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16/05/2014

Lei de Acesso faz 2 anos, sob críticas

Para Conectas, governos blindam sem critério as áreas de segurança e política externa

Para Conectas, governos blindam sem critério as áreas de segurança e política externa Para Conectas, governos blindam sem critério as áreas de segurança e política externa

Governos estaduais e Federal têm blindado suas áreas de segurança pública e temas de política externa, contrariando o espírito da Lei 12.527/2011, conhecida como Lei de Acesso à Informação, que completa 2 anos na sexta-feira, dia 16/5.

Conectas usou este recurso 29 vezes ao longo dos dois primeiros anos de funcionamento da ferramenta, criada para dar maior transparência à gestão dos assuntos públicos pelos governos no Brasil, e se deparou com “um muro de opacidade em áreas consideradas sensíveis, com certo exagero”, segundo a diretora adjunta da organização, Juana Kweitel.

No caso mais recente, o Governo Federal se negou em todas as instâncias a fornecer informações sobre a gestão de R$ 1 milhão em recursos públicos do chamado Fundo Ibas, formado para “aliviar a pobreza” nos países membros do bloco – Brasil, Índia e África do Sul. Conectas requisitou informações sobre o impacto das ações do fundo e o detalhamento financeiro das despesas de cada projeto. A CGU (Controladoria Geral da União), num parecer de 17 páginas, recomendou que as informações solicitadas fossem fornecidas, mas o ouvidor-geral, José Eduardo Romão, negou o acesso. Diante das reiteradas negativas em todas as instâncias, a organização pretende judicializar a disputa nos próximos dias. (Leia matéria de O Globo a respeito, por Thiago Herdy).

Dificuldade semelhante foi encontrada ao solicitar informações à Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo sobre uma das mais violentas operações policiais contra manifestantes, em 13 de junho de 2013, no Centro de São Paulo. Conectas queria saber quem foram os responsáveis pela ordem de dispersar a marcha pacífica, quanta munição foi usada e que providências foram tomadas para responsabilizar os policiais que flagrantemente cometeram abusos, além de mais sete questões objetivas. No dia 2 de setembro, o governo respondeu, dizendo que as informações solicitadas são sigilosas. Conectas recorre à própria secretaria, como previsto em lei. (Leia o caso completo)

A organização sistematizou todas essas experiências e constatou que 25,9% de todos os pedidos feitos e concluídos até maio de 2014 ficaram sem resposta. Em 7,4% dos casos, o acesso às informações públicas foi negado.

‘Opacidade é a regra’

“Quanto mais irrelevante o assunto, mais transparente é a postura do governo. Daí o número global tão positivo que eles apresentam, sobre casos atendidos. Mas, toda vez que solicitamos dados realmente importantes, eles são negados”, diz Juana. “Há uma cultura disseminada de que assuntos relevantes são secretos e de que a população não deve se meter em assuntos de segurança e de política externa. É preciso mudar uma cultura. A lei sozinha não fará isso.”

O problema aumenta quando a organização apela à instâncias superiores. Conectas recorreu à segunda instância em 13 ocasiões – 8 casos ficaram sem resposta e 2 tiveram o acesso à informação negado.

A Comissão Mista, criada para analisar casos em que os pedidos são negados, é formada exclusivamente por membros do governo, o que compromete as decisões. Além disso, não existe informação pública disponível sobre quando os recursos são julgados, muito menos uma ata que registre os parâmetros que tenham balizado as decisões.

“Quem deveria fiscalizar a transparência tampouco é transparente”, diz o advogado Rafael Custódio, coordenador do Programa de Justiça da Conectas. “Nem os prazos previstos em lei são cumpridos. As respostas chegam muito tempo depois de vencida a data. E isso acontece em São Paulo até mesmo com a Corregedoria, que deveria, em tese, zelar pelo correto funcionamento da Lei”.

Ele considera ainda que deveria haver um banco de dados público no qual toda a sociedade poderia ver os pedidos feitos, as respostas concedidas e as negadas, e as razões para tal.

Quando a Lei funciona

Em alguns casos, entretanto, a Lei de Acesso foi uma ferramenta fundamental para pressionar o governo a rever políticas violadoras de direitos humanos.

O caso mais flagrante é o da chamada “revista vexatória”, feita sob alegação de impedir a entrada de drogas, armas e chips de celular nas prisões. Na “revista”, pessoas são obrigadas a se despir completamente, agachar três vezes sobre um espelho, contrair os músculos e abrir com as mãos o ânus e a vagina para que funcionários do Estado possam realizar a busca.

Por meio de dados coletados pela Lei de Acesso, entretanto, a Rede de Justiça Criminal, da qual Conectas faz parte, descobriu que esta justificativa não se sustenta. Documentos oficiais fornecidos pela própria Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo, mostraram que apenas 0,03% dos visitantes carregavam itens considerados proibidos, ou seja, 2 visitantes de cada 10 mil. Em nenhum dos casos registrou-se a tentativa de entrar com armas. A pesquisa levou em conta dados coletados pelo Governo nos meses de fevereiro, março e abril dos anos 2010, 2011, 2012 e 2013. Enquanto isso, a apreensão de objetos ilegais dentro das celas foi quatro vezes superior à quantidade apreendida com parentes, o que prova que os objetos entram por outros meios, que não os familiares. (Conheça a campanha para pôr fim à revista vexatória).

Seminário

Um debate organizado pela Artigo 19 em parceria com Conectas, Transparência Brasil e Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) discutiu hoje os avanços e retrocessos na implementação da Lei de Acesso à Informação no Brasil. O evento “Desafios da transparência” aconteceu na Escola de Direito da FGV (Rua Rocha, 233) no dia 16/5, às 10h.

Participaram da mesa Paula Martins, da Artigo 19, Marina Atoji, da Abraji, Natália Paiva, da Transparência brasil, Juana Kweitel, da Conectas, e Marta Machado, da FGV.

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