A CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA) mostrou preocupação com a Proposta de Emenda à Constituição 55/16 (PEC 241 na Câmara dos Deputados) que congela os gastos em saúde e educação pelos próximos vinte anos, corrigindo os valores pela inflação. Em audiência solicitada por 16 organizações da sociedade civil, os comissionados James Cavallaro, Francisco Eguiguren e Margarette Macaulay questionaram a delegação brasileira sobre o formato, a duração e a compatibilidade do projeto com as normas internacionais de direitos humanos.
A audiência aconteceu na tarde na terça-feira (6/12) na Cidade do Panamá e contou com a presença do secretário especial adjunto de Direitos Humanos Silvio Albuquerque, além de representantes do Ministério da Justiça e do Itamaraty.
Eguiguren, que também é relator especial da CIDH para o Brasil, questionou a opção do governo por uma reforma da Constituição que terá efeitos de longo prazo. Segundo ele, “seu impacto, plasmado assim, supõe um risco para a satisfação dos direitos e das necessidades sociais de uma população que não podem ser detidos por uma lei”.
James Cavallaro, que hoje preside a Comissão, rebateu diretamente a fala de Albuquerque, que se apoiou em decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luís Roberto Barroso para sustentar a constitucionalidade da PEC 55. “A nós cabe analisar não a Constituição e as normas brasileiras, e sim a normativa internacional e, especificamente, a interamericana”, disse Cavallaro.
“Nesse sentido, o princípio básico dos direitos econômicos, sociais e culturais é o de não retrocesso e de alocação progressiva de recursos.” Ele afirmou que, ainda que o orçamento de outras áreas possa ser remanejado, o aumento vegetativo da população exigirá necessariamente mais investimentos. “Como é que isso [a PEC 55] não representa uma violação dos princípios de não retrocesso e alocação progressiva de recursos?”
A comissária Macaulay também criticou as projeções oficiais a respeito do impacto que a medida pode ter sobre os serviços públicos. “Como pode um Estado congelar o gasto com educação, saúde e serviços sociais uma vez que, todos os anos, a demanda aumenta?”, questionou. Ela também disse estar “bastante surpreendida” com o fato de que o texto provocaria mudanças na Constituição.
Ao final da sessão, ainda, Macaulay afirmou ter visitado o Brasil e ouvido relatos sobre violência policial na gestão de protestos – outro tema levantado pelas organizações peticionárias. “Isso é gasto. Quando você têm tamanha força destacada para suprimir o exercício da liberdade de expressão, isso não é uma boa maneira de utilizar os fundos do Estado.”
A crítica dos comissionados ficou plasmada no comunicado de imprensa final do período de audiências. “A CIDH manifesta sua preocupação em relação ao impacto que a medida proposta pela PEC 55 poderia ter no gozo dos direitos econômicos, sociais e culturais e recorda o Estado de sua obrigação em matéria de não retroagir em tais direitos”, afirma o documento.
Durante a audiência, o presidente da CIDH, James Cavallaro, afirmou que a Comissão continuará acompanhando de perto o impacto da PEC nos direitos sociais e instou as organizações e o governo federal a seguir enviando informações ao órgão.
Assista a audiência na íntegra: