Nesta segunda-feira, 7, a Conectas apresentou ao ministro do Superior Tribunal de Justiça, Jorge Mussi, um amicus curiae – documento com opiniões técnicas e independentes – sobre o processo de federalização dos chamados “Crimes de Maio”.
Mussi é relator do caso e o responsável por liberar o caso para julgamento. Em 2016, dez anos após os fatos, o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, acolheu o pedido da Conectas e se manifestou favoravelmente à federalização das investigações. O documento entregue servirá para embasar o relator e os demais ministros do STJ durante o julgamento, ainda sem data definida, que decidirá pela transferência ou não do processo.
Na prática, se a maioria votar a favor, a apuração sobre a série de chacinas ocorridas em maio de 2006 será reaberta e sairia das mãos do Ministério Público, da Secretaria de Segurança Pública e do Tribunal de Justiça paulistas para a competência da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e da Justiça Federal.
“Os altos índices de letalidade policial – que hoje sabemos serem os maiores nos últimos 14 anos em São Paulo – são uma triste herança da cultura de impunidade observada nesses tipos de crimes. Os policiais sabem que podem operar à margem da lei pois não há vontade política de investigá-los com imparcialidade”, ressalta Rafael Custódio, coordenador de Violência Institucional da Conectas.
Os Crimes de Maio
Há mais de 10 anos, as famílias das centenas de vítimas aguardam respostas do Estado sobre o assassinato de seus parentes, na maioria jovens da periferia, alvejados na cabeça e nas costas por grupos de extermínio.
As principais suspeitas são de uma ação coordenada e clandestina da polícia por vingança e demonstração de força, após o PCC (Primeiro Comando da Capital) ter coordenado uma série de ataques a policiais e a edifícios públicos durante cinco dias em São Paulo.
De 12 a 21 de maio de 2006, 505 civis foram assassinados e 97 feridos por armas de fogo no Estado de São Paulo. O número de mortes é cerca de quatro vezes maior do que o esperado para aquele período, se comparado com o ano anterior. A maioria das vítimas eram homens de até 35 anos, sem antecedentes criminais e moradores de áreas pobres e periféricas. Nesses mesmos dez dias, 59 agentes públicos foram mortos e 13 sofreram ferimentos.
Diante da omissão de instâncias estaduais, como Ministério Público, Secretaria de Segurança Pública e terminadas as possibilidades de recursos no Tribunal de Justiça, em 2009, a Conectas e familiares das vítimas denunciaram o caso à CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos) alegando a violação, por parte do Estado Brasileiro, da Convenção Americana de Direitos Humanos, ratificada pelo país em 1992. A denúncia ainda aguarda análise de admissibilidade pela Comissão.
No mesmo ano, Conectas realizou um pedido à Procuradoria-Geral da República para federalizar o caso, o que na prática ocasionaria a reabertura das investigações pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal e seu julgamento na Justiça Federal.
Somente sete anos depois do pedido, a PGR finalmente decidiu dar prosseguimento à demanda e solicitou ao Superior Tribunal de Justiça que a investigação da chacina do Parque Bristol passe para a esfera federal. Não há previsão de quando o caso será analisado pelos ministros do STJ.
O pedido da Procuradoria-Geral da República ao Superior Tribunal de Justiça para que as investigações da chacina do Parque Bristol – apenas um entre inúmeros outros casos de execuções sumárias ocorridos entre 12 e 21 de maio de 2006 – passem para as mãos da Polícia Federal é no mínimo tardio, levando em conta que esta demanda chegou à mesa da PGR em 2009. Ainda assim pode ser o primeiro passo na longa caminhada em busca de justiça.