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01/10/2014

Termina a 27ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU

Com forte apoio do Brasil, Estados avançam no debate sobre drogas e direitos LGBTTI

During the votes  L.27/rev.1 During the votes L.27/rev.1" Human rights, sexual orientation and gender identity " at the Twenty-Seventh session of the Human Rights Council. 25 September 2014. UN Photo / Jean-Marc Ferré

A 27a Sessão do Conselho de Direitos Humanos (CDH) da ONU, realizada em Genebra entre os dias 8 e 29 de outubro, terminou com destaque para a atuação de países latino-americanos em debates de grande importância para o órgão.

Por um lado, lideraram resolução que recolocou o tema da discriminação e violência em razão da orientação sexual e identidade de gênero na agenda – tema marginalizado pelos Estado Mebros desde 2011. A adoção do texto foi vista como vitória depois de intensas e polarizadas negociações. Por outro, latino-americanos também manifestaram a importância de tratar a política internacional de drogas no âmbito do Conselho, na intenção de contribuir com os debates sobre o tema a partir de uma perspectiva de direitos humanos.

Ainda que a reunião tenha tido êxito em questões importantes, crises de direitos humanos como a do Egito não receberam as respostas esperadas do CDH. No caso egípcio, por exemplo, sequer houve qualquer ação do Conselho ou dos Estados Membros condenando a escalada da violência contra opositores. “Com alguns Estados, o Conselho consegue ser mais ativo. Com outros, sofre de um imobilismo inaceitável – como está claro no caso do Egito”, afirma Camila Asano, coordenadora de Política Externa da Conectas.

A situação prisional brasileira também esteve na pauta da reunião e o País reagiu de forma defensiva, ao invés de reconhecer a existência dos problemas e indicar medidas concretas para superá-los.

Leia abaixo o resumo de alguns destaques da sessão.

Drogas

Por pressão da sociedade civil e de alguns Estados, o Conselho se somou ao grupo de órgãos, entre eles a OEA (Organização dos Estados Americanos), que estão incorporando a perspectiva de direitos humanos à discussão sobre a política internacional de drogas. O tema será foco de Sessão Extraordinária da Assembleia Geral das Nações Unidas, marcada para 2016.

Conectas, em conjunto com CELS (Argentina) e Corporación Humanas (Chile), fez um pronunciamento enfatizando a necessidade de que Conselho seja protagonista nesse processo e contribua para uma mudança de paradigma na condução do tema. “América Latina, nossa região, é o exemplo do fracasso absoluto desse modelo. A guerra contra o narcotráfico tem gerado níveis de violência similares aos de conflitos armados e tem tido um enorme impacto no funcionamento dos sistemas de segurança, de Justiça e nas prisões, através da ênfase nas sanções penais e ações policiais”, afirmaram as organizações.

Delegações da Colômbia, Guatemala, México e Suíça também  apresentaram declaração oral conjunta, com o apoio de outros oito Estados, afirmando que “nós aprendemos com a experiência que uma resposta global ao problema que foque exclusivamente em políticas proibicionistas e de caráter jurídico têm impacto negativo sobre o gozo dos direitos humanos”.

Brasil também se pronunciou individualmente sobre o tema na plenária do Conselho. O País etalhou os antecedentes nas Nações Unidas e pediu que o debate seja norteado pelos princípios universais de direitos humanos. Conectas, AJD (Associação Juízes para a Democracia), ICCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa), Intituto Igarapé, ITTC (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania) e Rede Pense Livre haviam instado o Brasil a liderar e apoiar qualquer iniciativa nesse sentido no âmbito do Conselho de Direitos Humanos.

Orientação Sexual e Identidade de Gênero

Os direitos da população LGBTTI estavam fora da pauta do Conselho desde 2011. Trazê-lo de volta foi um processo polarizado e permeado por intensas negociações. Ainda que a linguagem não tenha avançado substancialmente em relação à resolução anterior, o texto aprovado durante a sessão representa avanço importante por reinserir o tema na agenda do CDH. A resolução demanda que o Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos entregue, em setembro de 2015, relatório atualizado sobre violência e discriminação em razão da orientação sexual e identidade de gênero.

Brasil, Chile, Colômbia e Uruguai lideraram a resolução. Do lado contrário, Congo, Djibuti, Egito, Malásia, Nigéria, Sudão do Sul, Uganda e Emirados Árabes tentaram aprovar seis emendas para limitar o escopo do texto e resumi-lo a uma moção genérica contrária à discriminação e à violência. Como sustentaram os co-patrocinadores do texto, “votar a favor dessas propostas é votar contra a luta contra a violência e a discriminação em razão da orientação sexual e identidade de gênero – o que é injustificável.”

Uma a uma, as propostas de emendas foram sendo rechaçadas pelo Conselho. A resolução seguiu à votação e foi aprovada por 25 votos a favor, 7 abstenções e 14 votos conta. Entre os BRICS, Brasil e África do Sul apoiaram o texto, enquanto China e Índia se abstiveram. Contra a resolução estavam Argélia, Botsuana, Costa do Marfim, Etiópia, Gabão, Indonésia, Quênia, Kuwait, Maldivas, Marrocos, Paquistão, Rússia, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos .

Apesar da vitória, os desafios continuam. Para Conectas, ainda é necessária a aprovação de resolução que avance na linguagem de direitos e coloque o tema de maneira permanente na agenda do Conselho. Esse último ponto era uma das principais bandeiras dos países que lideravam a proposta, mas acabou sendo deixado de lado durante as negociações.

Essas dificuldades, somadas à aprovação de um texto sobre ‘proteção à família’ que não reconhece as mais diversas formas de família durante a sessão anterior, evidenciam os entraves políticos e ideológicos do Conselho e um claro avanço do conservadorismo, especialmente nos debates sobre direitos LGBTTI.

Situação em países específicos

Apesar dos avanços no debate sobre drogas e orientação sexual, o Conselho não fez eco das demandas da sociedade civil com relação às situações em países específicos.

No caso do Sudão, por exemplo, o CDH continuou tratando a crise sob a rubrica da cooperação técnica (item 10 da agenda), e não no item sobre graves crises de direitos humanos, como pediam diversas organizações, entre elas a Conectas. A resolução sobre o país, no entanto, ganhou um tom mais firme e contundente do que as anteriores. Além de reconhecer as violações do direito internacional humanitário em áreas de conflito, solicita responsabilização e investigação dos crimes e a libertação imediata dos presos políticos.

O caso do Egito foi tratado com ainda mais displicência. As graves violações cometidas contra opositores nos últimos meses não foram alvo de nenhuma resolução, contrariando as demandas de diversas organizações de direitos humanos. Os Estados sequer se articularam para a realização de uma declaração conjunta, como fizeram na sessão de março.

Detenções Arbitrárias no Brasil

Outro destaque da sessão foram as denúncias feitas contra o Brasil pelo Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária da ONU. Os especialistas apresentaram relatório em que condenam as políticas de encarceramento em massa no País e demandam medidas urgentes para solucionar as violações de direitos humanos no sistema prisional brasileiro. Apesar das graves denúncias, o governo brasileiro desconversou e não deu respostas às principais conclusões do documento.

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