Às 10h dessa sexta-feira, dia 29/8, o Ministério da Justiça apresentou anteprojeto de lei sobre migrações que reforma a atual estrutura legislativa sobre o tema. O texto foi construído por uma comissão de 11 especialistas, que recebeu contribuições da sociedade civil, e vai no sentido contrário do atual Estatuto do Migrante, criado em 1980, durante a ditadura militar.
Além de desburocratizar o processo de entrada e permanência regular, a proposta abandona a ideia de que os fluxos migratórios devem ser controlados sob a rubrica da segurança nacional, como acontece no atual Estatuto. Outro avanço é a criação de uma Autoridade Nacional Migratória, que assumiria as responsabilidades hoje compartilhadas entre os ministérios do Trabalho, das Relações Exteriores, da Justiça, além da Polícia Federal.
O projeto será encaminhado dentro do Executivo pelo MJ antes de seguir para votação no Congresso.
“A aprovação abriria caminho para a construção de uma ampla política migratória, apoiada em uma nova institucionalidade e no direito humano a migrar”, afirma Camila Asano, coordenadora de Política Externa da Conectas. “Agora, o governo precisa provar que seu discurso não é vazio e que a reforma será impulsionada de fato.”
Ao lado de outras organizações da sociedade civil, Conectas participou ativamente da construção do anteprojeto de lei apresentado hoje pelo MJ. Em conjunto com o Cels (Centro de Estudios Legales y Sociales), da Argentina, a entidade elaborou recomendações para o texto.
Improviso
Frente a chegada de novos fluxos migratórios e a falta de processos de regularização claros e desburocratizados, o governo tem utilizado mecanismos improvisados, que funcionam como um remendo para as limitações da lei atual. Um exemplo é a solução dada aos migrantes haitianos que chegam ao País sem o visto humanitário. Mesmo sabendo que o pedido será recusado, eles são orientados pelas autoridades a solicitar o refúgio – o que lhes dá direito a emitir documentos e trabalhar com registro. Essa solução resolve situações pontuais, mas não cria um procedimento seguro e permanente de regularização que atenda as demandas das migrações motivadas por razões sociais, econômicas e ambientais.
Segundo dados da Acnur (Agência da ONU para os Refugiados), entre 2010 e 2013 houve um aumento de 826% nos pedidos de refúgio feitos ao Brasil. As solicitações passaram de 566 para 5256.
Nos últimos anos, o governo têm lançado mão de ações improvisadas e insustentáveis para dar resposta aos migrantes sem documentos de entrada e permanência, como é o caso da maioria dos haitianos que entram no País pelo Acre”, explica Camila. “A nova lei pode dar fim a essas soluções temporárias, que mantêm e aprofundam a vulnerabilidade dessas pessoas.”
Outros projetos
Além do anteprojeto apresentado hoje, outras duas propostas de reforma mais tímida da legislação sobre migrações tramitam no Congresso. Uma delas (PL 5.655/2009) é do próprio Ministério da Justiça e apenas atualiza o Estatuto do Estrangeiro, suprimindo a referência à ‘segurança nacional’ e mencionando os direitos dos migrantes de maneira genérica. O segundo projeto (288/2013), de autoria do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), já foi aprovado em duas comissões no Senado e aguarda votação na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.