Após uma visita de 12 dias ao Brasil, o relator especial das Nações Unidas sobre os direitos à liberdade de reunião pacífica e de associação, Clément Voule, manifestou preocupação, em documento com suas observações preliminares divulgado na segunda-feira (11), com projetos de lei antiterroristas “que criminalizam os movimentos sociais” e tramitam, atualmente, no Congresso Nacional.
O especialista da ONU também alertou para os riscos à liberdade de reunião e associação causados pela extinção de mecanismos participativos nacionais e pela polarização política no país. Ele realizou visitas em Brasília, Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo.
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Voule expressou “profunda preocupação” com os projetos de lei 272/2016, 1595/2019 e 732/2022. De acordo com suas observações, estas propostas “têm avançado no processo legislativo e baseiam-se em definições amplas de terrorismo fazendo da legislação um instrumento fácil para criminalizar o ativismo”, disse. Citando especificamente o PL 1595/2019, o relator afirmou que a proposta reforça atos oficiais de intimidação e ameaças, além de silenciar críticos do governo e opositores políticos, levando à criminalização de movimentos sociais e à restrição de liberdades fundamentais. Já a respeito do PL 732/2022, o especialista da ONU disse que o texto utiliza do prexto de segurança nacional e combate ao terrorismo para criminalizarar efetivamente as atividades dos movimentos sociais.
Na avaliação do relator da ONU, o Brasil está passando por uma preocupante tendência de redução do espaço cívico. “Preocupam-me políticas que restringem a participação social e política, limitando espaços de consulta sobre políticas públicas e tomada de decisão”. O relator destaca que desde 2019, pelo menos 650 conselhos, comitês e outros mecanismos participativos foram fechados, enquanto os demais, como o Conselho Nacional de Direitos Humanos, enfrentam sérios obstáculos ao funcionamento, incluindo questões orçamentárias e dificuldades administrativas para realizar suas reuniões. “Esses conselhos são importantes espaços de garantia de diálogo entre o governo, a sociedade civil e as comunidades, sobre desafios de direitos humanos”, completou Voule. O governo federal é responsável pela manutenção destes órgãos.
“Preocupa-me o ambiente polarizado que poderia desencorajar os cidadãos de votar nas próximas eleições”, destacou o relator. Para ele, as ameaças e violências contra candidatos e candidatas geram terror entre a população e impedem que as pessoas dispostas a concorrer se sintam seguras para se candidatarem. Para ele, o Estado precisa garantir que o direito à liberdade de associação seja respeitado durante todo o processo eleitoral, reforçando a proteção contra violência, assédio e intimidação. Voule ainda destacou que a falta de resolução de casos graves, como o assassinato da defensora dos direitos humanos e vereadora Marielle Franco, envia um sinal errado e uma preocupante mensagem. “O Estado deve investigar de forma eficaz, rápida, exaustiva e imparcial o assassinato [de Marielle Franco] e tomar medidas contra os responsáveis em conformidade com o direito nacional e internacional”, recomendou o relator.