De janeiro a junho deste ano, o Ministério da Economia foi responsável por uma em cada cinco normas publicadas pela União relacionados à pandemia de Covid-19. Ao total foram 317 das 1.536 normativas editadas pela União.
Diante do estado de emergência sanitária do país, o Ministério da Saúde apresentou apenas 243 normas jurídicas no mesmo período e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), 161.
Esse é um dos destaques da segunda edição do Boletim Direitos na Pandemia, no qual especialistas analisaram o número de normas editadas por órgãos ministeriais, conselhos profissionais e pela própria Presidência da República, que apontam o direcionamento dos esforços do poder Executivo durante a emergência sanitária.
“Durante os primeiros meses da pandemia no Brasil, o governo do presidente Jair Bolsonaro atacou fortemente as medidas de distanciamento físico adotadas por Estados e municípios para conter o avanço da Covid-19, criando uma falsa dicotomia entre salvar vidas ou salvar a economia”, lembra Deisy Ventura, pesquisadora do Cepedisa e professora da Faculdade de Saúde Pública da USP. “A ênfase na economia também se traduz no grande número de normas editadas pela pasta”, avalia Ventura.
O Boletim Direitos na Pandemia faz parte do projeto “Mapeamento e análise das normas jurídicas de resposta à Covid-19 no Brasil”, elaborado pelo Cepedisa (Centro de Pesquisa e Estudos sobre Direitos Sanitário) da Faculdade de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo) em parceria com a Conectas Direitos Humanos. A partir de pesquisa no Diário Oficial da União e outras publicações oficiais, o projeto pretende analisar todas as normas jurídicas de resposta à pandemia de Covid-19 no país nos âmbitos federal, estadual e municipal em boletins publicados quinzenalmente.
O documento traz elementos técnicos que contribuem para elucidar a recente polêmica sobre o uso da expressão genocídio, sobre a qual são apresentados conceitos da legislação brasileira e do direito internacional
Aborda, ainda, os impactos de medidas do governo sobre os povos indígenas durante a pandemia. Um depoimento da liderança yanomami Dario Kopenawa aponta que o principal vetor de contaminação de indígenas pelo novo coronavírus é o garimpo, estimulado pelo governo Bolsonaro, que tem levado a doença para comunidades e aldeias.
“Há cinco meses esse coronavírus está avançando nas terras indígenas. A gente está muito preocupada. Não temos muito como por barreira sanitária no nosso território, é um pouco difícil porque a nossa terra é grande”, explica Kopenawa. “Agora, nós temos um aumento de garimpo ilegal. São mais de 20 mil garimpeiros na Terra Yanomami e estão espalhados e trabalhando, contaminando os nossos rios, impactando os nossos terrenos”, afirma.
Segundo a APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), o país já registra 16.548 casos confirmados de Covid-19 em indígenas, com 535 óbitos, e mais de 130 povos afetados pela doença.
O Boletim Direitos na Pandemia traz ainda uma análise das controvérsias sobre a eficácia no uso da Cloroquina e Hidroxicloroquina, substâncias que se popularizaram no país após indicação do presidente Jair Bolsonaro ao uso dos medicamentos no combate à doença.
O documento também explica de quem são as responsabilidades sobre a saúde pública no enfrentamento à pandemia nos níveis federal, estadual e municipal.
A mais nova edição do Boletim mostra que não houve qualquer iniciativa ministerial que tratasse da capacitação dos professores para uso de ferramentas de ensino à distância ou que estabelecesse linhas de financiamento para aquisição de equipamentos para um melhor enfrentamento ao hiato das aulas presenciais em todo o país. O documento destaca também que professores do ensino público não receberam quaisquer orientações e estratégias didáticas para o ensino à distância.
Apesar de a área de educação ter sido fortemente afetada por conta da pandemia, que paralisou escolas e universidades em todo o país, o Ministério da Educação contribuiu apenas com 49 normas jurídicas relacionadas à Covid-19 de janeiro a junho deste ano.