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22/05/2012

Pés de barro: Contradições do Brasil em direitos humanos são debatidas na ONU

Conectas avalia resultado da sabatina pela qual o Brasil passou no Conselho de Direitos Humanos da ONU. Prisões, tortura, mortes de jornalistas e violações de direitos de comunidades afetadas por grandes obras tiveram destaque



No dia 25 de maio, o Brasil passou pela Revisão Periódica Universal (RPU) em Genebra, na Suíça. Trata-se de uma longa sabatina da Organização das Nações Unidas (ONU) a respeito da situação de direitos humanos no País. Missões diplomáticas de todo o mundo fizeram perguntas e formularam recomendações ao Brasil. Mais de 50 organizações da sociedade civil, incluída a Conectas, encaminharam informação para contribuir na avaliação.

Um dos temas abordados foi a política de encarceramento massivo. Hoje, mais de 500 mil pessoas estão detidas no Brasil, muitas delas em condições desumanas, quase medievais, em locais onde a prática da tortura e os maus tratos são sistemáticos. Mais de 36% da população carcerária é de presos provisórios, pessoas que ainda aguardam julgamento e podem ficar por mais de 6 meses sem ver um defensor ou o juiz pela primeira vez.
“O Brasil precisa pôr em prática o mecanismo nacional de prevenção à tortura autônomo, pendente desde 2008, quando o País ratificou o Protocolo Facultativo da Convenção contra a Tortura da ONU (este mecanismo permite o monitoramento independente de locais onde possa ocorrer tortura)”, disse Juana Kweitel, diretora de Programas da Conectas. “O Governo Dilma também vem se negando desde fevereiro de este ano, a dar publicidade ao mais recente relatório da ONU sobre tortura no Brasil, resultado de uma visita da ONU ao País em setembro do ano passado”, complementou.
Mas não somente problemas carcerários foram abordados na RPU, violações aos direitos humanos ocorridas no processo de preparação para a Copa e os Jogos Olímpicos foram discutidas. Organizações da sociedade civil denunciaram que as obras para a Copa nas 12 cidades brasileiras em vez de servir para enfrentar velhas necessidades de políticas públicas, estão sendo um catalisador de negócios imobiliários em detrimento dos mais pobres.

Uso da força e grandes obras

 

Conectas também empreendeu esforços para que países fizessem ao Brasil recomendações sobre o uso excessivo da força e violações cometidas pela polícia de São Paulo. Tanto no caso da região da Luz, no local conhecido como Cracolândia, como no Pinheirinho, no município paulista de São José dos Campos, presenciamos além do uso excessivo da força, a violação do direito de ir e vir e falta de acesso a serviço de saúde e habitação adequados.

No plano das grandes obras de infra-estrutura também há problemas. A reação do governo aos questionamentos internacionais no caso da construção da Usina de Belo Monte são alarmantes. Belo Monte, considerada a terceira maior hidrelétrica do mundo, ameaça impactar irremediavelmente a vida de 24 povos indígenas. Ante o pedido dos mecanismos de direitos humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) de interrupção do projeto enquanto não fossem realizadas, de acordo com os padrões internacionais, consultas prévias às comunidades afetadas, o Brasil reagiu de forma ríspida pondo em xeque sua política histórica de colaboração com o sistema internacional de direitos humanos.
“A lista é grande. E o espírito das críticas, cobranças e questionamentos é construtivo. O Brasil tem a missão enorme de propor um outro modelo de liderança global, mais respeitoso dos direitos humanos. Todo o processo da RPU deve ser visto como um meio a mais de aperfeiçoar suas políticas de direitos humanos “, disse Camila Asano, coordenadora do Programa de Política Externa e Direitos Humanos da Conectas, que representou a organização em Genebra.

 

+ Conclusões

“O mais difícil começa agora”, disse Camila Asano, coordenadora do Programa de Política Externa e Direitos Humanos da Conectas, que acompanhou o debate em Genebra, juntamente com representantes de outras ONGs parceiras. A sociedade civil interage neste mecanismo por meio da submissão de documentos subsidiando o debate com números, fatos e argumentos. Para Camila “os países entenderam que a situação prisional é grave”.

 


 

+ Opinião

Em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo no dia 25 de maio, a diretora executiva da Conectas, Lucia Nader, e a diretora de Programas, Juana Kweitel, falam dos problemas de direitos humanos existentes hoje no Brasil e sobre o processo de Revisão Periódica Universal. “Vivemos momento de escolhas. É hora de o Brasil decidir se quer continuar a conviver com práticas medievais ou passar a outro patamar. É hora de decidir por um modelo de desenvolvimento em que direitos básicos não fiquem a reboque de crescimento econômico e consumo. É hora, por fim, de decidir se quer ou não desempenhar um papel protagonista no cenário internacional, com base em valores e princípios”, dizem as autoras do artigo.

+ Sobre UPR
A Revisão Periódica Universal (RPU) é um processo único que envolve a revisão dos registros de direitos humanos dos 193 países que compõe a ONU, uma vez a cada quatro anos e meio. A RPU é um processo conduzido pelos Estados, sob o auspício do Conselho de Direitos Humanos, onde é oferecida a oportunidade a cada Estado de expor as ações realizadas para melhorar a situação de direitos humanos no país e cumprir com suas obrigações relativas aos direitos humanos. Como um dos principais mecanismos do Conselho, a RPU foi projetada para garantir tratamento igualitário entre todos os países quando da avaliação da sua situação de direitos humanos.

+ Entrevista

 


+ Documentos
 Compilação das informações enviadas pela sociedade civil, em inglês e espanhol
Leia alguns dos documentos que a Conectas e outras organizações parceiras enviaram para as missões diplomáticas em Genebra que participarão do UPR do Brasil no dia 25 de maio:
Recomendações feitas ao Brasil na RPU (ATENÇÃO: Este e um documento preliminar elaborado a partir dos vídeos disponíveis no site da ONU referentes à segunda passagem do Brasil na Revisão Periódica Universal (RPU) do Conselho de Direitos Humanos (CDH) da ONU. Foram sistematizadas, de forma preliminar e com tradução livre ao português, as intervenções de países que explicitamente endereçaram recomendações ao Brasil durante a sessão do CDH no dia 25 de maio. No dia 30 de maio, o CDH divulgará a versão oficial do relatório da RPU-Brasil, contendo a lista de recomendações. O Brasil poderá, de forma antecipada,  manifestar se aceita ou rejeita cada uma das recomendações que estarão contidas neste documento oficial. A resposta final sobre aceitação ou não das recomendações acontecerá em setembro de 2012 na 21ª sessão do CDH).
Conectas e Justiça Global pedem que Brasil rejeite recomendações contrárias a direitos humanos recebidas na ONU. Recomendações sobre família e matrimônio, educação religiosa nas escolas públicas e extensão das UPPs para todo o País devem ser rejeitadas.
Conectas envia carta à ONU e ao governo brasileiro indicando erros no relatório contendo descrição da sessão em que Brasil foi avaliado e a lista de recomendações recebidas pelo País na Revisão Periódica Universal. As correções indicadas são fundamentais para que o relatório da RPU reflita de forma fidedigna o processo de avaliação pelo qual o Brasil passou no dia 25 de maio de 2012. Leia a carta aqui.
Conectas e organizações parceiras pedem que Brasil aceite recomendações relacionadas aos direitos sexuais e reprodutivos feitas por Namíbia, Peru, Portugal, Senegal, França, Indonésia e Malásia. Leia a carta aqui.

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