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09/10/2020

Entidades repudiam declaração de Mourão sobre coronel Ustra

É inaceitável que o vice-presidente da República lance mão de uma tentativa de revisionismo histórico absurda como esta, que busca reescrever a biografia de um dos mais cruéis e abomináveis personagens da história do nosso país.



O Instituto Vladimir Herzog e a Conectas Direitos Humanos vêm a público para repudiar a declaração do general Hamilton Mourão que, em entrevista no dia 7 de outubro a uma emissora de televisão alemã, elogiou o coronel Brilhante Ustra, chamando-o de “homem de honra”, negou as críticas que são feitas ao torturador e afirmou que ele respeitaria os direitos humanos.

É inaceitável que o vice-presidente da República lance mão de uma tentativa de revisionismo histórico absurda como esta, que busca reescrever a biografia de um dos mais cruéis e abomináveis personagens da história do nosso país.

Carlos Alberto Brilhante Ustra foi o chefe do Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) de São Paulo, divisão que comandava a repressão durante a ditadura militar que aterrorizou o Brasil entre 1964 e 1985. Enquanto esteve à frente do órgão, o DOI-Codi registrou, em 40 meses, pelo menos 50 mortes de opositores do regime e um episódio de tortura a cada 60 horas. Ustra era supervisionava as sessões de tortura e, muitas vezes, assumindo as agressões.

Em 2008, se tornou o primeiro militar a ser reconhecido como torturador pela Justiça. O Tribunal de Justiça de São Paulo deu ganho de causa à Ação Declaratória da família Teles, que o acusava do sequestro e da tortura de César, Maria Amélia, Criméia, Janaína e Edson Teles, estes últimos com apenas 5 e 4 anos, respectivamente.

A tortura é, como atestam legislações, tratados e convenções internacionais, uma das mais terríveis e abomináveis práticas da humanidade. Não por acaso, é objeto central do quinto artigo da carta magna dos direitos humanos – a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que em 2018 completou 70 anos: “Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.”

Ao defender o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o general Hamilton Mourão, mais uma vez, manifesta uma posição absolutamente incompatível com o Estado Democrático de Direito, falseia a história e avilta o direito à memória e à verdade, previsto na Constituição.

O vice-presidente evidencia uma total dificuldade de compreender o esforço civilizatório e a escolha da humanidade por um futuro que conjugue liberdade, justiça, respeito e promoção dos direitos humanos, e se pavimente nos verdadeiros ideais democráticos.

Dizer que o coronel Brilhante Ustra era um homem de honra e respeitava os direitos humanos é negar a gravidade dos atos cometidos por ele e por todo o regime militar durante esse período sombrio, marcado por violência, tortura, autoritarismo, corrupção, censura e gravíssimas violações de direitos humanos perpetradas contra cidadãos em todo o país.

Seguimos atentos a tentativas de revisionismo histórico como essa, cientes de que elas só são possíveis porque o Brasil ainda deve justiça às vítimas das graves atrocidades cometidas no passado. Garantir a tarefa incompleta de se consolidar a democracia no Brasil é indissociável da necessidade de fazer justiça a todos que sofreram com a violência do Estado. Para que não se esqueça e para que não siga se repetindo.

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