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27/05/2020

No STF, entidades pedem suspensão de operações policiais no Rio



Uma coalizão de entidades ingressou ontem (25) com um pedido no STF (Supremo Tribunal Federal) de suspensão das ações policiais no Rio de Janeiro durante a pandemia de Covid-19. O pedido foi endereçado ao ministro Edson Fachin, relator da ADPF 635 — ação proposta pelo PSB (Partido Socialista Brasileiro) que pede que sejam reconhecidas e sanadas as graves violações ocasionadas pela política de segurança pública do Estado.

As entidades pedem que o STF determine a não realização de operações policiais em favelas durante a epidemia de Covid-19, salvo hipóteses absolutamente excepcionais, devidamente justificadas por escrito pela autoridade competente e com a comunicação imediata ao Ministério Público. Nos casos extraordinários, as entidades pedem ao STF que determine cuidados excepcionais para não colocar em risco ainda maior a população, a prestação de serviços públicos sanitários e o desempenho de atividades de ajuda humanitária.

A peça protocolada nesta terça foi proposta pelo PSB, autor da ADPF 635, em conjunto com a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Educafro, Justiça Global, Redes da Maré, Conectas Direitos Humanos, Movimento Negro Unificado e ISER, entidades habilitadas como amicus curiae na ação. Para as entidades, o quadro dramático de violação de direitos humanos na implementação da política de segurança do Rio de Janeiro agravou-se ainda mais desde o voto do ministro Fachin, em especial ante ao avanço da pandemia de Covid-19 nas favelas e periferias do Estado.

Contexto

O julgamento da ADPF 635 teve início em 17 de abril, quando o relator, o ministro Edson Fachin, proferiu voto sobre as medidas cautelares solicitadas. Em seu voto, o ministro deferiu alguns dos pedidos liminares, relacionados à preservação de elementos da cena do crime e à melhoria da atuação dos órgãos de perícia técnico-científica; ao reconhecimento da excepcionalidade da realização de incursões policiais em áreas próximas a escolas, creches, postos de saúde e hospitais; à restrição ao uso de helicópteros como plataformas de tiro em operações policiais; ao aperfeiçoamento da atuação do Ministério Público fluminense. As entidades salientam, porém, que outros pedidos importantes não foram acolhidos, e que este reconhecimento é decisivo para salvar vidas nas favelas e periferias da cidade.

De acordo com dados da Rede de Observatórios da Segurança, a partir de abril, as operações policiais aumentaram no Estado do Rio de Janeiro e superaram os números de 2019, com um acréscimo de 27,9%. A letalidade policial também aumentou: apesar da queda no começo da epidemia, em abril de 2020, houve um grave aumento de 57,9% em abril e de 16,7% até o dia 19 de maio, em comparação ao mesmo período do ano passado. Os dados apontam, ainda, que as polícias do Rio de Janeiro usaram mais a força letal durante a pandemia do que nos meses equivalentes de 2019, quando o Rio teve o recorde de 1.810 mortes causadas por intervenção policial.

“É inaceitável que o Estado faça operações policiais que desrespeitam a vida, a proteção do domicílio e a saúde de moradores de comunidades pobres e vulneráveis nesse momento de pandemia”, disse Gabriel Sampaio, coordenador do programa de Enfrentamento à Violência Institucional da Conectas. “São jovens mortos, famílias destruídas, desrespeito à ação social de distribuição de cestas básicas em locais onde as balas e a repressão chegam antes da assistência social”, complementa.

As operações policiais vêm interrompendo o funcionamento de unidades de saúde e a distribuição de cestas básicas em favelas. Isto ocorreu nas recentes operações no Complexo do Alemão, Cidade de Deus e Providência, onde jovens negros foram assassinados em meio a ações de solidariedade empreendidas por coletivos locais. “O Estado, que pouco tem feito para conter a pandemia nas favelas e áreas periféricas, responde à maior crise sanitária em um século com o recrudescimento da violência. É preciso urgentemente parar o genocídio”, sustenta Wallace Corbo, advogado da Educafro, amicus curiae na ação.

“Essas medidas são absolutamente cruciais e poderiam ter salvado vidas como a do menino João Pedro e tantas outras crianças e adolescentes”, sustenta a defensora pública Lívia Casseres. “Uma política de segurança só se mostra compatível com a Constituição se for capaz de proteger a vida de toda e qualquer pessoa, inclusive as vidas negras, as vidas das favelas. Não há como aguardar mais tempo por uma decisão do STF, enquanto os mais vulneráveis amargam os piores e mais cruéis efeitos da ação inconstitucional e desproporcional das autoridades públicas encarregadas da segurança”, finaliza.

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