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09/04/2014

Governo fecha abrigo para haitianos em Brasileia

Para Conectas, solução improvisada não resolve problema de fundo



O Governo do Estado do Acre disse hoje à Conectas que fechará o abrigo de imigrantes na cidade de Brasileia, na fronteira com a Bolívia. As autoridades acreanas prometeram retirar até sábado todos os imigrantes – a maioria, haitianos – que viviam abrigados, com a promessa de transferi-los para um centro de exposições na capital, Rio Branco e, de lá, despachá-los para Porto Velho, em Rondônia, de onde serão fornecidos ônibus para fazer o traslado a São Paulo, de acordo com informações do administrador do abrigo de Brasileia, Damião Borges.

Mais de 20 mil haitianos já passaram pelo abrigo de Brasileia em três anos e nas últimas semanas, mais de 2.500 pessoas chegaram a se amontoar no local, projetado inicialmente para receber 300 albergados. Só no dia do anúncio, mais 108 haitianos chegaram ao local. De acordo com Damião, todos os novos imigrantes serão informados de que o abrigo foi transferido para Rio Branco. A partir de então, o traslado entre Brasileia e a capital será feito por conta do imigrante, que pode ainda optar por dar entrada no pedido de documentos na própria fronteira, sem direito a alimentação, abrigo ou qualquer outro apoio das autoridades locais, de acordo com Damião.

Para Conectas Direitos Humanos – organização que esteve no abrigo em agosto do ano passado, fazendo denúncias públicas e participando de reuniões bilaterais com os ministérios das Relações Exteriores, Justiça e Trabalho, além de realizar uma audiência regional sobre o tema na OEA (Organização dos Estados Americanos), em Washington, denunciando as precárias condições do abrigo e os problemas do ‘visto humanitário’ oferecido pelo Brasil – a medida é apenas paliativa e não resolve a questão de fundo.

“Demoraram mais de 8 meses para tomar uma providência. E, quando isso foi feito, percebemos que se trata, na verdade de mais uma solução provisória, paliativa e descoordenada”, disse Camila Asano, coordenadora de Política Externa da Conectas. “Se o chamado ‘visto humanitário’ estivesse, de fato, sendo concedido como se previa, na Embaixada do Brasil em Porto Príncipe, nenhum desses imigrantes haitianos precisariam passar por essa provação, viajando na mão de coiotes pelo Peru, até chegar ao Brasil, muitos deles apenas com a roupa do corpo.”

Camila diz que o episódio evidencia a precariedade da atual Lei de Migração no Brasil, do tempo da ditadura. Para ela, o País precisa urgentemente rever sua legislação sobre o tema, sob risco de envolver-se constantemente em crises semelhantes. No caso do Haiti, aparece como agravante o fato de o Brasil ter alardeado a adoção de um remendo chamado ‘visto humanitário’, por meio do qual o governo nega o estatuto de refugiado a todos os haitianos, mas entrega documentos de trabalho e CPF, oferecendo o que Camila considera como “uma política de acolhimento parcial, que não dá conta da complexidade e da fragilidade deste fluxo vindo do Haiti, um país severamente castigado, primeiro, pela violência e, em seguida, por um dos maiores desastres naturais de que se tem notícia”.

Brasileia

Quando esteve no abrigo, Conectas constatou as péssimas condições de acolhida. O espaço, com capacidade para 200 pessoas, era então dividido por 800. Apenas 10 latrinas e 8 chuveiros atendiam os imigrantes. Não havia distribuição de sabão ou pasta de dente e o esgoto corria a céu aberto. O hospital local diz que 90% dos pacientes provenientes do campo tinham diarreia. A organização denunciou a situação e recebeu, do governo federal, a promessa de uma força tarefa. Nada foi feito desde então.

Camila refuta o argumento do Governo do Estado do Acre, de que a população de Brasileia estava carregando um fardo pesado demais e precisava se livrar dos imigrantes. “Se isso aconteceu, foi unicamente por culpa do Governo do Estado do Acre e do Governo Federal. Ambos levaram meses para lidar com o problema, deixando com que milhares de pessoas vivessem no meio do esgoto, enfurnados num lugar coberto por lonas plásticas, com homens e mulheres misturados, sem as mínimas condições de dignidade”.

 

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