Em 10 anos, a política externa brasileira passou por uma inegável transformação. O período coincide com três gestões do PT (Partido dos Trabalhadores) no Governo Federal. No balanço, há, além da constatação dos avanços, uma necessidade inadiável de que o país “passe da adolescência para a vida adulta nas relações exteriores”, disse hoje Camila Asano, coordenadora de Política Externa da Conectas.
Camila foi uma das palestrantes da conferência 2003-2013: Dez anos de uma nova política externa, criado para debater os 10 últimos anos da Política Externa brasileira. O evento é promovido pelo Grupo de Reflexão Sobre Relações Internacionais, de 15 a 18 de julho, no Campus São Bernardo da Universidade Federal do ABC, em São Paulo.
“Está claro que o Brasil é ouvido, ocupa espaço e tem poder de análise e crítica no cenário internacional. O passo seguinte deve ser o de agir e propor saídas concretas para os dilemas. Isso equivale a passar da adolescência à fase adulta”, disse Camila.
Uma das áreas onde este descompasso é evidente é a do uso da força. Em crises como a da Síria, o diagnóstico do Itamaraty é correto, mas carece de propostas concretas. “Dizer que o uso da força só pode ser feito de maneira responsável é importante. Mas, no cenário atual, é mais importante ainda que o Brasil proponha iniciativas capazes de romper a inércia e dar respostas verdadeiras às mais de 100 mil vítimas desta guerra civil”, disse Camila.
Transparência e seletividade
Outro ponto importante é a transparência. Conectas teve negado pedido de acesso a telegramas trocados entre o Itamaraty e a Missão Brasileira junto ao Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Mesmo usando a Lei de Acesso à Informação, a organização não consegue acessar os documentos que elucidariam a real posição brasileira no processo de fortalecimento do sistema. “Mais do que o caso em si, está em jogo a real disposição brasileira para o diálogo aberto com a sociedade em temas que, sob nenhum ponto de vista, ameaçam a soberania ou a segurança”, disse Camila.
Na terça-feira, o ministro da Defesa brasileiro Celso Amorim, ex-chanceler (2003-2010), disse em discurso no mesmo evento que se o Brasil se “relacionar só com quem tem política exemplar de direitos humanos, não vai se relacionar com ninguém”. Conectas tem insistido na importância de diferenciar duas situações. “A primeira é de países que constroem sistemas e leis que pregam, incentivam, legitimam ou perpetuam as violações de direitos humanos, como nos casos em que os direitos, por exemplo, das mulheres são suprimidos na própria Constituição. O segundo é quando estas violações acontecem apesar das instituições, quando o marco normativo estabelecido está em consonância com os direitos humanos”, disse Camila.
O teor do discurso da coordenadora da Conectas reflete posição explicitada recentemente em artigo para a publicação americana Open Democracy.