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Notícia
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30/10/2025

Organizações alertam ONU e OEA para ‘estratégia deliberada de confronto armado’ no Rio de Janeiro

Instituições pedem investigação internacional independente sobre a Operação Contenção, que deixou mais de 120 mortos e expôs o padrão de violência racial nas favelas do Rio de Janeiro

 (Photo by Pablo PORCIUNCULA / AFP) (Photo by Pablo PORCIUNCULA / AFP)


Dez entidades de direitos humanos apelaram, na quarta-feira (29), à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Organização dos Estados Americanos (OEA) por uma ação imediata diante das graves violações cometidas na Operação Contenção, deflagrada em 28 de outubro nos complexos de favelas da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro (RJ). A ação, que deixou mais de 120 mortos, é considerada a operação policial mais letal da história do estado e foi marcada por execuções sumárias, desaparecimentos e ataques contra moradores.

O apelo foi encaminhado a mecanismos da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização dos Estados Americanos (OEA) responsáveis por monitorar violações de direitos humanos, entre eles o Mecanismo Internacional de Especialistas Independentes da ONU para Promover a Justiça Racial (EMLER), o Grupo de Trabalho de Especialistas em Pessoas Afrodescendentes e os mandatos de relatores especiais sobre Racismo, Execuções Extrajudiciais e Defensores de Direitos Humanos. Também receberam o documento comissários e relatoras da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), incluindo as relatorias para Defensores e Operadores de Justiça, Memória, Verdade e Justiça, e Direitos das Pessoas Afrodescendentes.

O pedido foi apresentado pela Conectas Direitos Humanos, Instituto Pro Bono, Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), Justiça Global, Rede Liberdade, Redes da Maré, Instituto de Estudos da Religião (ISER), Criola, Comissão Arns e o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL). As entidades solicitam que a operação seja reconhecida como grave violação de direitos humanos e pedem a instalação urgente de uma comissão internacional independente de verificação e perícia.
Relatos de execuções e intimidação de moradores

Segundo a denúncia, a operação começou nas primeiras horas da manhã com tiroteios, fechamento de escolas e comércios, e interrupção do transporte público. Moradores relataram invasões domiciliares, agressões, tiros disparados de helicópteros e drones, e impedimento de socorro a feridos.

Na manhã seguinte, dezenas de corpos foram encontrados por familiares e moradores na mata entre os complexos da Penha e do Alemão, muitos com tiros na nuca, mãos amarradas e sinais de tortura. Apesar disso, a polícia não preservou o local para perícia e passou a investigar os próprios moradores que removeram os corpos, sob acusação de “fraude processual”.

Padrão de violência e racismo estrutural

O documento destaca que o episódio revela um padrão sistemático de violência racial e territorial já denunciado por instâncias internacionais. O Brasil acumula duas condenações na Corte Interamericana de Direitos Humanos — pelas chacinas de Acari (1990) e Nova Brasília (1994 e 1995) — e continua a descumprir obrigações de garantir investigações independentes.

As entidades citam ainda o relatório do Mecanismo Internacional de Especialistas da ONU sobre Justiça Racial, que classificou o contexto brasileiro como uma forma de “limpeza étnico-racial”, em razão do uso desproporcional da força e da criminalização da população negra e periférica.
Pedido de medidas urgentes

O apelo requer que ONU e CIDH adotem medidas urgentes, incluindo:

– o reconhecimento da Operação Contenção como grave violação de direitos humanos;
– a criação de uma comissão internacional independente para acompanhar perícias e investigações;
– proteção a familiares, moradores e defensores de direitos humanos ameaçados;
– e o fortalecimento de mecanismos de controle e responsabilização policial.

Para as organizações, “a Operação Contenção representa um contexto de execuções sumárias provocadas pelo próprio Estado, que reforça uma política deliberada de extermínio em territórios populares e de maioria negra”.

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