Declaração de ministro da Justiça sobre presídios brasileiros é acurada e preocupante
Em São Paulo, Cardozo diz que preferia morrer a estar preso nas cadeias "medievais" brasileiras. Conectas cobra soluções há 11 anos
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse hoje, em São Paulo, que “se fosse para cumprir muitos anos na prisão em alguns de nossos presídios, preferia morrer”. Ele reconheceu ainda que “temos um sistema prisional medieval, que não só desrespeita os direitos humanos como também não possibilita a reinserção”.
Para Conectas – organização de direitos humanos que desde sua criação, há 11 anos, questiona o Estado brasileiro a esse respeito em todas as instâncias possíveis, inclusive na ONU – a declaração do ministro é acurada e preocupante. “Infelizmente é verdade que o sistema prisional brasileiro é medieval. E é importante que o ministro da Justiça reconheça. O que causa uma desesperança tremenda é o fato de historicamente quase nada ter sido feito a esse respeito”, disse Lucia Nader, diretora executiva da Conectas.
Embora a administração do sistema prisional caiba prioritariamente aos governos estaduais, isso não exime o Governo Federal e outras instâncias do poder público de suas responsabilidades.
O Projeto de Lei nº 2.442/2011, por exemplo, que cria o Mecanismo Nacional de Prevenção da Tortura tramita no Congresso Nacional há meses, tendo chegado à casa já com 4 anos de atraso, uma vez que o Governo Federal havia assumido o compromisso internacional de criar o Mecanismo em 2008.
A adoção do Mecanismo seria um passo importante para encarar problemas no sistema prisional como os constatados em setembro, in loco, pelo Subcomitê de Prevenção da Tortura da ONU, que entre outras constatações afirmou em seu relatório que “a proibição da tortura é amplamente ignorada” no Brasil, além da constatação de “ameaças, chutes e socos na cabeça e no corpo, além de golpes com cassetetes. Esses espancamentos aconteceram sob a custódia policial, mas também em ruas, dentro de casas, ou em locais ermos, no momento da prisão”.
O Brasil tem hoje a quarta maior população carcerária do mundo (514.582 pessoas), o que equivale a 269,79 por 100 mil habitantes. Só em São Paulo, são 180.059 presos, número que dobrou de 2001 até hoje, enquanto a população do Estado cresceu apenas 12%.“As autoridades brasileiras, em todos os níveis, precisam tratar com mais seriedade do caos que assola o sistema prisional. A atual política de encarceramento em massa, somada às terríveis condições prisionais é inaceitável, ilegal, desumana e ineficaz” conclui Marcos Fuchs, diretor adjunto da Conectas.
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