O presidente Jair Bolsonaro realizou nesta terça-feira (20) um pronunciamento na abertura da 77ª Sessão da Assembleia Geral da ONU, em Nova York (EUA). O espaço reservado aos chefes de Estado de todo o mundo para discutir os grandes desafios globais na promoção da paz, democracia e direitos humanos, entretanto, foi mais uma vez utilizado pelo mandatário brasileiro para realizar uma defesa de seu governo, em um discurso repleto de imprecisões, sobretudo a respeito da gestão ambiental e da pandemia de covid-19.
Ao reforçar a imagem do Brasil como celeiro do mundo, o presidente ignora a pressão do agronegócio sobre territórios e as populações florestais e o fato de que seu governo vem apresentando recordes anuais de desmatamento. De acordo com o Imazon, a partir de dados do SAD (Sistema de Alerta de Desmatamento), em 2022 o Brasil perdeu uma área equivalente a sete vezes a cidade de São Paulo com 10.781 km² de mata nativa destruídos — o maior índice em 15 anos. Desde 2019, início do governo Bolsonaro, a Amazônia já perdeu uma área de 32.857 km2, superior ao tamanho do estado de Alagoas.
Os dados acima contrastam com outra informação presente no discurso do presidente: a de que o Brasil estaria avançando, segundo o presidente, “a passos largos” para o ingresso como membro pleno da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). No entanto, a política ambiental também será avaliada para a adesão do país ao bloco. As organizações da sociedade civil têm apontado que o desmonte das políticas socioambientais e ataques à democracia demonstram que o Brasil não parece disposto a adotar práticas, políticas e padrões de boa governança que a OCDE exige.
Outro tópico do discurso que se distancia da política praticada em território nacional diz respeito ao comportamento do governo em relação à pandemia de covid-19. Ao exaltar a cobertura vacinal brasileira, o presidente omite que, ele mesmo, recusou-se a vacinar, adotando uma ampla campanha de desinformação sobre os imunizantes e incentivando a população a boicotar as medidas de isolamento social encampadas pelos estados. Bolsonaro ainda minimizou a gravidade do vírus, incentivou aglomerações e fez pouco caso do uso de máscaras.
De acordo com Camila Asano, diretora de programas da Conectas Direitos Humanos, o presidente transformou um espaço de diplomacia, diálogo e luta pelos direitos humanos em lócus para fazer a defesa de sua gestão e atacar a imprensa nacional e internacional ao acusá-la de mentir sobre a destruição da Amazônia.
“A diplomacia brasileira tradicionalmente era motivo de orgulho e de destaque para o país perante a comunidade internacional. Entretanto, desde que assumiu o governo, o presidente Bolsonaro transformou o país em motivo de constrangimento nos corredores da ONU por seus posicionamentos pouco diplomáticos, ataques a direitos já garantidos e episódios internacionais lamentáveis”, disse Asano.
“Não será recebido com bons olhos pela comunidade internacional o uso indevido do espaço concedido historicamente pelas Nações Unidas ao Brasil para promover um discurso majoritariamente em defesa e promoção da própria gestão para um público interno, quando o chefe de estado brasileiro deveria estar ali para apresentar as posições do país perante os grandes desafios globais”, finalizou.