terra indígena do país (TI Ianomâmi), informações recentes dão conta da invasão de 20 mil garimpeiros.
Denúncia à OEA
Em audiência na Comissão Interamericana de Direitos Humanos realizada em maio de 2019, Conectas – em parceria com a Associação Interamericana para a Defesa do Meio Ambiente (AIDA), International Rivers, Fórum Teles Pires e Operação Amazônia Nativa – denunciou os retrocessos na proteção de direitos dos povos indígenas no Brasil, incluindo medidas que violariam a manutenção do modo de vida dos povos indígenas do Brasil, a transferência de funções-chave do Ministério do Meio Ambiente para o Ministério da Agricultura e a ameaça de abertura das terras indígenas aos danos da mineração.