A Defensoria Pública do Estado de São Paulo retoma a votação nesta quinta (30) sobre se passa a adotar cotas étnico-raciais a partir do próximo concurso para Defensor Público.
Na semana anterior, o Conselho Superior da entidade havia dado um passo histórico ao sinalizar a aprovação da ideia. A votação da última quinta (23) foi interrompida quando o ‘sim’ para as cotas vencia por seis votos a um.
A decisão só será formalmente tomada quando os votos dos 11 integrantes forem ouvidos. Cada integrante pode mudar seu voto a qualquer momento.
A Conectas acompanha em tempo real a votação, que conta com forte presença da movimentos sociais do segmento negro, organizações da sociedade civil, estudantes e advogados.
No primeiro dia de votação, a sessão foi interrompida após um dos membros fazer um “Pedido de Vista” (mais tempo para analisar a questão).
Este é um momento histórico que pode decretar o fim do monopólio do homem branco como o defensor padrão. A falência do mito da “democracia racial brasileira” é facilmente constatada em pesquisas científicas e pela mera observação dos espaços públicos comuns, dentro e fora do sistema de justiça.
Apesar da população brasileira ser composta em sua maioria, 50,7%, por pretos e pardos, apenas 20% da nova composição da Câmara dos Deputados é negra e somente 22% são os negros que ocupam cargos nos concursos públicos para carreiras jurídicas. Há, todavia, um espaço onde a grande maioria é negra: é de 82% a porcentagem de negros entre os mais pobres do Brasil.
A exclusão racial é evidente quando se trata de instituições do sistema de justiça. Um exemplo emblemático está no Judiciário, onde dados recentemente publicados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apontam que 64 % dos juízes brasileiros são homens e 82%, brancos. Apenas 14% se declaram pardos e 1%, pretos. Juristas e advogados negros no funcionalismo público correspondem a apenas 22%. O número de negros nos Tribunais Superiores não chega a 10% dos magistrados.
“Uma sociedade heterogênea e diversificada como a nossa, merece um Sistema de Justiça equivalente, que esteja empoderado na luta pela redução da desigualdade racial e das manifestações do racismo na sociedade brasileira, incluindo na formação da própria carreira dessas instituições” declara Rafael Custódio, Coordenador do Programa de Justiça.
Diante de tal cenário de desproporcionalidade, acreditamos que as políticas de ações afirmativas são fundamentais reverter a disparidade racial existente no país. Já vem funcionando no ensino superior, no qual a população negra representava 7 % dos universitários em 2002 e uma década depois subiu para 35%.
Ações afirmativas em espaços de poder ajudam a diminuir a marginalização de um grupo social e estão de acordo com o espírito da Constituição e o Estatuto da Igualdade Racial. Esta é ainda uma forma de o Brasil honrar seu discurso internacional. Há quatro décadas o país se compromete a promover a igualdade racial.
As leis já existentes permitem que a Defensoria Pública de São Paulo adote cotas raciais em seus concursos. “O que está em jogo é a oportunidade para que instituição tão cara ao Estado Democrático de Direito dê mais um passo em direção à consolidação de uma justiça social, começando por si mesma, e implementando uma Defensoria Pública racialmente democrática”, ressalta a advogada da Conectas, Sheila de Carvalho.
Conectas, juntamente com a Articulação Justiça Direitos Humanos – JUSDH e Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdade (CEERT), apresentou parecer perante o Conselho Superior da Defensoria Pública defendendo a criação de tais políticas de ação afirmativa.
Recentemente, dezenas de juristas publicaram um manifesto em favor da cotas raciais nos concursos da Defensoria Pública de São Paulo.
Leia aqui artigo publicado na Conjur sobre Ações Afirmativas na Defensoria
Leia aqui a íntegra do Parecer da Conectas, JUSDH e CEERT
Leia aqui manifesto de juristas em favor das cotas raciais na Defensoria