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11/09/2019

Saiba a importância da Lei da Migração para o Brasil

Antes da lei, foram 35 anos de um Estatuto que entendia a migração como ameaça à segurança nacional



A vinda de milhares de migrantes foi determinante para o desenvolvimento econômico e cultural do Brasil. Apesar dessa contribuição histórica, até a aprovação da nova Lei de Migração, em 2017, a legislação mantinha um caráter discriminatório e restritivo para essa parcela da população. A importância desse novo paradigma, que trata o migrante como sujeito de direito, fica ainda mais evidente quando entendemos como foi o processo migratório no país. 

Discriminação em forma de lei

Se ao longo do século XIX, a imigração era incentivada pelas autoridades brasileiras, no início do século XX a chegada massiva de imigrantes passou a despertar desconfiança do governo, que temia a chegada de criminosos e “comunistas” ao país, conforme apontam os especialistas Roberto Marinucci e Rosita Milesi. Essa situação se agravou nos anos 30 e se refletiu nas Constituições e decretos da época. Entenda:

Arte: Bianca Baderna

Um dos grupos prejudicados foi o de imigrantes judeus. Em 1935, o governo passou a negar vistos para esse grupo. Em 1937, uma circular secreta proibiu vistos a “pessoas de origem semita”, inclusive turistas e negociantes. 

Depois da 2ª Guerra Mundial, apesar de o governo voltar a flexibilizar a lei com o intuito de atrair profissionais especializados, o caráter racista se manteve na legislação. Um exemplo é um decreto de 1945 que destaca, mais uma vez, a necessidade de preservar a “ascendência europeia” dos fluxos migratórios.

Mais de três décadas de um Estatuto criado na ditadura

Toda essa herança no tratamento discriminatório dos migrantes no Brasil também esteve presente durante a ditadura militar. Foi nesse período que o general João Figueiredo sancionou em 1980 a Lei 6815, conhecida como Estatuto do Estrangeiro.  Veja no gráfico a seguir alguns dos pontos desta legislação. 

Arte: Bianca Baderna

Apesar de a Constituição de 1988 estabelecer a igualdade entre brasileiros e estrangeiros (artigo 5º), o fato de o Estatuto permanecer como legislação de referência sobre o tema gerou diversas barreiras para aqueles que chegavam ao Brasil. 

Novos fluxos evidenciam a necessidade de uma Nova Lei de Migração

Sem uma lei para garantir direitos básicos aos migrantes, coube ao CNIG (Conselho Nacional de Imigração), criado pelo Estatuto, publicar uma série de resoluções para suprir as lacunas da lei ao longo dos anos. Ao mesmo tempo, migrantes e organizações da sociedade civil que trabalhavam com a temática migratória, junto a especialistas no tema defendiam uma Nova Lei de Migração, que tivesse como perspectiva a garantia dos direitos humanos.

A partir de 2010, ao analisar os fluxos migratórios crescentes no cenário global e a notoriedade do Brasil no mundo, a Conectas decidiu incluir a migração como um de seus temas prioritários. Em diálogo com os profissionais que atuavam na área, a necessidade de uma Nova Lei de Migração era uma constante.

Membros de movimentos sociais durante a conferência de encerramento do VII Fórum Mundial das Migrações (FSMM), na Universidade Zumbi dos Palmares, São Paulo. Foto: João Paulo Brito

“Era uma lei inconstitucional e com uma série de problemas. O Brasil não tinha uma prática ruim em migração, mas se fosse seguir a letra o que estava na lei, seria um dos mais retrógrados”, destaca a coordenadora de programas da Conectas, Camila Asano.

A questão ganhou evidência com o fluxo crescente de haitianos que chegavam ao Brasil a partir de 2010, após um terremoto ter devastado o país. Naquela época, o Brasil chefiava no Haiti uma missão da ONU, a Minustah. 

Diante da falta de um mecanismo legal para regularização dos haitianos, o CNIg criou um visto humanitário para que pudessem permanecer no país, porém, o documento era concedido de forma limitada, o que levou a Conectas a divulgar uma nota pública no início de 2012 cobrando providências do governo para o caso, assim como uma definição de sua política migratória.

Haitianos fazem fila para apresentar documentação em antigo abrigo de migrantes no município de Brasiléia, no Acre, durante visita da Conectas ao local entre os dias 4 e 6/8/2013. Foto: Gabriela Bernd

“A presente situação chama a atenção para a necessidade de que o governo brasileiro defina com clareza, transparência e em diálogo com a sociedade como pretende lidar com o número cada vez maior de estrangeiros que procuram no Brasil melhores condições de vida”, questionou a Conectas, que em 2014, diante de uma sequência de violações de direitos humanos dos haitianos, levou o caso à ONU e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

Com a temática migratória em foco no país, foram resgatados e elaborados novos projetos para a criação de uma nova legislação. Em busca de consenso para aprovação da norma, o Executivo e Legislativo decidiram centralizar esforços em torno do Projeto de Lei do Senado (PLS) 288/2013, que quatro anos depois resultaria na lei 13.445, a Nova Lei de Migração. 

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