Relatores da ONU pediram uma investigação “independente, completa e imparcial sobre os assassinatos” da chacina de Jacarezinho (RJ). Em resposta a esta comunicação das Nações Unidas, o governo brasileiro afirmou que “promove cultura de paz” entre os agentes de segurança e moradores. O documento dos relatores e a carta do Brasil, emitidos em 31 de maio e de 21 de julho, respectivamente, estavam sob sigilo e vieram recentemente a público.
No início de maio, uma operação da Polícia Civil na favela de Jacarezinho deixou 27 mortos, tornando-se a chacina mais letal da história da capital fluminense, de acordo com o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense.
A comunicação divulgada semana passada é assinada pelos relator para o combate contra a tortura, Nils Melzer, e o relator sobre execuções sumárias, Morris Tidball-Binz e atende ao apelo urgente que entidades da sociedade civil fizeram à ONU na época dos acontecimentos. As organizações relataram uma série de ilegalidades e erros na ação policial.
Para os especialistas, “todos aqueles responsáveis por homicídios ilegais, incluindo aqueles que ordenaram extrajudicialmente, execuções sumárias ou arbitrárias devem ser levadas à justiça e as vítimas devem ter ser concedida reparação integral, incluindo garantias de não repetição”. Eles pedem ainda que as autoridades tomem as medidas necessárias para proteger testemunhas e sobreviventes de possíveis retaliações.
Ainda que trate de um caso ocorrido no Estado do Rio de Janeiro, é responsabilidade dos representantes diplomáticos do Brasil dialogar com a ONU. Assim, por meio de carta assinada pelos Ministério da Justiça e Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, o país afirmou promover uma “cultura de paz” entre agentes e moradores e que oferece treinamento para policiais em direitos humanos e preservação da vida.
Os dados, porém, mostram que o país vive uma cultura de violência e que a chacina de Jacarezinho não é exceção. Em 2020, o Brasil registrou 6.416 mortes por intervenção policial, o maior número desde 2013, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Do total das vítimas, 78,9% são pessoas negras.
Para Gustavo Huppes, assessor de advocacy internacional da Conectas, “a resposta brasileira não reconhece o racismo estrutural operante nas ações policiais do Brasil, que está sendo denunciado, com base em dados e informações concretas, por entidades da sociedade civil e por movimentos sociais, inclusive em instâncias da ONU”.
Uma das denúncias recentes é o pronunciamento realizado, em julho deste ano, por organizações brasileiras contra o descumprimento da ADPF-635, a ADPF das Favelas, por agentes de segurança pública do Rio de Janeiro, na 47ª sessão do CDH (Conselho de Direitos Humanos) das Nações Unidas.