O Governo Brasileiro repetiu dia 19 de novembro sua tradicional abstenção sobre violações cometidas pelo Irã, em votação na Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), em Nova Iorque.
Desde 2001, o Itamaraty evita condenar em Nova Iorque o regime campeão em aplicação de penas de morte em todo o mundo, e o que mais persegue jornalistas, de acordo com a ICHRI (Campanha Internacional para os Direitos Humanos no Irã).
A resolução deste ano dialoga com mudanças importantes na política doméstica iraniana, com a eleição, em junho de 2013, do novo presidente, Hassan Rouhani. O novo mandatário assumiu com um discurso tido por analistas como reformista. Entretanto, para ativistas iranianos, os compromissos assumidos não se traduziram em atos e o abrandamento em outros âmbitos (tais como um maior engajamento com a comunidade internacional no quesito do programa nuclear iraniano) ainda não se verificou na esfera dos direitos humanos.
É neste contexto que a resolução aprovada dia 19, sem o apoio brasileiro, reconhece os compromissos assumidos, mas justifica a preocupação da comunidade internacional ao enfatizar o caráter “recorrente e contínuo” das violações no país.
O texto da resolução discutida esta semana em Nova Iorque se baseia no relatório de outubro de 2013 do Relator Especial para a situação dos direitos humanos no Irã, Ahmed Shaheed. Nele o Shaheed apresenta, por exemplo, um cenário de aumento do uso de penas capitais, com 724 pessoas executadas entre janeiro de 2012 e junho de 2013, dezenas delas após a posse de Rouhani em agosto passado. Outras violações documentadas por Shaheed são: manutenção da prisão domiciliar de opositores das eleições de 2009, perseguição de minorias étnicas e religiosas, uso recorrente de penas de morte (inclusive no caso de menores) e perseguição a jornalistas e censura, incluso no contexto das eleições de junho.
Outro tema presente no relatório de Shaheed que foi contemplado pelo texto da resolução refere-se à persistência da censura à utilização da Internet no Irã. Trata-se de uma afronta direta à posição atualmente avançada pelo Brasil, em conjunto com a Alemanha, de defesa do direito à privacidade na era digital e entendimento de que a vigilância ilegal das comunicações, sua interceptação, bem como a coleta ilegal de dados pessoais constituem atos altamente intrusivos que violam o direito à privacidade e à liberdade de expressão e que podem ameaçar os fundamentos de uma sociedade democrática. Tal qual a presidenta Dilma Rousseff, o presidente Rouhani também tem sido assíduo usuário de mídias sociais para expressar suas opiniões sobre temas diversos, porém, ao contrário da mandatária brasileira, não assegura aos seus cidadãos a liberdade para fazer o mesmo.
O Brasil, que havia votado a favor da renovação do mandato do Relator Especial, no começo do ano em Genebra, não repetiu o gesto nesta resolução de Nova Iorque.
Apesar do Brasil, a resolução foi aprovada com 83 votos a favor, 36 contra e 62 abstenções. Segundo a delegação brasileira em Nova Iorque, o país absteve-se porque a resolução não refletia a situação local, por exemplo a libertação de prisioneiros políticos e a nomeação de um assistente especial para minorias e mulheres.
A mesma resolução passará por nova votação em plenária prevista para dezembro. Nesta ocasião, o país terá nova oportunidade de se pronunciar publicamente no âmbito da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre a questão e de retificar seu voto.
Em 2010, já eleita, a presidente Dilma Rousseff havia dito em entrevista ao jornal Washington Post que não concordava com a abstenção do Brasil em resolução semelhante. Desde 2001, com exceção de 2003, o Brasil se abstém diante de resoluções sobre o Irã na Assembleia Geral da ONU em Nova Iorque.