O STF e a melhoria do acesso à Justiça
Questões relacionadas ao acesso à Justiça e à Defensoria Pública estão na agenda do STF (Supremo Tribunal Federal). Nas últimas semanas, foram três os julgamentos em que prevaleceu a autonomia das Defensorias estaduais. Essas decisões fortalecem a instituição pública responsável por prestar assistência jurídica gratuita à população que não pode pagar por esse serviço.
Na primeira decisão, no dia 29 de fevereiro, o Plenário considerou inconstitucional a obrigatoriedade da Defensoria Pública paulista estabelecer convênios com a Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de São Paulo. No julgamento da Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 4.163, o Plenário entendeu, por unanimidade, que a instituição deve ter o poder de decidir se quer ou não firmar convênios e com quem. Tal liberdade é requisito essencial para que a Defensoria possa exercer sua missão constitucional.
Em seguida, foi a vez das Defensorias do Maranhão e de Minas Gerais terem sua autonomia afirmada por todos os ministros do tribunal. As Adins 4056 e 3965 impugnavam as legislações estaduais que incluíam as Defensorias na estrutura administrativa dos Estados, subordinando-as aos governadores. O STF acertou ao entender que tal estrutura engessaria a independência da instituição.
Na semana passada, o STF deliberou a respeito da Defensoria Pública de Santa Catarina, único estado brasileiro em que a instituição ainda não foi criada. A lei questionada pelas Adins 3.892 e 4.270 determinava que a assistência jurídica gratuita fosse organizada pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) local. O tribunal estabeleceu o prazo de um ano para que a situação no estado fosse alterada. Passado esse período, a legislação deve perder a eficácia, o que na prática significa que o STF determinou a criação da Defensoria estadual.
Há ainda mais uma ação relevante a ser julgada pelo tribunal. De relatoria do Ministro Gilmar Mendes, a Adin 4.608 foi proposta pelo Partido Social Liberal contra previsão legal que determina que o Ouvidor-Geral da Defensoria Pública seja cidadão não integrante da carreira. Conectas Direitos Humanos e Instituo Pro Bono requereram ingresso como amicus curiae nesse caso, sustentando a tese de que a exigência de que o Ouvidor-Geral seja alguém estranho à carreira é o único desenho possível para se garantir que a Ouvidoria cumpra sua dupla função de exercer o controle interno da qualidade do serviço prestado pela Defensoria e de representar um canal de interlocução com a sociedade civil. O fortalecimento da Defensoria Pública no cenário atual é imprescindível. Segundo o Diagnóstico da Defensoria Pública no Brasil, de 2009, existem em média 32.000 potenciais beneficiários do serviço para cada defensor. A relação é assustadora e certamente compromete o direito de defesa de uma parcela importante da população.
Ficou evidenciado nos três julgamentos que o STF, através de seus ministros, tem uma preocupação enorme com esse tema. Ao proclamar o seu voto, na Adin 4.163, o ministro Gilmar Mendes foi incisivo em afirmar que, sem o fortalecimento e aprimoramento da advocacia pro bono e de interesse público, realizada por advogados simpáticos a esse ideal, não conseguiremos construir uma democracia plena e efetiva em relação àqueles que não podem custear um advogado e necessitam de assistência jurídica de qualidade. O recado foi bem encaminhado para aqueles que insistem em manter o monopólio da pobreza.
Artigo originalmente publicado no site Última Instância, pelo diretor adjunto da Conectas, Marcos Fuchs, e a advogada da Conectas, Flávia Annenberg.