A operação conhecida como “Dor e Sofrimento”, lançada pelo Governo do Estado de S. Paulo há exatamente um ano, contra usuários de drogas na Cracolândia, levou três relatores especiais das Nações Unidas a pedir explicações ao Brasil. Um ano depois, as perguntas sobre uso excessivo da força e maus tratos, entre outras, continuam sem respostas, depois de vencidos os prazos razoáveis para que o governo apresentasse explicações.
Os questionamentos chegaram ao Brasil num documento das Nações Unidas com data de 11 de abril de 2012. Pelo Manual de Operações dos Relatores Especiais da ONU, o governo teria dois meses para responder e poderia convidar os relatores a conferir in loco as informações. Em setembro, os relatores para saúde, moradia e pobreza, publicaram o comunicado enviado ao Brasil e alegaram não terem recebido nenhuma resposta (página 23).
“Nós, que acompanhamos de perto o Brasil na ONU há mais de 10 anos, ouvimos repetidamente que o País valoriza o trabalho da ONU e de seus relatores especiais. No entanto, quando se depara com a obrigação de responder a questionamentos vemos que a história é outra”, disse Camila Asano, coordenadora do Programa de Política Externa da Conectas, organização que possui status consultivo nas Nações Unidas.
As denúncias aos relatores foram encaminhadas no dia 24 de janeiro de 2012 pelas organizações Conectas, a Pastoral Carcerária, o Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) e Instituto Práxis de Direitos Humanos, por meio de um instrumento chamado ‘Urgent Appeal’ (Apelo Urgente).
Entre os principais pontos do apelo estão denúncias de uso excessivo e desproporcional da força por parte da Polícia Militar do Estado de São Paulo e da Guarda Civil Metropolitana, além de tratamento desumano e falta de assistência em saúde. As informações contidas no Apelo foram colhidas em Boletins de Ocorrência registrados por vítimas da violência policial, além de um inquérito instaurado pelo Ministério Público e visitas reiteradas ao local, realizadas pelas quatro ONGs autoras do documento.
“Não há nenhum motivo para que agentes do Estado atuem à margem da lei. Expor o que vimos e ouvimos à ONU e não guardar silêncio é uma maneira de responsabilizar perante a comunidade internacional os agentes públicos brasileiros que estejam envolvidos”, disse na época Marcos Fuchs, diretor adjunto da Conectas. “Queremos que as Nações Unidas acompanhem de perto o que está acontecendo hoje em São Paulo e investiguem principalmente os abusos policiais e as omissões na área de saúde e moradia”, completou Paulo Malvezzi Filho, do Instituto Práxis de Direitos Humanos.
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