O Banco Mundial, um dos mais tradicionais bancos multilaterais de desenvolvimento, está em vias de finalizar um processo iniciado em 2012 de revisão de suas salvaguardas – regras que visam garantir o respeito ao meio ambiente e aos direitos humanos nos projetos financiados pela instituição.
O que era para ser um processo orientado para o fortalecimento das regras socioambientais, entretanto, pode se tornar um problema para os direitos das populações indígenas. Tudo depende de como se posicionam os Estados com relação à proposta, já que estes são os acionistas do banco.
Para 8 ONGs brasileiras, incluindo a Conectas, o Brasil tem assumido posições preocupantes sobre o direito de povos indígenas à consulta livre, prévia e informada (CLPI). Em carta enviada ao Ministério da Fazenda brasileiro em junho, as organizações afirmam que os comentários do governo brasileiro ao segundo rascunho do texto de revisão trazem uma série de retrocessos à versão anterior do documento e à própria Política de Povos Indígenas do Banco.
Pelas políticas atuais do Banco Mundial, o financiamento de obras está condicionado ao “amplo apoio ao projeto por parte da comunidade dos Povos Indígenas afetados”. Em carta enviada ao Secretário de Assuntos Internacionais da Fazenda, Luís Antônio Carlos Balduíno, as organizações afirmam que esse parâmetro já fica aquém da Declaração da ONU sobre Direitos de Povos Indígenas e a Convenção 169 da OIT, dois dos parâmetros internacionais mais importantes no tema. As entidades expõem que, se a proposta brasileira for acolhida, a proteção aos povos indígenas ficará ainda mais frágil.
“Ao se afastar da linguagem consagrada nos instrumentos internacionais, o Brasil leva as salvaguardas do Banco Mundial para um cenário de insegurança jurídica e de potencial conflitos com os povos indígenas”, afirmou Caio Borges, advogado do projeto de Empresas e Direitos Humanos da Conectas. “Seria uma violação do direito à autodeterminação dessas populações. O Brasil precisa esclarecer melhor como chegou a esse posicionamento”, completa.
· Leia aqui a íntegra da carta enviada ao Ministério da Fazenda
· Leia aqui a contribuição do Brasil ao rascunho da nova política do Banco Mundial
Esta não é a primeira vez que o Brasil defende restrições sobre os direitos dos povos indígenas. Ano passado, na primeira contribuição do Ministério da Fazenda à revisão das políticas socioambientais do Banco Mundial, o país já havia assumido uma posição incoerente com suas obrigações internacionais.
Organizações da sociedade civil manifestaram seu repúdio à interpretação do governo brasileiro, que limitava as circunstâncias em que os povos indígenas teriam direito ao consentimento livre, prévio e informado.
Petição
Uma petição lançada pela Conectas, ISA (Instituto Socioambiental) e Internation Rivers pretende pressionar o governo brasileiro a rever suas recomendações a tempo da aprovação da nova política socioambiental do Banco Mundial, dia 4 de agosto.
Endereçada ao Secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda do Brasil, Luís Antonio Balduino Carneiro, e ao diretor-executivo para o Brasil do Banco Mundial Otaviano Canuto, o documento pede que o Brasil se posicione contra qualquer retrocesso na Política de Povos Indígenas do Banco Mundial em respeito à Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a Convenção 169 da OIT.
“O Brasil tem um importante papel a cumprir na garantia de que o processo [de revisão das salvaguardas socioambientais] resultará em critérios robustos, capazes de aliar agilidade com proteção dos direitos básicos assegurados pelas convenções internacionais e pela nossa Constituição Federal de 1988”, diz o documento.