Por Sarah Furtado*
O desafio de conquistar a participação cívica na luta por direitos humanos têm atravessado décadas e as novas linguagens e hábitos de consumo geram uma nova demanda nesse sentido. A informação não é mais suficiente para gerar um engajamento prático. Nesse contexto, ativistas e defensores de direitos humanos são desafiados a criar uma forma de comunicação relevante através de intervenções criativas e táticas culturais.
Ishtar Lakhani, da ONG SWEAT (Sweat Sex Workers Education & Advocacy Taskforce), foi a facilitadora da oficina de Ativismo Criativo na tarde desta quinta-feira, 5, durante o 15o Colóquio Internacional de Direitos Humanos. “É muito comum ficarmos presos em formatos específicos de trabalho. Não é porque você não desenha ou faz esculturas que você não é criativo. Tudo é processo criativo, só precisamos pensar fora da caixa”.
A metodologia do Ativismo Criativo visa a aplicar ideias criativas, e a própria arte, ao exercício do ativismo. Ishtar ressalta a importância de dialogar com a cultura durante o processo criativo. “É impossível fazer ativismo sem a cultura, porque a maioria do trabalho que fazemos tem a ver com criar uma cultura de direitos humanos que respeite o ser humano e o ambiente ao nosso redor”, pondera.
A transformação de práticas de violação a direitos deve sempre ser analisada com base em seu contexto sociocultural e a partir daí, é possível elaborar estratégias criativas de confronto e conscientização.
Ishtar traz algumas dicas de como potencializar ações e intervenções de ativismo. “É importante saber que a verdade não te libertará”, inicia. “Todo mundo sabe que fumar faz mal pra saúde. Os estudos, panfletos, campanhas, tudo isso mostra que é ruim. As pessoas param de fumar? Não. A verdade precisa de ajuda pra gerar ação”, completa.
Uma forma de gerar essa transformação é gerar sentimentos. “Ativistas são bons em produzir eventos, artistas são bons em gerar emoções”, Ishtar explica e ressalta que grande parte dos defensores de direitos humanos assumiram essa responsabilidade após serem tocados por algum sentimento. “Eu decidi me envolver com direitos humanos porque vi meus pais sofrendo uma realidade profunda de desigualdade. Meu pai foi preso e isso me fez mudar. Não assinei uma petição e comecei a me interessar, foi um sentimento”.
Usar o ativismo criativo é transformar informação em experiência. Foi assim durante a Conferência Internacional sobre Aids, em 2015. Como forma de reivindicar a visibilidade das trabalhadoras do sexo, constantemente renegadas nesses eventos, a SWEAT, em parceria com o “Center for Artistic Activism”, realizou uma série de ações para gerar impacto.
“Nós fizemos uma placa escrito ‘você tem falado por ____ horas sem mencionar o trabalho sexual’. E nesse espaço colocamos um relógio digital”, explica Ishtar. Enquanto as palestras aconteciam, o cronômetro rodava. O palestrante que mencionou o trabalho sexual pela primeira vez, foi ovacionado pela plateia que acompanhava o relógio.
“Assim que aconteceu, nós dobramos a placa que dizia ‘Obrigada!’ no verso e zeramos a contagem até o próximo palestrante falar”, completa. O ato pressionou os palestrantes, que passaram a mudar seus discursos para mencionar o trabalho sexual.
O Ativismo Criativo propõe uma forma simples e barata de causar impacto e gerar visibilidade às causas. Ishtar conclui dizendo “é melhor ter 200 ideias ruins do que ter cinco ideias boas. Às vezes a coisa mais absurda se torna a ideia mais genial”.
Sobre o Colóquio
Entre os dias 2 e 6 de outubro, 80 ativistas de direitos humanos de 31 países estarão reunidos em São Paulo para o 15o Colóquio Internacional de Direitos Humanos. Com uma programação intensa, o objetivo do evento é debater o tema “Direitos Humanos: crise ou transição?”, compartilhar experiências e propor soluções para enfrentar quadros de retrocessos em escala local, regional e global.
Neste ano, a Conectas organiza o encontro junto com Forum Asia (Tailândia), o Centro de Direitos Humanos da Universidade de Pretória (África do Sul) e o DeJusticia (Colômbia). A realização do evento conta com o apoio de Ford Foundation, OAK Foundation, Open Society Foundations, Channel Foundation e The Fund For Global Human Rights. Agradecemos também a FGV (Fundação Getúlio Vargas), o Memorial da Resistência, a APAC (Associação Pinacoteca Arte e Cultura), o Museu da Imigração e o governo do Estado de São Paulo, que cederam espaço para a realização de alguns dos encontros.
*Sarah Furtado é jornalista voluntário do grupo de cobertura do 15o Colóquio Internacional de Direitos Humanos