Diante do crescente número de casos positivos do novo coronavírus no país, diversas entidades têm se posicionado a fim de exigir medidas urgentes de prevenção e contenção da doença no sistema penitenciário. Elas pedem, entre outras medidas, o desencarceramento imediato de pessoas que compõem os grupos de risco, frente à pandemia que já afeta ao menos 164 países.
Na segunda-feira (16), o IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa) entrou com pedido de liminar no STF (Supremo Tribunal Federal) para reduzir a população prisional. A medida visa a beneficiar pessoas que fazem parte do grupo de risco da covid-19, como maiores de 60 anos, soropositivos, diabéticos, portadores de tuberculose, câncer, doenças respiratórias, cardíacas e imunodepressoras, entre outras. O pedido inclui ainda gestantes, lactantes e acusados de crimes não violentos.
O requerimento foi feito dentro de uma ação no Supremo, que reconheceu em 2015 o estado de coisas inconstitucional do sistema carcerário brasileiro pelas violações de direitos humanos e situação degradante. Em resposta ao pedido, o relator do caso, ministro Marco Aurélio, conclamou juízes de execução a avaliarem prisão domiciliar e liberdade condicional para detentos sob risco da doença. O ministro destacou, ainda, a necessidade de outros ministros da Corte se pronunciarem sobre o caso.
Na mesma direção, o CNJ emitiu, nesta terça-feira (17), uma recomendação a tribunais e magistrados para adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus. A decisão deve vigorar por 90 dias, com possibilidade de prorrogação, e traz orientações ao Judiciário como redução do fluxo de ingresso no sistema prisional e socioeducativo; suspensão excepcional da audiência de custódia; e suporte aos planos de contingência deliberados pelas administrações penitenciárias dos estados em relação às visitas; entre outras.
Em nota conjunta publicada no mesmo dia, a Rede Justiça Criminal, coletivo de organizações que trabalham diretamente com o sistema prisional, reforçou o pedido de desencarceramento imediato de pessoas que compõem o grupo de risco da covid-19. O documento destaca a vulnerabilidade da população negra dentro e fora do cárcere, que deverá ser diretamente impactada pela disseminação da doença por estar mais submetida a péssimas condições de moradia, saneamento básico e insuficiência do atendimento público de saúde.
No sábado (21), o MNPCT (Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura), principal ferramenta de fiscalização e combate a maus tratos no sistema prisional, publicou nota técnica sobre as medidas de enfrentamento à covid-19 em instituições de privação de liberdade. No documento, o órgão manifestou sua preocupação com a saúde de pessoas confinadas nestas instituições, assim como os profissionais que lá atuam. A nota destaca que “todo esforço deve ser buscado a fim de reduzir o número de pessoas institucionalizadas e a superlotação em presídios e unidades socioeducativas. Ademais, são urgentes medidas que orientem os governos, gestores e profissionais que atuam em espaços de privação de liberdade quando iniciarem as suspeitas e as confirmações de pessoas privadas de liberdade infectadas com covid-19”.
Em nota conjunta, o CNPCT (Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura), MNPCT e CNDH (Conselho Nacional de Direitos Humanos) manifestaram preocupação com respeito à pandemia no sistema prisional e destacaram como boa prática a recomendação do CNJ e a manifestação de 16 relatores especiais do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, que exorta os Estados à adoção de medidas preventivas de contenção do contágio proporcionais, necessárias e não-discriminatórias.
Para o coordenador do programa de Enfrentamento à Violência Institucional da Conectas, Gabriel Sampaio, é fundamental que o Judiciário tome medidas rápidas para prevenir que a pandemia se espalhe entre uma das parcelas mais vulneráveis da população.
“Estamos extremamente preocupados com o completo despreparo do Estado brasileiro para lidar com a chegada desta pandemia ao sistema penitenciário. São mais de 773 mil pessoas que se encontram hoje atrás das grades, em celas superlotadas e sem a possibilidade de procedimentos mínimos de higiene e isolamento rápido”, destaca Sampaio. “A população prisional já enfrenta surtos de doenças que estão controladas na sociedade, como a tuberculose. Como o Estado poderá garantir a contenção de uma enfermidade que segue incontrolável no mundo todo?”
*Nota atualizada em 24 de março, para inclusão da nota técnica do MNPCT; e em 31 de março, para inclusão de nota conjunta do CNPCT, MNPCT e CNDH.