Atendendo a pedido da sociedade civil e movimentos sociais, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin concedeu no dia 5 de junho uma liminar – decisão temporária – proibindo operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro enquanto perdurar a pandemia de COVID-19.
Em sua decisão, Fachin determina que, “sob pena de responsabilização civil e criminal, não serão realizadas operações policiais durante a epidemia do COVID-19, salvo em hipóteses absolutamente excepcionais, que devem ser devidamente justificadas por escrito pela autoridade competente, com a comunicação imediata ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro”.
Em sua decisão, o ministro ainda determinou que, em casos extraordinários em que operações dessa natureza forem realizadas, sejam adotados cuidados excepcionais, devidamente identificados por escrito pela autoridade competente, para não colocar em risco ainda maior população, a prestação de serviços públicos sanitários e o desempenho de atividades de ajuda humanitária.
Pela primeira vez ONGs, coletivos e movimentos sociais ligados às favelas do Rio e a mães de vítimas das ações policiais processam o Estado do Rio de Janeiro pela sua política se segurança. A ADPF 635 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), apelidada como “ADPF das Favelas” é uma ação proposta pelo PSB (Partido Socialista Brasileiro) e construída coletivamente com Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Educafro, Justiça Global, Redes da Maré, Conectas Direitos Humanos, Movimento Negro Unificado, Iser, IDMJR, Coletivo Papo Reto, Coletivo Fala Akari, Rede de Comunidades e Movimento contra a Violência, Mães de Manguinhos.
A ação pede que sejam reconhecidas e sanadas as graves violações ocasionadas pela política de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro.
O julgamento teve início em 17 de abril, quando o relator, o ministro Edson Fachin proferiu voto sobre algumas das medidas cautelares solicitadas. Nele, o ministro deferiu alguns dos pedidos liminares importantes:
Após o voto do relator, a sessão foi suspensa por pedido de vistas do ministro Alexandre de Moraes, ainda em abril. A retomada do julgamento está previsto para o dia 7 de agosto.
No fim de maio, no entanto, uma coalizão de entidades ingressou com um pedido endereçado ao relator pedindo a suspensão das ações policiais no Rio de Janeiro durante a pandemia de Covid-19. As entidades demandaram que o STF determinasse a não realização de operações policiais em favelas durante a epidemia de Covid-19, salvo hipóteses absolutamente excepcionais, devidamente justificadas por escrito pela autoridade competente e com a comunicação imediata ao Ministério Público.
Com o acolhimento da liminar pelo ministro Fachin, o STF inicia o julgamento para que o colegiado avalie a decisão monocrática. O julgamento virtual permite que ministros publiquem seus votos até o dia 4/8.
O julgamento e a pressão da sociedade contra as operações policiais acontecem no momento em que o país assiste a uma série de ações violentas da PM, incluindo a que resultou na morte do adolescente João Pedro Mattos, de 14 anos, em São Gonçalo, região metropolitana do Rio. De acordo com dados da Rede de Observatórios da Segurança, a partir de abril, as operações policiais aumentaram no Estado do Rio de Janeiro e superaram os números de 2019, com um acréscimo de 27,9%.
A letalidade policial também aumentou: apesar da queda no começo da epidemia, em abril de 2020, houve um grave aumento de 57,9% em abril e de 16,7% até o dia 19 de maio, em comparação ao mesmo período do ano passado. Os dados apontam, ainda, que as polícias do Rio de Janeiro usaram mais a força letal durante a pandemia do que nos meses equivalentes de 2019, quando o Rio teve o recorde de 1.810 mortes causadas por intervenção policial.
De acordo com estudo realizado por pesquisadores da UFF (Universidade Federal Fluminense), a suspensão das operações policiais nas favelas pode salvar mais de 400 vidas em um ano.
“Em um contexto em que protestos antirracistas eclodiram em diversas partes do mundo, é urgente que as instituições brasileiras deem um basta ao genocídio e à violação de direitos da população negra das periferias e favelas”, declarou Gabriel Sampaio, coordenador do programa de Enfrentamento à Violência Institucional da Conectas. “Decisões como essa são muito importantes pois salvam vidas”, complementou.