O ministro das Relações Exteriores do Brasil, Antônio Aguiar Patriota, dirigiu-se hoje (25/02/) aos participantes da 22a. Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, num discurso marcado pela expectativa da comunidade internacional. A sessão, que só termina no dia 22 de março, acontece num dos mais importantes fóruns de debate de direitos humanos do mundo. O Brasil – que volta em 2013 a ser membro do órgão – terá de mostrar se seu compromisso vai além das palavras.
A reunião do Conselho está marcada por um clima de expectativa em relação ao Brasil, posto que o mundo precisa de novas lideranças, capazes de pautar seu protagonismo político pelo respeito irrestrito aos direitos humanos. Por outro lado, há de se ficar atento ao fato de o País lançar slogans genéricos em fóruns internacionais como este, sem necessariamente defender ideias concretas capazes de solucionar impasses complexos como os da Síria e Coreia do Norte.
Ao mesmo tempo, a relutância do País em aplicar internamente recomendações da ONU sobre prevenção à tortura e em dar resposta efetiva a questionamentos como os que foram feitos recentemente sobre a desastrosa operação policial na Cracolândia, em São Paulo, há um ano, levantam dúvidas sobre a disposição do País em fazer valer em suas ações aquilo que promete.
Última atualização: Veja o pronunciamento da Conectas feito no dia 4 de março, no Conselho, sobre Copa, Olimpíada e direitos humanos no Brasil.
Brasil, Argentina e Venezuela foram eleitos no dia 12 de novembro membros do Conselho de Direitos Humanos da ONU, num processo negociado e de resultado previsível. Os três países seriam os únicos indicados pela América Latina para as três vagas disponíveis para a região.
Em artigo publicado no dia 21 de fevereiro na seção Tendências e Debates do jornal Folha de S. Paulo, a coordenadora de Política Externa e Direitos Humanos da Conectas, Camila Asano, chamou a atenção para uma longa lista de contradições do governo.
“(…) Dilma (Rousseff, presidente do Brasil) foi inflexivelmente contra qualquer operação que envolvesse a intervenção militar (na Síria), mas foi incapaz também de apontar qualquer outra saída alternativa concreta, em uma política majoritariamente dubitativa diante de um dos regimes mais cruéis e sangrentos do mundo”, disse Camila no artigo. “Recentemente, o Brasil se ausentou da lista de 57 países de diferentes regiões do mundo que solicitaram ao Conselho de Segurança da ONU que enviasse o caso ao Tribunal Penal Internacional. Essa mesma posição relutante, falsamente confortável, também é vista no Irã -país que mais executa prisioneiros no mundo, em números per capita, e também um dos que mais prende jornalistas”, concluiu.
A presença do chanceler brasileiro em Genebra foi elogiada pela diretora executiva da Conectas, Lucia Nader. “É um sinal de que o Brasil prestigia o Conselho”. Ela disse, entretanto, que “espera que isso não fique restrito ao campo simbólico e retórico. É preciso mudanças reais no terreno aqui no Brasil e ter posições realmente mais contundentes e principistas com relação aos direitos humanos em outros países”, completa Lucia.
Conheça algumas crises de direitos humanos no mundo que serão debatidas nessa sessão em Genebra e o Brasil será chamado a se posicionar:
Coreia do Norte
Durante a sessão, a gravíssima situação de direitos humanos na Coreia do Norte voltará a ser tratada pelo Conselho de Direitos Humanos. Conectas espera uma postura firme do Brasil, sem repetição de postura dúbia quando se absteve em 2009 diante de resoluções sobre o país asiático, um dos regimes mais fechados e violadores do mundo, onde cerca de 200 mil pessoas vivem em campos de trabalho forçado.
Sri Lanka
Depois de ter se alinhado de forma problemática com o governo do Sri Lanka e ter sido conivente com aprovação de uma resolução demasiadamente branda no auge da violência da guerra civil cingalesa em 2009, espera-se que o Brasil não hesite em apoiar a resolução que está sendo negociada, enfatizando a importância de se identificar e responsabilizar os perpetradores dos abusos no conflito que matou dezena de milhares de pessoas.
Irã
Apesar de ter votado a favor da criação de um relator especial para monitorar as violações no Irã em 2011 no Conselho de Direitos Humanos, o governo Dilma manteve o histórico de abstenções nas votações de resoluções sobre direitos humanos no Irã, no âmbito da Assembleia Geral da ONU. Nesta 22a sessão será decidido se o mandato do relator deve ser renovado ou não e, dado que a situação de direitos humanos não apresentou melhorias significativas, para Conectas a postura coerente e responsável será aquela que apoie à renovação.
Líbia
Conectas também considera imprescindível que o CDH, com apoio ativo do governo brasileiro, solicite apuração dos responsáveis pelas violações cometidas antes, durante e depois da transição no país. Em 2012, a resolução acabou se enfraquecendo quando países como Arábia Saudita, Catar, Estados Unidos e Itália votaram contra emendas que solicitavam que o governo de transição líbio libertasse ou julgasse todos aqueles detidos arbitrariamente e que o Alto Comissariado para os Direitos Humanos da ONU continuasse monitorando a situação.
Birmânia
Se por um lado passos importantes de abertura foram dados na Birmânia, a situação de direitos humanos ali segue frágil. Violações massivas contra comunidades étnicas ainda são observadas e o Conselho de Direitos Humanos irá, nessa sessão, tratar do tema. O Brasil, que possui embaixada na Birmânia e que vem assistindo in loco a ainda grave situação lá, não poderia tomar uma outra posição se não apoiar uma resolução do CDH que mantenha a comunidade internacional vigilante.
Bareine
Apesar da deterioração da situação dos direitos e liberdades desde fevereiro de 2011, o Conselho ainda não adotou iniciativas formais que tratassem do caso. Em junho de 2012, o governo brasileiro fez um pronunciamento firme demonstrando sua preocupação diante do caso. Na 22a sessão, é fundamental que o Brasil reafirme seu compromisso com os direitos humanos no Bareine e apoie pronunciamento conjunto e representativo da comunidade internacional instando o governo deste país a cessar as violações e a cooperar com os mecanismos internacionais de monitoramento. Leia aqui carta enviada aos Estados membros do Conselho por Conectas e outras ONGs do mundo sobre o tema.
Síria
Nessa sessão será apresentado o novo relatório da Comissão Independente de Inquérito para Síria, presidida pelo brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro. O relatório pede que o crimes contra a humanidade e crimes de guerra sejam investigados e recomenda que o Conselho de Segurança da ONU envie o caso sírio ao Tribunal Penal Internacional (TPI). Em janeiro desse ano, o governo brasileiro não aderiu a uma iniciativa de 57 países que solicitaram formalmente que o Conselho de Segurança encaminhasse o caso ao TPI. Atualmente, o conflito já possui cerca de 70 mil mortos e mais de 900 mil refugiados.
Ouça a entrevista de Camila Asano à Radio Nacional sobre a participação do Brasil na 22a Sessão do Conselho de Segurança da ONU:
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