Nesta quarta-feira (5), o plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) referendou uma decisão liminar do ministro Luis Roberto Barroso que obriga o governo federal a adotar medidas urgentes para conter o avanço da pandemia nos territórios indígenas.
De autoria da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), em conjunto com os partidos PSB, PCdoB, PSOL, PT, REDE e PDT, a ADPF (Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental) 709 reivindica que o Judiciário determine imediatamente a adoção pelo governo de ações para garantir proteção aos povos indígenas no contexto de grave crise epidemiológica. Dentre os pedidos, havia também a extrusão dos invasores presentes nas TI’s Yanomami, Karipuna, Uru-EuWau-Wau, Kayapó, Araribóia, Munduruku e Trincheira Bacajá.
No início de julho, o ministro Luis Roberto Barroso acolheu parte dos pedidos para salvaguardar os povos indígenas diante da pandemia. Em sua liminar, Barroso determinou a criação de barreiras sanitárias aos isolados a fim de evitar o contágio do vírus, a criação de uma sala de situação para gestão de ações de combate à pandemia quanto a povos indígenas em isolamento ou de contato recente, com participação das comunidades, por meio da APIB, da Procuradoria-Geral da República e da Defensoria Pública da União e a elaboração e monitoramento de um Plano de Enfrentamento à Covid-19 para os Povos Indígenas Brasileiros, com participação de comunidades indígenas, entre outras medidas.
O ministro também ordenou que os serviços do Subsistema Indígena de Saúde sejam acessíveis a todos os indígenas aldeados, independentemente de suas reservas estarem ou não homologadas.
Foi justamente esta decisão que foi acatada pelo plenário da Corte nesta quarta.
O julgamento virtual teve início nesta segunda (3) com o voto favorável do relator Luis Roberto Barroso, acompanhado pelo pronunciamento de representantes das instituições requerentes e amici curie no caso, e foi concluída nesta quarta, com o voto dos demais ministros.
Confira a sessão completa:
O que a ação representa
O simples fato da Apib, uma entidade indígena, ter sido reconhecida pelo STF como legítima para apresentar esta ação é uma conquista histórica e significativa.
Até então, além de partidos políticos, a Suprema Corte apenas acatava pedidos de ingresso com ações semelhantes vindos de entidades profissionais, sindicatos e afins, atribuindo a estas o significado de “entidades de classe”, termo previsto na Constituição para as instituições que podem entrar com ações do tipo no STF.
A decisão de Barroso pode gerar importante jurisprudência para que outras entidades, como entidades representantes de mulheres, defensores de direitos LGBT e etc sigam os mesmos caminhos.
Impactos da decisão
De acordo com dados da Apib, o país já contabiliza 599 mortes e 20.809 casos confirmados de Covid-19 entre os povos indígenas em todo território nacional.
A Funai (Fundação Nacional do Índio) aponta para 450 territórios indígenas homologados e outros 236 estão em fase de delimitação, declaração ou em estudo.
No entanto, para as entidades requerentes, tanto a Constituição Federal quanto a Lei nº 9.836/99, que institui o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, garante a oferta de serviço de saúde a estes povos e não faz distinção de atendimento entre territórios indígenas demarcados ou não.
Para as organizações, é fundamental que a decisão da Corte contemple o atendimento pelo SUS sem fazer distinções.
“Os objetivos da ADPF nº 709 terão pouco alcance caso não se confirme em análise de mérito pelo plenário a abrangência da decisão favorável para o atendimento no SUS indígena para as áreas que ainda não foram definitivamente demarcadas”, aponta um trecho do pedido.
Remoção de invasores
A questão que mais gerou divergência no plenário da Corte foi justamente um dos pontos fundamentais da ação movida pela Apib e pelos partidos: a expulsão dos invasores de terras indígenas.
A petição pede que a União aja para remover os invasores de sete terras indígenas: Yanomami, Karipuma, Uru-Eu-Wau-Wau, Kayapó, Araribóia, Mundukuru e Trincheira Bacajá. As entidades pedem também que seja estabelecido um prazo para o plano de remoção ser implementado e os invasores retirados.
Justamente este ponto foi rejeitado por Barroso em sua decisão liminar no início de julho ao acatar os demais pedidos.
A Apib havia recorrido a esta rejeição, apontando que “os riscos à saúde dos povos indígenas decorrentes da presença e das atividades criminosas dos invasores são incomparavelmente superiores aos de uma operação para a retirada dessas pessoas. E esses riscos sanitários eventualmente provocados por operações de extrusão podem ser minimizados, com a adoção de cautelas fundamentais, tais como a testagem prévia e quarentena obrigatória dos agentes estatais envolvidos nessas operações”.
Na sessão desta quarta, os ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber e Gilmar Mendes afirmaram que o governo deve elaborar um plano de retirada, mas não fixaram prazo.
Já Edson Fachin e Lewandowski, defenderam que a Corte tem de estabelecer uma data limite para realizar as ações de remoção dos invasores. Porém, apontaram períodos diferentes: Fachin propôs conceder 60 dias para o governo fazer a retirada após a homologação do plano de remoção, enquanto Lewandowski defendeu dar 120 dias ao Executivo apresentar um planejamento nesse sentido.