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11/07/2013

‘Precisamos de mais espaços de diálogo’, diz coronel da PM sobre relação entre polícia e jornalistas

Cobertura de manifestações e atuação da Tropa de Choque é tema de segundo encontro da série



Jornalistas envolvidos na cobertura dos protestos no mês de junho, em São Paulo, não se esquecem da noite da quinta-feira, dia 13.  Sob gás lacrimogêneo e balas de borracha, diversos repórteres, fotógrafos, cinegrafistas, omunicadores-ativistas e até mesmo cidadãos que simplesmente gravavam imagens com seus celulares, acabaram vítimas de detenções arbitrárias, agressões e perseguições, experimentando a mesma violência aplicada com frequência na periferia e bairros pobres.

As agressões sofridas por jornalistas como Piero Locatelli, da revista Carta Capital, ou de Giuliana Vallone, da Folha de S. Paulo, provocaram a mobilização de organizações nacionais e internacionais e evidenciaram a necessidade urgente de repensar a relação entre a polícia e a imprensa em situações de confronto.

Na manhã da quarta-feira 10, pouco menos de um mês depois dos fatos, jornalistas se sentaram à mesa com um representante das forças policiais para fazer avançar esse debate, no segundo debate da série, promovido por Conectas, Oboré e Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo).

Durante duas horas, mais de 20 profissionais e estudantes e pelo menos mil internautas participaram de uma roda de conversa com o coronel Erich Meier Júnior, da Polícia Militar do Distrito Federal.

Jornalistas presentes questionaram o coronel sobre diversos casos envolvendo o uso excessivo da força por parte da polícia – como os casos registrados em vídeo onde a polícia deliberadamente dispara contra jornalistas, ou o caso em que uma munição de gás é lançada dentro da janela de um apartamento residencial da Praça Rossevelt, em São Paulo.

Participantes da roda de conversa também perguntaram sobre as instâncias de apuração de desvios de conduta, os mecanismos de punição e as providências tomadas nestes casos. Exemplos de uso letal de munições ditas “não letais” também foram levantados. Em diversos momentos, ficou evidente o mal estar que a ação policial provocou não apenas entre jornalistas, mas entre comunicadores de maneira geral.

Na conversa, o coronel falou sobre aspectos que deveriam nortear a atuação das forças de segurança em situações de distúrbio.


Meier explicou, por exemplo, como as tropas são treinadas para lançar bombas de gás CS – o gás lacrimogêneo – e utilizar munição de borracha de maneira adequada. “O melhor, para se livrar dos efeitos das bombas, é utilizar água em abundância e sair do local onde ela foi estourada. Os sintomas podem durar entre 30 e 40 minutos para passar”, disse. Ele também lembrou que nunca se deve pegar uma bomba de gás com as mãos. “Muitos tentam lançá-las para outro lado, mas se esquecem que há um processo de queima muito forte. A pessoa pode perder a pele da mão.”

Indagado sobre a os abusos na utilização desses armamentos, especialmente contra jornalistas, Meier afirmou que os desvios são individuais e que devem sempre ser apurados – daí a importância, segundo ele, de que todos formalizem denúncias quando necessário. “Mesmo quem não é da mídia é sujeito de direito e deve denunciar se for alvo de violência policial.” Ele defendeu, no entanto, que é responsabilidade do jornalista se identificar adequadamente. “Muita gente jovem, que não tem experiência, se misturou no lugar do tumulto. Ali você corre o risco de ser atingido”, afirmou.

Outro assunto de destaque foi a atuação dos chamados P2, policiais à paisana infiltrados que têm por tarefa fornecer ao comando informações relevantes para a atuação da PM. Segundo Meier, as informações colhidas por esses agentes – que podem estar armados – são transmitidas em tempo real para os responsáveis pela operação ou para os centros de controle. Ele disse também que o serviço de inteligência é complementado pelo constante monitoramento das redes sociais, “uma de nossas principais fontes”.

Jornalistas presentes contrastaram esta informação com relatos “agitadores infiltrados” nas marchas, que seriam usados pela polícia para incriminar participantes dos protestos, envolvendo-os por incitação à depredação.

Apesar do cerco, ele ressaltou “que a melhor estratégia de controle de manifestações é não atuar, é deixá-las acontecer” e que a atuação da imprensa não deve ser vista como uma intimidação pelos policiais. “O serviço da PM é um serviço público, que o cidadão deve ver, criticar ou apoiar.” Por fim, o coronel destacou a importância de mais espaços onde a sociedade possa discutir, abertamente, sobre o modelo de polícia que almeja. Esse esforço, segundo ele, já deu pelo menos um fruto: a portaria interministerial 4226, que estabelece diretrizes para o uso da força policial.

Veja todas as fotos da roda de conversa.

O evento foi transmitido ao vivo pela Postv e a íntegra da transmissão se encontra aqui.


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