Conectas aderiu hoje ao abaixo assinado que pede à Justiça a revisão da prisão de Rafael Braga Vieira, morador de rua preso no Rio por portar água sanitária e desinfetante no momento de uma manifestação. Ele foi preso com três outras pessoas – todas já liberadas – e permanece como o único condenado e preso na onda de protestos de junho de 2013.
Contrariando laudo técnico do Esquadrão Anti-bombas da Polícia Civil carioca, que julgava “ínfima” a possibilidade de que os produtos encontrados com Rafael fossem utilizados para a produção de um coquetel molotov, o juiz Guilherme Schilling Pollo Duarte, da 32a Vara Criminal, condenou o morador de rua a cinco anos e dez meses de prisão por porte de artefato explosivo.
“O caso de Rafael Braga Vieira não acende nossa indignação apenas por sua prisão arbitrária, mas também porque a consideramos emblemática de uma estratégia intencional de recado de desencorajamento aos manifestantes, um símbolo da repressão em plena democracia, abuso de poder, violência e injustiça aos mais vulneráveis, usados como bodes expiatórios para a classe que não pode ser tocada no asfalto”, diz o documento que será entregue ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e ao Conselho Nacional de Justiça.
Leia abaixo o manifesto na íntegra:
MANIFESTO DAS ORGANIZAÇÕES DE DIREITOS HUMANOS E MOVIMENTOS PELA LIBERTAÇÃO DO JOVEM RAFAEL BRAGA VIEIRA
O mês de Junho de 2013 já está marcado na memória de quem vivenciou os seus dias de intensas manifestações públicas. Como um grito que há muito incomodava a garganta dos brasileiros, mais de um milhão de pessoas foram às ruas, em todo o país, ao longo de todos os dias do mês, em uma demonstração de indignação que teve início com a inconformidade dos aumentos das passagens dos ônibus, em contraste com a má qualidade dos serviços oferecidos pelos transportes públicos do país.
O que parecia ser uma “rebeldia momentânea”, de jovens inconformados, cresceu de maneira assustadora, tomou o país e também expôs uma face perversa do estado. Incapazes de controlar a continuidade crescente das manifestações e sob a desculpa de restabelecer a ordem, em todos os estados a repressão policial endureceu de maneira a manchar a imagem do Brasil ao redor do mundo, diante das imagens de pessoas comuns agredidas violentamente, encurraladas nas avenidas como presas, expostas a todo tipo de truculência.
É neste cenário, que no dia 20 de Junho, em meio aquela que foi considerada a maior das manifestações no Rio de Janeiro, que o jovem Rafael Braga Vieira, negro, 26 anos, morador de rua, conhecido nas redondezas onde se encontrava por também viver catando latas como forma de ganhar algum dinheiro, foi preso. No momento da prisão, Rafael Braga Vieira portava uma garrafa plástica contendo água sanitária e outra garrafa plástica contendo desinfetante. O jovem julgado e condenado porque a justiça entendeu que o mesmo portava material para a produção do explosivo “coquetel molotov”.
O caso de Rafael Braga Vieira não acende nossa indignação apenas por sua prisão arbitrária, mas também porque a consideramos emblemática de uma estratégia intencional de recado de desencorajamento aos manifestantes, um símbolo da repressão em plena democracia, abuso de poder, violência e injustiça aos mais vulneráveis, usados como bodes expiatórios para a classe que não pode ser tocada no asfalto. Sobre o caso, recordamos que:
1. Rafael Braga Vieira foi preso com outros quatro manifestantes. Os três foram liberados posteriormente. Sem acesso a qualquer tipo de defesa, apenas o jovem morador de rua permaneceu detido;
2. De todas as manifestações que houve no mês de Junho no Rio de Janeiro, com uma soma que passou do meio milhão de pessoas, estranha que o único preso condenado tenha sido um jovem, negro, morador de rua, sem nenhuma identificação ideológica;
3. O laudo técnico do Esquadrão Anti-bombas da Polícia Civil afirma que as duas garrafas encontradas com ele tinham “ínfima possibilidade de funcionar como coquetel molotov”.
4. O laudo ainda chama atenção para o fato de as garrafas encontradas com Rafael Braga Vieira serem de plástico, o que inviabiliza agirem como coquetel molotov, que necessariamente precisa que as mesmas sejam de vidro;
Chamamos ainda a atenção para o fato de o jovem Rafael Braga Vieira se enquadrar exatamente no perfil de sujeitos que mais morrem pela violência institucional e são o recorte principal da superlotação de nossas penitenciárias, verdadeiros espaços de desumanidade, mais ainda evidenciados pela recente repercussão das condições do presídio de Pedrinhas, no Maranhão, verdadeiro depósito de gente “matável”.
Por tudo isso, nos dirigimos ao Judiciário brasileiro, ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ao Conselho Nacional de Justiça, a quem possa realmente intervir e fazer prevalecer a justiça. Manifestamos então nosso pedido DE REVISÃO DE CASO e A LIBERDADE PARA RAFAEL BRAGA VIEIRA.