Luiz Alberto Figueiredo Machado chega ao ministério das Relações Exteriores para substituir Antonio Patriota, demitido após fuga para o Brasil do senador boliviano Roger Pinto. A agenda do novo chanceler já está cheia: a crise se recrudesce na Síria e também no Egito, o partido de Robert Mugabe sai mais uma vez vitorioso de eleições amplamente contestadas por organizações de direitos humanos do Zimbábue e o Brasil fracassa em receber de maneira adequada dezenas de imigrantes haitianos que chegam ao país todos os dias.
Para as organizações reunidas ao redor do Comitê Brasileiro de Direitos Humanos e Política Externa (CBDHPE), cuja Secretaria Executiva atualmente é ocupada pela Conectas, esse é o momento de reforçar e cobrar o cumprimento de 10 compromissos assumidos pela presidente Dilma Rousseff ainda durante a campanha. Eles incluem o respeito às obrigações regionais e internacionais assumidas pelo Brasil – o envio de relatórios periódico aos órgãos multilaterais de direitos humanos, por exemplo –, a prevalência dos direitos humanos nas relações externas brasileiras e a criação de mecanismos de participação, controle democrático e transparência na pasta.
A expectativa foi consolidada em carta enviada na semana passada ao novo ministro. No documento, o Comitê sublinha a crescente importância do Brasil no cenário internacional e, em contrapartida, a falta de um fórum permanente de diálogo sobre política externa – cuja proposta, segundo o Itamaraty, deveria estar pronta até o final de 2013. “Cabe enfatizar o vínculo indissolúvel entre os direitos humanos e a política externa, conforme preceituado no Art. 4, II, da Constituição Federal, princípio esse que motiva e fundamenta a participação brasileira como parte em numerosos tratados internacionais de direitos humanos e uma atuação internacional que reflita valores democráticos e de atenção à proteção dos direitos da pessoa humana”, diz o documento.
+ Transparência
Através da Lei de Acesso, a Conectas fez quatro pedidos de informação ao Ministério das Relações Exteriores. Em dois casos, um sobre razões do adiamento da visita do Relator Especial das Nações Unidas para a Saúde, Anand Grover, e outro sobre a concessão de vistos para haitianos, a organização obteve resposta. Veja as solicitações que ainda estão pendentes:
Movimentações financeiras e projetos implementados pelo Fundo IBAS
Conectas pediu acesso a informações sobre o Fundo IBAS (Índia, Brasil e África do Sul) para o Alívio da Fome e da Pobreza. Criado em 2004, o Fundo é resultado da parceria dos três países no âmbito do Fórum IBAS, que completará em breve 10 anos de existência. Apesar de haver uma lista contendo projetos finalizados e projetos em andamento disponível no site do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, Conectas fez um pedido de informações específicas sobre a gestão do Fundo, em termos de análise financeira e de mecanismos de avaliação de impacto. Dentre elas, dados referentes ao fluxo de caixa do Fundo e dos projetos, bem como avaliações de impacto acerca dos projetos implementados até a presente data, feitas pelos governos cooperantes ou pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
Dia 22 de maio, o governo respondeu à Conectas, dizendo que parte do pedido era “desproporcional ou desarrazoado”, mas encaminhou no entanto o relatório do PNUD de 2011 sobre o Fundo, documento já disponível publicamente e que não contem as informações solicitadas, bem como alguns artigos de jornais estrangeiros publicados nos países beneficiários do Fundo (como, por exemplo, este artigo publicado no Jornal Nô Pintcha de Guiné Bissau em 2011) descrevendo alguns dos projetos implementados com auxílio do Fundo. Visto que as informações recebidas não correspondiam àquelas solicitadas, Conectas entrou com recurso junto ao Itamaraty. O recurso questiona a falta de razoabilidade do pedido, posto que foram solicitadas informações básicas de gestão de apenas 7 projetos concluídos e 9 em andamento.
Atuação de diplomatas brasileiros no Sistema Interamericano
Para saber mais sobre o posicionamento do Brasil no processo de fortalecimento do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, Conectas perguntou ao Itamaraty como Brasília orientou seus diplomatas nesse processo. O governo enviou, no dia 18 de junho, resposta ao pedido inicial da Conectas juntamente com dois telegramas liberados – mantendo o sigilo sobre outros noventa e seis. Considerando a resposta insatisfatória, Conectas entrou com recurso junto ao Itamaraty, que respondeu mantendo o sigilo dos telegramas. A organização entrou novamente com recurso, dessa vez perante a autoridade máxima do órgão, o Ministro das Relações Exteriores, pedindo tanto o acesso à informação quanto a desclassificação das informações sigilosas. O MRE respondeu e forneceu uma lista com informações básicas sobre a classificação dos telegramas. O recurso seguinte foi dirigido à CGU sobre a negativa de acesso e à Comissão Mista sobre a negativa de desclassificação (leia aqui). O recurso dirigido à CGU foi encaminhado à Comissão Mista, que ordenou, em janeiro de 2013, a reclassificação ou desclassificação dos documentos ao término das razões que motivaram a classificação (veja a decisão). Em aplicação desta decisão, o MRE deveria acabar com o sigilo dos documentos requeridos uma vez finalizada a Assembleia Extraordinária da OEA, como comunicou Conectas em ofício dirigido ao Ministro. Até o momento, o acesso às informações não foi liberado Consulte aqui o passo a passo deste pedido. No dia 21 de maio, Conectas notificou, via SIC, o descumprimento da decisão da Comissão Mista ao Secretário Geral do MRE, Autoridade de Monitoramento da lei de acesso à informação no órgão.
Em abril deste ano, por ocasião da reunião anual entre o chanceler e a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, a Conectas lançou a campanha “Ministro, eu #QueroSaber”. Durante uma semana, a organização colheu através das redes sociais e enviou aos senadores e suplentes mais de 30 perguntas de sobre a política externa brasileira. Diante da mobilização, o ex-ministro se comprometeu a abrir mais canais de diálogos com a sociedade civil.
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