Além da falta de espaços para a participação da sociedade, a nomeação se baseia em critérios abrangentes e pouco objetivos. A Constituição de 1988 determina, apenas, que os aspirantes precisam ter entre 35 e 65, demonstrar “notável saber jurídico” e “reputação ilibada”. As sabatinas promovidas pelo Senado para referendar as indicações da Presidência são, não raro, marcadas pela burocracia e falta de profundidade.
Organizações da sociedade civil denunciam o processo há anos. Em abril de 2013, numa tentativa de evidenciar a falta de participação, a rede JusDh (Articulação Justiça e Direitos Humanos), da qual Conectas faz parte, enviou uma lista de 11 perguntas aos senadores responsáveis por aprovar a candidatura de Luis Roberto Barroso à vaga deixada pelo ex-ministro Carlos Ayres Britto. De maneira direta ou indireta, 7 das questões foram colocadas ao jurista. As organizações haviam feito o mesmo, meses antes, durante o processo de escolha de Teori Savascki. As opiniões do então candidato em matéria de direitos humanos foram sistematizadas pela rede.
“Os ministros do Supremos são intérpretes privilegiados da Constituição e, por isso, têm nas mãos questões centrais para a garantia de direitos humanos no país. A substituição de qualquer um deles pode reconfigurar o equilíbrio de posições e representar avanços ou retrocessos em temas fundamentais”, afirma Lucia Nader, diretora Executiva da Conectas. “A saída de Barbosa é um desses momentos de inflexão. É fundamental que a sociedade civil possa participar da escolha de seu substituto, como acontece em outros países democráticos.”
Processo hermético
Um projeto de resolução aprovado no ano passado pelo Senado conseguiu fazer avançar, ainda que pontualmente, as demandas por mais participação. O indicado a substituir Barbosa será o primeiro a ter o perfil publicado no site do Congresso. Informações e perguntas enviadas pelos cidadãos através da página serão filtradas por um relator e eventualmente utilizadas durante a audiência pública com o candidato.
Apesar de institucionalizar a participação da sociedade civil nas sabatinas, o projeto não altera a estrutura pouco democrática do processo de indicação, ainda concentrado na Presidência da República. A candidatura é publicada no Diário Oficial da União e encaminhada ao Senado Federal, onde o candidato é sabatinado pela Comissão de Constituição e Justiça e, em seguida, aprovado pelo Plenário. Finalmente, o escolhido é nomeado ministro do STF por um novo ato da Presidência.
Apesar da complexidade de uma escolha como essa, o processo entre a indicação e a nomeação não costuma demorar mais do que duas semanas. Ou seja, não há tempo para que a sociedade se mobilize para conhecer a fundo o perfil do candidato indicado. Também não existe nenhum mecanismo formal que possibilite que grupos sociais se manifestem sobre a indicação.
Propostas de mudança
No âmbito do poder Executivo, a sociedade tem sugerido que o Brasil adote um modelo semelhante ao que é utilizado em outros países, como na Argentina. Ou seja, em um primeiro momento, seriam disponibilizados no portal da Presidência da República os nomes e o currículo das candidaturas sob consideração da Presidência; em um segundo momento, seria aberto prazo para consulta e audiência pública sobre as candidaturas; por fim, haveria a elaboração de um relatório final justificando a escolha.
No período de indicação para a vaga aberta pela saída da Ministra Ellen Gracie, a JusDh entregou à presidenta Dilma Rousseff uma carta pedindo que tal procedimento fosse regulamentado de modo a garantir maior abertura à sociedade e que a presidenta considerasse candidaturas com um histórico de envolvimento em direitos humanos, além de incorporar uma preocupação de gênero, indicando uma mulher.
A JusDh também enviou um ofício ao Senado, durante o processo de nomeação do ministro Luiz Fux, pedindo a publicação do parecer elaborado pelo senador relator da CCJ sobre a indicação presidencial. A articulação pediu também que houvesse a possibilidade de apresentação de informações e questionamentos sobre o indicado, além da realização de uma audiência pública sobre o tema. Ainda, a JusDh pediu que fosse desenvolvido, em conjunto com a sociedade, algum mecanismo de participação social nas sabatinas.
Opinião
Conectas se manifestou sobre o assunto em nota pública intitulada “Novo ministro, velha escolha”. Também se pronunciou em três artigos de opinião apontando a necessidade de mudança desse processo e clamando por maior abertura ao debate público.
Quem são nossos juízes? – Rafael Custódio, Flavia Annenberg, Ester Rizzi e Rodnei Jericó (Folha de S. Paulo)
Transparência na escolha de novos ministros do STF – Oscar Vilhena e Flavia Annenberg (O Estado de S. Paulo)
A nomeação dos juízes da Corte Suprema: a experiência argentina – Juana Kweitel (Direitos Humanos, Justiça e Participação Social – Terra de Direitos)
Histórico das nomeações
Veja a linha sucessória do STF
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