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09/11/2012

Em eleição negociada, Brasil é eleito membro do Conselho de Direitos Humanos da ONU

Além do Brasil, Venezuela e Argentina também assumem mandato de 3 anos



Brasil, Argentina e Venezuela foram eleitos na segunda-feira (12/11) membros do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, num processo negociado e de resultado previsível. Os três países seriam os únicos indicados pela América Latina para as três vagas disponíveis para a região, mas Bolívia e Panamá também apareceram na lista final.

Embora a solução negociada possa ser vista como um sinal de coordenação e sintonia entre os países da zona, ela ao mesmo tempo “reduz demais o nível de exigência e torna burocrático um processo que deveria servir para aumentar a régua usada para medir os compromissos de cada país com os direitos humanos”, disse Camila Asano, coordenadora de Política Externa da Conectas, organização de direitos humanos que possui status consultivo na ONU.

“Prova disso é que a Venezuela, como tudo indica, assumirá como membro do Conselho de Direitos Humanos da ONU um mês depois de ter tomado as medidas necessárias para abandonar a Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos). É difícil ver a coerência que possa existir entre esses dois movimentos simultâneos”, completou Camila.

O mandato dos países que forem eleitos agora só terminará em 2015. O Brasil já havia sido membro durante dois mandatos seguidos, entre 2006, quando o órgão foi criado, e 2011. Como, pelas regras da ONU, um país não pode voltar a concorrer para um terceiro mandato consecutivo, o Brasil esteve apenas como observador durante parte de 2011 e 2012, e deverá voltar agora, em 2013, para um novo mandato de três anos. A diferença entre “observadores” e “membros” é que a segunda categoria permite que o Estado vote sobre as resoluções apresentadas em plenário.

Antes da eleição, Conectas disse esperar que o Brasil, uma vez de volta como membro do CDH,  tratasse de forma séria três questões importantes:

 

1. A necessidade de o País melhorar o respeito aos direitos humanos dentro de duas próprias fronteiras, especialmente no sistema prisional. No documento que respalda sua candidatura, o Brasil restringe apenas à criação de novas vagas a solução para os graves problemas existentes num prisional que em muitos aspectos pode ser considerado medieval. Para a Conectas, o País deveria implementar as recomendações que recebeu dos diversos mecanismos da ONU (Revisão Periódica Universal, Relatores Especiais e Comitês de Monitoramento dos Tratados de Direitos Humanos). “Se por um lado Brasil tem postura aberta ao escrutínio desses mecanismos, as recomendações não recebem o tratamento necessário, contribuindo para a não eficiência do Sistema ONU de Direitos Humanos, cujo resultado é observado em melhorias no terreno. Há um número grande de recomendações relevantes que Brasil recebeu e que ainda não foram cumpridas”, disse Camila Asano, que citou como exemplos a recomendação da RPU para aumentar o número de defensores públicos e disponibilização dos mesmos nas unidades prisionais, além da recomendação do Subcomitê de Prevenção à Tortura de garantir independência e autonomia do Mecanismo Nacional de Prevenção à Tortura, cujo Projeto de Lei se encontra no Congresso.

 

2. Adotar postura mais propositiva a respeito das falhas do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Embora Conectas concorde com com a avaliação do governo brasileiro que os trabalhos do Conselho continuam em certo grau padecendo de seletividade e hiperpolitização em muitos casos, sobretudo no tratamento de situações em países específicos, a organização espera que o Brasil avance na crítica e seja mais propositivo, dando exemplo pela ação e combatendo esses pontos fracos. “Os votos do Brasil no Conselho devem sempre ser motivados pela preocupação com direitos humanos”, disse Camila Asano. “Assim, não veríamos episódios nos quais, o Brasil sendo membro do Conselho, acabou se abstendo em resoluções que tratavam de graves crises de direitos humanos, como no caso da Coreia do Norte”, completou. Nos casos em que o Estado brasileiro percebe seletividade, deveria, de forma pro-ativa, levantar a questão e apontar os casos que estejam por ventura sendo negligenciados na análise do Conselho, como está no compromisso No. 1 que Brasil apresentou como parte de sua candidatura.

 

3. Dar maior transparência a seus atos e abrir a política externa à participação da sociedade civil. Esta será a primeira vez que o Brasil será membro do Conselho depois da aprovação da Lei de Acesso a Informação. Espera-se uma postura do governo nesse novo espírito, incluindo o dever que os órgãos públicos agora têm de transparência ativa, como a divulgação de informações sem que o Estado tenha de ser instado por meio de solicitações. É preciso reverter sobretudo uma cultura de opacidade que ainda vem demonstrando força na política externa. Diversos compromissos do Brasil que estão há meses no site da ONU ainda sequer aparecem no site do Itamaraty ou da Secretaria de Direitos Humanos. A Posição do Brasil sobre recomendações da última Revisão Periódica Universal, por exemplo, não foram apresentadas à sociedade brasileira antes de serem divulgadas pela ONU, apenas em inglês, às vésperas da conclusão da sabatina em Genebra. O próprio documento de candidatura do Brasil ao Conselho ainda não está disponível nem no site da ONU ou do Estado brasileiro, tendo sido fornecido à Conectas após solicitação direta junto ao Itamaraty.

Conectas e outras organizações do Brasil e do mundo enviaram carta conjunta aos Países-candidatos solicitando que se comprometam a cooperar com os Relatores Especiais do Conselho de Direitos Humanos da ONU e que repudiem as represálias a defensores que fazem uso do Sistema ONU para denunciar violações em seus países: leia a carta, em inglês, aqui.

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