Em audiência conjunta nessa terça-feira (14/4), senadores das comissões de Serviços de Infraestrutura e Assuntos Econômicos vão sabatinar o presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) Luciano Coutinho.
Mais do que nunca as alegações de corrupção denotam a necessidade urgente de um debate mais amplo sobre transparência em questões socioambientais, mecanismos de controle e consultas a populações afetadas. Os senadores não podem deixar esses temas de fora. Como mostrou estudo publicado pela Conectas em 2014, essas falhas têm impactado a prevenção de violações de direitos humanos em projetos financiados pelo banco.
É fundamental que o Congresso brasileiro solicite do presidente do BNDES esclarecimentos sobre as medidas tomadas para incrementar a transparência na aplicação dos recursos e, sobretudo, para prevenir violações de direitos humanos. Conectas idetificou três questões centrais sobre as quais o Presidente do BNDES deveria ser indagado pelos senadores:
1) Transparência: Que medidas foram adotadas pelo BNDES para aumentar sua transparência ativa e passiva, especialmente em seus investimentos internacionais? Por que o banco não divulga o componente socioambiental dos relatórios de análise, nem os pareceres de auditorias externas especializadas no monitoramento de condicionantes socioambientais, tal como ordenado pela CGU no caso da hidrelétrica de Belo Monte?
2) Denúncias de violações de direitos humanos: Que mecanismos são disponibilizados para que comunidades afetadas por projetos financiados pelo banco possam prestar queixas e denúncias? Como essas reclamações são encaminhadas e atendidas? Como o BNDES avalia o funcionamento desses mecanismos?
3) Consulta Livre, Prévia e Informada: Que medidas são adotadas pelo BNDES para certificar-se de que houve consulta e consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas e outras populações tradicionais sobre empreendimentos que afetam seus territórios e meios de vida, conforme o artigo 231 da Constituição e acordos internacionais de direitos humanos nos quais o Brasil é parte?
BNDES e direitos humanos
Como provedor de 75% de todo o crédito de longo prazo da economia brasileira, o BNDES é o financiador das grandes obras de infraestrutura do País, como é o caso das usinas hidrelétricas de Belo Monte e do Rio Madeira (Santo Antônio e Jirau).
Muitos desses projetos têm sido marcados por violações aos direitos humanos de grupos e populações próximos às obras. Falta consulta prévia, livre e informada – direito garantido na Constituição e na Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Há também denúncias condições degradantes de trabalho e de trabalho análogo à escravidão, de abuso da força policial para conter manifestações, exploração sexual de crianças e adolescentes em áreas adjacentes aos canteiros e poluição de rios e ecossistemas.
A maior parte dessas megaobras também está com o cronograma atrasado, fruto do subdimensionamento dos riscos socioambientais nas fases de planejamento. Pairam sobre elas, ainda, denúncias de corrupção e pagamento de propina, como foi exposto no caso de Belo Monte.
“Os atrasos e custos ocultos dos grandes projetos de desenvolvimento põem em xeque os benefícios sociais usados para justificar sua realização”, afirma Caio Borges, advogado do programa de Empresas e Direitos Humanos da Conectas. “O presidente do BNDES tem uma oportunidade única de dar respostas que a população clama sobre o que está sendo feito para garantir que os recursos públicos alocados pelo banco nesses projetos realmente contribuam para um desenvolvimento sustentável e humano.”
Apenas em 2014, o BNDES desembolsou mais de R$ 187 bi. Os recursos operados pelo BNDES provêm, em sua grande maioria, de fontes públicas, como o FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) e repasses do Tesouro Nacional. Desde 2008, o Tesouro já repassou ao BNDES mais de R$ 400 bi, e o Congresso Nacional está prestes a autorizar, através da Medida Provisória 661/2014, mais uma injeção de R$ 30 bi.
Uma emenda à MP, apresentada pelo deputado Padre Ton (PT-RO), pedia que o BNDES fosse obrigado a contratar uma auditoria externa e especializada para elaborar pareceres técnicos sobre impactos socioambientais e violações de direitos humanos provocadas por seus projetos, mas a proposta foi rejeitada pelo plenário da Câmara. O texto ainda pode ser votado com destaque pelo Senado. Outra proposta de emenda que deve gerar debates na Casa é a de número 60, de autoria do deptado Alfredo Kaefer (PSDB/PR), que proíbe o sigilo das operações do banco. Esta, ao contrário, foi aprovada pelos deputados.