Voltar
-
16/11/2016

Repetindo o erro

Brasil se abstém em resolução da ONU sobre direitos humanos no Irã



Contrariando posições anteriores do chanceler José Serra, o Brasil se absteve em votação anual na ONU sobre a situação de direitos humanos no Irã. A resolução foi aprovada com 85 votos a favor, 35 contra e 63 abstenções. O debate aconteceu ontem (15/11) na Terceira Comissão da Assembleia Geral, em Nova York, que trata justamente de direitos humanos, questões sociais e humanitárias.

O Brasil se abstém nessa votação desde 2001 (com exceção de 2003), apesar dos reiterados pedidos por parte de organizações brasileiras e iranianas para que a posição seja alterada.

Em 2010, quando era candidato à Presidência, o atual ministro Serra qualificou o Irã como uma “ditadura fascista e feroz” e instou a então adversária Dilma Rousseff a se pronunciar sobre as relações bilaterais do governo de Luís Inácio Lula da Silva com o país persa.

As críticas também vieram da CREDN (Comissão de Relações Exteriores do Senado), que em maio de 2015 convocou o então chanceler MauroVieira para explicar a abstenção do Brasil em outra resolução sobre o Irã, proposta no Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Naquela ocasião, como agora, o governo federal justificou o voto afirmando dispor de informações que apontam para avanços na situação de direitos humanos no país.

Ontem, o ministro Alex Giacomelli, representante do Brasil na Terceira Comissão, afirmou que o Itamaraty “reconhece os esforços” do governo do Irã, como a publicação de leis sobre os direitos dos cidadãos e a maior participação de mulheres no Parlamento.“Esperamos que a estratégia do governo iraniano de um engajamento construtivo trace o caminho para uma maior participação do Irã no sistema de direitos humanos”, afirmou.

De acordo com organizações de direitos humanos iranianas, no entanto, as promessas ainda precisa ser concretizadas e a situação segue preocupante, sem melhorias substantivas.

Segundo o mais recente informe do relator especial da ONU sobre os direitos humanos no Irã, Ahmed Shaheed, publicado em setembro, entre 966 e 1054 pessoas foram executadas no país em 2015 – o maior número nos últimos 20 anos.  A ausência de números precisos acontece porque o Irã não recebe relatores especiais das Nações Unidas desde 2005, desrespeitando na prática o convite aberto a especialistas da ONU que mantém desde 2002.

Para Camila Asano, coordenadora de Política Externa da Conectas, “a abstenção desconsiderou fatos importantes e mostra que, no Itamaraty de Serra, o pragmatismo econômico parece valer mais do que o compromisso com os direitos humanos”. Ela também demandou explicações “que justifiquem o voto com fatos”.

“Em outubro, a mais alta autoridade iraniana em direitos humanos, Mohammad Larijani, foi recebido pelo Ministro da Justiça e os compromissos firmados não foram divulgados. À época, afirmamos que a falta de transparência sobre a reunião levantava dúvidas sobre a posição do Brasil na ONU. Lamentamos, hoje, que essas dúvidas tenham se confirmado e que o governo federal tenha optado por se abster, mesmo diante do grave quadro de abusos que a própria diplomacia brasileira reconheceu em seu pronunciamento ontem”,  afirma Asano.

Ela reforçou, ainda, a importância de que o Senado não seja seletivo e, repetindo a iniciativa de 2015, demande explicações do chanceler José Serra.

Aproximação comercial

Em junho, o então diretor do Departamento de Promoção Comercial e Investimentos do Itamaraty, Rodrigo de Azeredo Santos, liderou uma missão comercial para estreitar os laços com Teerã. Em outubro, Santos foi indicado para chefiar a embaixada na capital iraniana e participou da reunião promovida pelo Ministério da Justiça. A nomeação foi aprovada pela CREDN em outubro, mas ainda precisa ser confirmada pelo plenário da Casa.

Para Camila Asano, “é grave que o comunicado do Itamaraty sobre a missão não tenha mencionado nenhuma preocupação do Brasil diante das violações que acontecem no país. É mais um indicativo de que a diplomacia do novo governo é exemplar na incoerência.”

Informe-se

Receba por e-mail as atualizações da Conectas