Por Sarah Furtado*
A lentidão dos sistemas internacionais de proteção aos direitos humanos, a omissão do Estado e a dificuldade em garantir legitimidade em relação ao trabalho são alguns dos muitos desafios encarados pelos defensores em todo o mundo. À essa lista soma-se mais um agravante: a vulnerabilidade.
O tema foi debatido na manhã desta quarta-feira, 4, durante uma visita realizada ao Memorial da Resistência, como parte da programação do 15º Colóquio Internacional de Direitos Humanos. A mesa, mediada por Haris Azhar, da ONG Lokataru Foundation, trouxe um panorama sobre a situação dos direitos humanos nas Américas e, em especial, no Brasil.
Uma das constatações é que novas práticas de inibição da ação dos defensores têm sido colocadas em prática. A sociedade civil, organizada e engajada, passa a ser vista como uma ameaça por governos violadores de direitos. “Os países dialogam entre si e importam novas formas de criminalização”, explica Michel Forst, relator especial da ONU para Defensores de Direitos Humanos.
Sueli Carneiro, diretora do Instituto Geledés, trouxe a discussão para a realidade brasileira e enfatizou que é impossível entender os padrões de violação de direitos humanos no Brasil sem fazer um recorte racial. Para ela, as causas, e consequências, da desigualdade estão estritamente ligadas à ações seletivas da polícia, dos órgãos de justiça e da falta de empatia comunitária. “Existe um projeto antigo para erradicar a população negra do Brasil, mas sua resistência tem sido heroica”, pondera.
A fala de Sueli reverberou na intervenção de Atila Roque, diretor regional da Fundação Ford, que alertou para a manutenção de privilégios na sociedade brasileira e como essa dinâmica afeta diretamente a população pobre e negra. Rafael Custódio, coordenador do programa de Justiça da Conectas, complementou ao pontuar que “o poder judiciário é branco, o Ministério Público também segue essa linha, e são eles que julgam os negros e os pobres. Precisamos responsabilizar o sistema de justiça brasileiro por essa violência também”.
A questão do racismo fez parte da fala de Sandra Carvalho, da Justiça Global, que também chamou a atenção para o machismo como um fator limitador para a efetivação de direitos. Ubirajara Sompre, da Coiab, trouxe a perspectiva dos povos indígenas e lembrou como as tentativas de mudanças e as alterações efetivadas na legislação brasileira, como a revisão das demarcações de terras de povos originários, afeta diretamente o modo de vida dessas populações.
Ao fim do debate, Sueli Carneiro pontuou qual é o principal desafio para os defensores de direitos humanos no Brasil, atualmente. “O Brasil precisa de um novo pacto civilizatório. Esse é o desafio e dependemos de guerreiros do bem destruindo as hierarquias eleitas hegemonicamente pelas elites para alcançá-lo”, resumiu Carneiro.
Sobre o Colóquio
Entre os dias 2 e 6 de outubro, 80 ativistas de direitos humanos de 31 países estarão reunidos em São Paulo para o 15o Colóquio Internacional de Direitos Humanos. Com uma programação intensa, o objetivo do evento é debater o tema “Direitos Humanos: crise ou transição?”, compartilhar experiências e propor soluções para enfrentar quadros de retrocessos em escala local, regional e global.
Neste ano, a Conectas organiza o encontro junto com Forum Asia (Tailândia), o Centro de Direitos Humanos da Universidade de Pretória (África do Sul) e o Dejusticia (Colômbia).
*Sarah Furtado é jornalista voluntária do grupo de cobertura do 15o Colóquio Internacional de Direitos Humanos