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08/03/2016

ONU alerta para “tortura alarmante” no Brasil

Relatório apresentado hoje denuncia violência estatal contra grupos minoritários no país

Juan Ernesto Mendez, Special Rapporteur on Torture and other cruel, inhuman or degrading treatment or punishment addresses during the 16th Session of the Council of Human Rights. Juan Ernesto Mendez, Special Rapporteur on Torture and other cruel, inhuman or degrading treatment or punishment addresses during the 16th Session of the Council of Human Rights.

O relator da ONU contra a tortura, o argentino Juan Méndez, afirmou hoje durante a 31a sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, que a impunidade em casos de tortura por agentes públicos no Brasil “continua sendo a regra, e não a exceção”, sobretudo quando têm como alvo presos e grupos minoritários. A fala marca a apresentação oficial de informe divulgado pela relatoria na semana passada sobre o estado do sistema carcerário brasileiro.

  • Leia aqui a íntegra do relatório de Juan Méndez sobre os presídios brasileiros.

“A tortura e os maus-tratos por parte da polícia e dos agentes penitenciários segue sendo um fato alarmante e de ocorrência regular, principalmente contra pessoas que pertencem a minorias raciais, sexuais, de gênero e outros grupos minoritários”, afirmou o relator. “Insto o governo brasileiro a tomar medidas que ponham fim à brecha existente entre a legislação e as políticas ambiciosas do país, por um lado, e a situação cotidiana das pessoas privadas de liberdade ou em conflito com a lei, por outro.”


Assista a fala de Juan Méndez:


Rogerio Sottili, secretario especial de Direitos Humanos do Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, representou o Brasil na reunião. Ele saudou o relatório e afirmou que o trabalho conjunto entre organizações internacionais e Estados para avançar na garantia de direitos e reconheceu que “são diversos os campos em que ainda precisamos avançar”. “Nós evidentemente não vamos mudar uma cultura de violência de 500 anos de um momento a outro. Mas estou convencido de que começamos a transformar essa cultura de discriminação e violência em uma cultura de direitos”, afirmou.

Como exemplo de avanços, mencionou a criação do Sistema Nacional e Prevenção e Combate à Tortura e o projeto piloto do CNJ (Conselho Nacional de justiça) de audiências de custódia, que garantem a apresentação de presos em flagrante a um juiz em menos de 24 horas.

  • Leia aqui o pronunciamento feito por Rogerio Sottili. Leia aqui as considerações feitas pelo governo brasileiro sobre o relatório de Juan Méndez.

As conclusões de Méndez serão endossadas pela Conectas Direitos Humanos e pela ABGLT (Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros). Em pronunciamento oral previsto para amanhã às 5h (horário de Brasília), as entidades vão reforçar a importância de revisar a atual lei de drogas, responsável pelo encarceramento de um quarto da população prisional brasileira, e pedirão compromisso do governo com o fim da revista vexatória e com a criação de mecanismos estaduais de prevenção e combate à tortura nos moldes do que já existe em âmbito federal.

As organizações também vão enfatizar a violência sofrida pela comunidade LGBT  por parte da polícia e dos agentes penitenciários – outro ponto levantado pelo relatório de Méndez. As entidades demandarão, ainda, treinamento adequado da polícia e dos agentes penitenciários para lidar com a diversidade racial e de gênero e a aprovação do PL 7764/2014, que proíbe a revista vexatória em todo o país.

Leia aqui o pronunciamento que será feito pela Conectas e a ABGLT. 


Assista o pronunciamento das organizações:


Os dados apresentados por Méndez foram colhidos durante uma visita de 12 dias em agosto de 2015. Foi a primeira missão da relatoria ao país em 15 anos. O especialista visitou quatro estados (Alagoas, Sergipe, São Paulo, Maranhão), além do Distrito Federal, motivado por denúncia levada por ONGs ao Conselho de Direitos Humanos em 2014 sobre a violência no complexo de Pedrinhas, no Maranhão.

Esse foi o único presídio a receber um tópico específico no relatório. Apesar de reconhecer uma queda significativa no número de mortes (entre fevereiro de 2013 e fevereiro de 2014 foram mais de 60), Méndez afirma que as condições de detenção continuam “explosivas”.

Na semana passada,  Conectas, Justiça Global, SDHM (Sociedade Maranhense de Direitos Humanos) e OAB-MA publicaram um relatório inédito detalhando os problemas e abusos cometidos em Pedrinhas. O documento mostra que o Brasil tem falhado no cumprimento de medidas cautelares e provisórias expedidas pela Comissão e pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos).

  • Leia aqui a íntegra do relatório sobre presídio de Pedrinhas.

Hoje, mais de 600 mil pessoas estão presas no Brasil – uma população superior a de capitais estaduais como Cuiabá e Porto Velho. Entre os países com a maior população carcerária do mundo, o Brasil é o único a ver crescer sua taxa de encarceramento (número de presos por cada grupo de 100 mil habitantes), da ordem de 299,7. O déficit de vagas provocado por essa política supera 330 mil. Segundo dados de 2014 do Ministério da Justiça, 41% de toda a população prisional não foi julgada.

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