O Ministério da Saúde revogou, na terça-feira (16), seis portarias assinadas pelo governo Jair Bolsonaro que, de acordo com a pasta, contrariavam diretrizes do SUS (Sistema Único de Saúde). Entre as portarias revogadas, está a que previa (Portaria nº 2.561) a necessidade da equipe médica notificar a autoridade policial em caso de aborto por estupro.
Publicada em setembro de 2020, essa portaria dificultava a realização do aborto legal em casos previstos em lei. O texto tornava o processo mais burocrático e penoso determinando quatro etapas para o procedimento: o relato da vítima perante profissionais da saúde; depois, a elaboração de um parecer técnico com a assinatura de três integrantes da equipe médica; assinatura de um termo de responsabilidade pela vítima; e, por fim, a assinatura da vítima em um novo termo de consentimento. Em uma das etapas, a portaria previa que os médicos informassem sobre a possibilidade de visualização do feto ou embrião por meio de ultrassonografia.
Na ocasião, entidades da sociedade civil manifestaram preocupação com a portaria, classificando-a como violadora dos direitos sexuais e reprodutivos. O caso chegou a ser discutido pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em uma ação proposta (ADPF 737) por cinco partidos políticos e com a participação de organizações de direitos humanos na condição de amicus curiae, incluindo a Conectas.
Agora, volta a vigorar uma norma de 2017 sobre a interrupção da gravidez, que prevê um protocolo técnico para a realização do procedimento pelo SUS. “A portaria revogada feria a autonomia de mulheres e meninas vítimas de violência sexual em nosso país. O SUS tem que ser um ambiente acolhedor para essas pessoas, e principalmente, garantidor de direitos”, afirma a advogada Raissa Belintani, coordenadora do Programa de Fortalecimento do Espaço Democrácito da Conectas.
Em seu discurso de posse no início de janeiro, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, já havia sinalizado a revisão de medidas que ofendessem as ciências e os direitos humanos. De acordo com a pasta, todas essas normas anuladas não haviam sido pactuadas com representantes do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) e do Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde). “A falta de transparência, diálogo e definições conjuntas entre União, estados e municípios é totalmente contrária aos preceitos básicos do SUS, que determinam uma gestão compartilhada do sistema de saúde brasileiro.”