Em seu discurso de abertura na 75a Assembleia Geral da ONU, ocorrido na manhã desta terça-feira (22), o presidente Jair Bolsonaro defendeu a política ambiental brasileira e culpou organizações da sociedade civil como responsáveis por uma “campanha de desinformação” contra o país por sua liderança global na produção de alimentos.
Diante da comunidade internacional, o presidente minimizou a gravidade das queimadas e as atribuiu a ações de indígenas, negando registros disseminados mundialmente da recente destruição do Pantanal e da Amazônia e omitindo que seu governo é responsável pelo desmonte de órgãos de fiscalização ambiental.
“Nossa floresta é úmida e não permite a propagação do fogo em seu interior. Os incêndios acontecem praticamente nos mesmos lugares, no entorno leste da floresta, onde o caboclo e o índio queimam seus roçados em busca de sua sobrevivência, em áreas já desmatadas”, declarou.
De acordo com Camila Asano, diretora de programas da Conectas Direitos Humanos, Bolsonaro fez um discurso que subestima o nível de conhecimento e informações dos líderes mundiais sobre a crise ambiental.
“Mais uma vez, Bolsonaro apequena a política externa brasileira ao abrir mão de discutir as grandes questões contemporâneas do mundo como as mobilizações antirracistas para fazer uma defesa de seu governo com informações distorcidas e incompletas sobre o meio ambiente e sua gestão sobre a pandemia”, declarou Asano.
“É um discurso que subestima o nível de informações de seus pares sobre o que acontece no Brasil e que destrói a credibilidade do país diante da comunidade internacional podendo, inclusive, afetar nossas relações diplomáticas e comerciais”, complementou.
Em seu pronunciamento, Bolsonaro afirmou que o Brasil se destaca no campo humanitário e dos direitos humanos e que vem se tornando referência internacional pelo compromisso e pela dedicação no apoio prestado aos refugiados venezuelanos que chegam ao Brasil pela fronteira com Roraima. Desde março, porém, os venezuelanos estão proibidos de entrar no país por portaria do governo federal em razão da emergência sanitária da Covid-19.
“Há uma hipocrisia quando o presidente usa a acolhida humanitária do Brasil a venezuelanos para se promover. Há seis meses, o próprio governo federal interrompeu parcialmente essa acolhida ao fechar suas fronteiras a pessoas que buscam refúgio durante a pandemia”, comenta Asano. “As regras sobre o fechamento das fronteiras brasileiras tem sofrido flexibilizações ao longo dos últimos meses e hoje permite a entrada de turistas e investidores por via aérea, mas ainda proíbe pessoas que fogem da crise humanitária na Venezuela de entrar em território nacional.”
Apesar de dizer que o Brasil tem compromisso com os princípios basilares da Carta das Nações Unidas, incluindo respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais, o próprio discurso do presidente desrespeita a liberdade religiosa e viola a Constituição ao declarar que o país é “cristão e conservador”.
“Diferente do que o presidente afirmou, o Brasil deixou de ser referência em direitos humanos. Cada vez mais se isola e vota junto com poucos países que subjugam as mulheres em resoluções sobre gênero no Conselho de Direitos Humanos da ONU”, contrapõe Asano. “Bolsonaro encerrou seu discurso rasgando a Constituição ao dizer que o Brasil é um país cristão, atestando perante a comunidade internacional que não respeita o princípio da laicidade salvaguardado pelo artigo 5”, concluiu.