O Banco Mundial, referência na aplicação de salvaguardas socioambientais e de direitos humanos no financiamento de projetos de desenvolvimento, está a um passo de flexibilizar suas exigências e reduzir a proteção de populações afetadas por grandes empreendimentos e políticas públicas. A mudança, preveem especialistas, deve influenciar negativamente os critérios adotados por outras instituições financeiras que usam o banco como baliza.
Segundo Caio Borges, advogado do projeto de Empresas e Direitos Humanos da Conectas, a decisão mostra que o aumento da concorrência entre fontes de financiamento está incentivando “um relaxamento da rede de proteção social construída pelo banco ao longo de décadas”.
“O Banco Mundial sofre pressão para emprestar mais e continuar a ser relevante em um cenário em que bancos regionais e nacionais, como o BNDES, multiplicam seus desembolsos e fortalecem seus investimentos transnacionais”, explica Borges. “Mas se o Banco Mundial reduz os padrões de proteção, há um incentivo explícito para que outros bancos de desenvolvimento também o façam”, completa.
Para Juana Kweitel, diretora de Programas da Conectas, “isso é especialmente grave nesse momento de criação de novas instituições financeiras multilaterais, como é o caso do Novo Banco de Desenvolvimento dos Brics.”
Organizações da sociedade civil envolvidas no processo de revisão dos parâmetros pediram que o Code (Comitê para o Desenvolvimento Efetivo do Banco Mundial) rejeitasse o envio do projeto para a segunda rodada de consultas públicas. O Comitê não acatou as críticas e deu sequência ao processo de revisão das salvaguardas.
Na atual versão, o texto flexibiliza a realização de avaliações de riscos e impactos socioambientais pelos governos que recebem financiamentos. Também permite que esses governos optem por não cumprir com a política de proteção aos povos indígenas em situações que possam “acirrar conflitos étnicos”.
Para mais de 70 organizações latino-americanas, “o rascunho proposto não só contraria o objetivo principal do Banco Mundial de erradicar a pobreza extrema e promover uma prosperidade compartilhada, como também reduz o padrão de proteção para toda a comunidade internacional”.
Leia aqui o documento na íntegra.
Outra moção de repúdio partiu da coalização Bank on Human Rights, da qual Conectas faz parte. Em carta enviada ao Banco, o grupo afirma que “ainda que a linguagem tenha sido melhorada em algumas partes, o fato de que os parâmetros passem de um texto baseado no compromisso com processos e padrões estabelecidos para outro, de orientações vagas e abertas, ameaça esvaziar de sentido esses avanços técnicos”.