A Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados passou a ser presidida a partir da manhã de hoje (07/03) pelo deputado Marco Feliciano (PSC-SP). Em sua trajetória até o cargo, o deputado, que é pastor evangélico, conseguiu insultar negros com declarações racistas, tratar a relação homoafetiva como doença e acusar seus críticos de fomentar uma “ditadura gay”.
A eleição de Feliciano expôs a incoerência e os pobres padrões éticos que regem as dinâmicas partidárias em Brasília – nesse caso, levada a cabo pela base aliada ao governo – e colocou em risco instituições e valores que a sociedade brasileira levou décadas para construir.
“Não podemos tolerar que os direitos humanos sirvam de moeda de troca partidária e tememos pelo futuro da Comissão”, afirma Lucia Nader, diretora executiva da Conectas. “A base da democracia é o respeito incondicional aos direitos de minorias e grupos excluídos ou estigmatizados na sociedade. Não vejo como as credenciais apresentadas até aqui pelo novo presidente possam representar qualquer garantia de que isso vá acontecer de fato. Sua eleição foi, evidentemente, um erro gravíssimo”, completa Lucia.
+ Princípios não-negociáveis
A escolha de Feliciano para presidir a CDHM e o artigo publicado por ele hoje na Folha de S. Paulo – acompanhado de artigo contrário do deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) – deixam entrever diversas perguntas. Uma delas, exposta veementemente por Feliciano, é se existe uma “ditadura” imposta por grupos da sociedade com relação àqueles que têm opiniões distintas.
A resposta, claramente, é não. O que existe, sim, é a obrigação imperativa de respeito a direitos adquiridos e construídos ao longo do processo democrático. A investida de representantes políticos contra os direitos humanos não pode nunca vir mascarada pelo discurso de desejo de mais participação e debate.
Infelizmente, essa investida não é monopólio do deputado Feliciano. Outros que atentam contra a democracia têm tentado controlar instâncias de direitos humanos. Há pouco tempo, o vereador coronel Telhada (PSDB – SP), conhecido por seu discuro truculento e notório membro da ‘bancada da bala’, fez parecido na Câmara de Vereadores de São Paulo. Telhada chegou a dizer que, se não podia participar da Comissão de Segurança Pública existente, “era obrigado a concordar que essa comissão é coisa para bandido”.
Infelizmente, há movimentos e representantes políticos que, mesmo que eleitos, são guiados por aspirações outras, que o respeito dos direitos humanos. Dizer que algo seja aceitável dentro do jogo político, não significa dizer que seja bom. No caso de Feliciano, de fato, não o é. No de Telhada, tampouco. Além disso, o discurso de ambos traz, em sua gênese, a própria negação dos valores que eles têm a obrigação – constitucional e moral – de defender quando eleitos.
Presidir uma comissão de direitos humanos requer mais do que simplesmente ter algo a dizer sobre o tema. É preciso, antes de tudo, respeito incondicional aos princípios e valores democráticos. Esse respeito passa não apenas pela correta aplicação de leis e normas, mas também pela simbologia e poder do discurso.
+ Manifestação da Plataforma Dhesca
Conectas integra e apoia integralmente a Manifestação da Plataforma Dhesca quanto à escolha do novo presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.
A nota lembra que “é de fundamental importância que a presidência da Comissão honre com a sua história de luta por direitos nesse país, de reconhecimento da diversidade e da tolerância. Esse sempre foi um espaço plural e de reconhecimento de identidades e lutas: pela igualdade racial, pelos direitos e contra a discriminação contra brasileiros/as LGBT, pela liberdade e diversidade religiosa, pela garantia dos direitos indígenas e quilombolas, pelos direitos sexuais e reprodutivos, pelo direito à memória e verdade, pelo direito a uma vida sem violência, etc”.
No dia 14 de maio, Conectas e mais 46 organizações parceiras enviaram uma carta à Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República e à presidente Dilma Rousseff, cobrando um posicionamento claro a respeito da nomeação de Marco Feliciano para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.