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11/11/2020

Estados americanos avançam para pôr fim à “Guerra às Drogas”

Em votação paralela ao pleito presidencial, eleitores votam pela descriminalização da maconha e de outras substâncias



Em plebiscitos paralelos ao pleito presidencial, eleitores de seis estados americanos garantiram nas urnas, na última terça-feira, 3, avanços significativos que podem ajudar a colocar fim à política de Guerra às Drogas.

Cinco estados – Arizona, Dakota do Sul, Nova Jersey, Montana e Mississipi – aprovaram a legalização da maconha para uso recreativo ou fins medicinais, fazendo com que, ao menos, um terço da população do país passe a ter acesso legalizado à substância.

No entanto, Oregon se destacou por se tornar o primeiro estado a descriminalizar a posse e o porte de todas as drogas. Quem for flagrado com pequenas quantidades de cocaína, heroína, LSD ou metafetamina, para citar alguns exemplos, não será preso ou será processado, sendo encaminhado para serviços de saúde. A experiência é inspirada em Portugal, que tomou o caminho já em 2000. 

“Descriminalizar o uso de drogas significa olhar a questão sob a perspectiva de saúde pública e não a partir de um olhar criminal. A ideologia da chamada ‘Guerra às Drogas’ durante todos estes anos apenas deixou um rastro de pessoas mortas, marginalizadas e relegadas a prisões já inchadas”, afirma Henrique Apolinário, advogado do programa de Enfrentamento à Violência Institucional da Conectas.

Com o resultado das urnas, o EUA passam a ter 15 de seus 50 estados permissivos ao uso recreativo de maconha e 35 estados possibilitando o uso medicinal da droga. Chama atenção o grande número de estados conservadores que optaram por políticas de descriminalização da cannabis. 

Houve avanços também com a votação de promotores de justiça que concorreram com a bandeira de reduzir a persecução de pessoas presas com baixas quantidades de drogas – como em Austin – ou aumentar a fiscalização da atuação policial, em locais como San Diego e Minneapolis. 

A vez do Brasil

No Brasil, o principal debate sobre a descriminalização do porte de drogas para uso pessoal está parado no STF (Supremo Tribunal Federal) desde 2015. 

Em outubro de 2019, o então presidente da corte, o ministro Dias Toffoli, decidiu adiar mais uma vez o julgamento, que estava marcado para o início de novembro mas foi retirado de pauta por conta da discussão sobre prisão após condenação em segunda instância. Três dos onze ministros já se manifestaram a favor de um Recurso Extraordinário apresentado pela Defensoria Pública de São Paulo a favor da descriminalização, embora não haja consenso sobre quais substâncias deveriam ser pautadas. 

A Conectas, a Plataforma Brasileira de Política de Drogas, o ITTC (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania), a Pastoral Carcerária e o Instituto Sou da Paz, dentre outras organizações ligadas aos direitos humanos, são “amici curiae” – instituições aceitas para contribuir com informações técnicas em decisões dos tribunais – no caso e trouxeram os avanços recentes no tema em todo o mundo, assim como os impactos da criminalização da população negra no país

As instituições defendem que a Lei 11.343 de 2006 é mais um exemplo normativo que reflete a ideologia da chamada “guerra às drogas”.

Desde a implementação da lei, o número de pessoas presas por crimes relacionados a drogas subiu mais de 500%, a maioria negros e pobres, sendo o principal fator a levar o Brasil a possuir a terceira maior população carcerária do mundo.

O número é especialmente alarmante entre as mulheres. Entre 2006 e 2019, o sistema prisional feminino passou de 17.216 a 37.197, um aumento de 116%.

A criminalização nega acesso àqueles que usam as drogas para fins medicinais. Esse ano, a ANVISA sofreu fortes pressões para dificultar o acesso científico e medicinal à cannabis. Na mesma linha, o Brasil realinha-se a países conservadores na ONU para impedir maior acesso à planta para estudos, como sugere a OMS. 

“A opção pela criminalização afasta a pessoa que usa drogas dos serviços sociais e de saúde, aumentando os riscos de uso problemático”, explica Apolinário, “ao mesmo tempo, confere amplos poderes à polícia, para buscar quantidades ínfimas de drogas, às custas da intimidade e liberdade de grande parcela da população”, conclui Apolinário.

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