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10/07/2014

BRICS: Expectativa vs. realidade

Novo banco e crises internacionais pautam reunião em Fortaleza



Às vésperas de sua VI cúpula, chefes de Estado dos BRICS (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) se veem confrontados pelo limitado impacto de suas decisões anteriores, como ficou claro no caso da Síria, e pelas expectativas e contradições que rodeiam a primeira iniciativa prática da história do grupo – a criação formal de um novo banco multilateral para o financiamento de projetos de infraestrutura em países em desenvolvimento. A reunião acontece entre os dias 14 e 15 de julho em Fortaleza e 16 em Brasília.

Essas fragilidades serão alvo preferencial da Conectas e de outras organizações de direitos humanos durante o evento. “As autoridades já não podem ignorar o peso que o bloco tem na condução de assuntos de grande envergadura para os direitos humanos no mundo”, afirma Camila Asano, coordenadora de Política Externa da Conectas. “Para o Brasil, por exemplo, os BRICS têm sido foro privilegiado para a tomada de decisão e para a definição do posicionamento do país diante de crises.”

Camila cita como exemplo o caso da Síria, alvo de um parágrafo exclusivo na declaração final da última cúpula, realizada na cidade de Durban em maio de 2013. “Celebramos o pedido do bloco por um acesso imediato, seguro, completo e sem restrições de organizações humanitárias à Síria, mas não vimos, desde a reunião anterior, esforços satisfatórios dos BRICS para implementar essa medida”.

Embora o Conselho de Segurança tenha aprovado em fevereiro de 2014 uma resolução sobre o acesso de ajuda humanitária na Síria, a própria ONU tem alertado para o não cumprimento do texto a deterioração do cenário.

Conectas e outras 7 organizações brasileiras, indianas e sul-africanas demandaram aos chefes de Estado um novo compromisso do bloco com a solução do conflito sírio e com o envio de recursos. Em comunicado, as entidades também pediram uma condenação firme do uso de bombas-barril e de fragmentação.

A carta também aponta para  baixo peso das contribuições humanitárias dos BRICS à crise síria. “O Brasil se comprometeu a doar, em 2014, um valor muito baixo para a ajuda humanitária às vítimas da crise na Síria. A liderança que o País afirmar ter deve ser seguida por atos concretos, como um montante de doação à altura de um  país que figura entre as 10 economias do mundo”, diz Camila.

Outro ponto sensível do comunicado é o pedido para que a declaração final do encontro inclua um compromisso com a implementação do ATT (Tratado sobre o Comércio de Armas, na sigla em inglês). Dos cinco países do bloco, apenas Brasil e África do Sul assinaram o acordo. Nenhum dos países dos BRICS ratificaram o tratado até o momento.

Leia aqui a íntegra do comunicado.

Banco de contradições

Outro grande debate deve emergir ao redor do futuro banco dos BRICS. Essa é a primeira iniciativa prática do bloco desde sua criação, em 2009, e responde ao objetivo central das cúpulas de promover mudanças na governança econômica global.

Apesar de reconhecerem sua importância estratégica, organizações da sociedade civil brasileira têm apontado contradições na raiz do projeto, já que os próprios BRICS e vários de seus potenciais Estados-clientes encontram-se diante de graves tensões causadas por projetos desenvolvimentistas.

Para Juana Kweitel, diretora de Programas da Conectas, o projeto responde a uma demanda urgente por mais diversificação das fontes e inovação dos instrumentos de financiamento ao desenvolvimento, mas não pode repetir estratégias notoriamente violadoras do passado sob uma nova roupagem. “É o que vemos no Brasil, por exemplo, com o financiamento por parte do BNDES de obras com significativos impactos socioambientais e de direitos humanos, especialmente nos setores de energia, agronegócios, petroquímica e mineração.”

“O futuro banco dos BRICS tem a oportunidade única de criar, antes de seu primeiro desembolso, políticas e práticas robustas que contribuam para o desenvolvimento, mas que também protejam a natureza e os direitos humanos. Isso pode ser feito por exemplo, através da criação de um mecanismo efetivo para reclamações ou da adoção de políticas sólidas de transparência”, diz Kweitel.

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