O presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um pronunciamento na 78ª Assembleia Geral da ONU em Nova York (EUA), onde afirmou o compromisso de seu governo em alcançar a igualdade racial no Brasil e criticou a inércia global no combate às desigualdades.
Desde 1955, o chefe de Estado do Brasil abre a sessão de discursos da Assembleia Geral. Esta foi a oitava vez que Lula, em seu terceiro mandato na presidência da República, ocupou a tribuna das Nações Unidas para inaugurar um dos principais fóruns globais que discute os grandes desafios relacionados à promoção da paz, democracia e direitos humanos.
“O racismo, a intolerância e a xenofobia se alastraram, incentivadas por novas tecnologias criadas supostamente para nos aproximar”. “Queremos alcançar a igualdade racial na sociedade brasileira por meio de um décimo oitavo objetivo que adotaremos voluntariamente”, disse Lula em referência à Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da ONU, que reúne 17 objetivos para alcançar a sustentabilidade.
O presidente também disse que seu governo irá combater todas as formas de violência contra as mulheres, defenderá os direitos LGBTQIA+ e das pessoas com deficiência. Para a internacionalista Camila Asano, diretora-executiva da Conectas, é muito importante o presidente destacar o combate às desigualdades de gênero e raça em seu discurso. “Tratar da desigualdade racial e de gênero no Brasil só será possível quando populações historicamente oprimidas ocuparem espaços decisórios, como o Poder Judiciário. Mulheres, pessoas negras, indígenas e populações LGBTQIA+ precisam estar no centro das discussões do país e do mundo”.
Organizações do movimento negro e da sociedade civil encabeçam neste momento uma campanha para Lula indicar uma mulher negra à vaga que será aberta no Supremo Tribunal Federal em razão da aposentadoria da ministra Rosa Weber. Em 132 anos, os níveis de diversidade racial e de gênero na Corte são extremamente baixos.
Lula usou o termo desigualdade pelo menos 16 vezes em sua fala e criticou a falta de ações globais para combater as diferentes desigualdades. “É preciso antes de tudo vencer a resignação, que nos faz aceitar tamanha injustiça como fenômeno natural. Para vencer a desigualdade, falta vontade política daqueles que governam o mundo.
Ele também fez críticas a organismos internacionais, incluindo a própria ONU, FMI e Banco Mundial, e afirmou que o Brasil “está se reencontrando consigo mesmo, com nossa região, com o mundo e com o multilateralismo”. A reforma em organismos internacionais para a maior participação de países do Sul Global nos espaços de decisão é uma bandeira histórica da diplomacia brasileira.
Asano afirma que “se o Brasil quer voltar à centralidade do debate no multilateralismo, é fundamental que o país se comprometa com a defesa inabalável do sistema internacional de direitos humanos e seus tratados internacionais, incluindo aqueles dedicados ao combate aos crimes contra humanidade como o Estatuto de Roma [do Tribunal Penal Internacional].”
As questões do clima também ocuparam centralidade no discurso de Lula, que destacou a transição energética como um ativo do Brasil contra a crise climática. De acordo com Asano, essa transição precisa ser justa e inclusiva. “A sociedade civil brasileira tem evidenciado violações de direitos humanos em comunidades quilombolas e indígenas próximas a parques eólicos, por exemplo”. Para ela, “é crucial incluir os povos originários no debate sobre a crise climática, algo que não apareceu no discurso presidencial. Apesar disso, Lula tem demonstrado interesse no tema e criou o Ministério dos Povos Indígenas, que deve ter condições materiais para desenvolver atividades em prol dos direitos constitucionais das comunidades originárias”.
Ainda sobre a crise climática, Lula mandou um recado para os países desenvolvidos, os maiores emissores de carbono: “agir contra a mudança do clima implica pensar no amanhã e enfrentar desigualdades históricas. Os países ricos cresceram baseados em um modelo com altas taxas de emissões de gases danosos ao clima. A emergência climática torna urgente uma correção de rumos e a implementação do que já foi acordado. Não é por outra razão que falamos em responsabilidades comuns, mas diferenciadas”.
Na avaliação de Asano, ao falar sobre a responsabilidade histórica dos países com a crise climática e o papel do Brasil em desenvolver caminhos sustentáveis no enfrentamento aos problemas do clima, espera-se do governo brasileiro uma postura corretiva, no ambiente doméstico e internacional, sobre o uso excessivo de combustíveis fósseis e a revisão a respeito da abertura de novos locais de exploração de petróleo, especialmente em regiões sensíveis como a foz do Amazonas. Para ela, “o presidente Lula frustrou expectativas ao não se comprometer a revisar a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil, medida essencial para que o país esteja em conformidade com o Acordo de Paris e corrija a “pedalada climática” do governo Bolsonaro.